TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 101.º volume \ 2018

639 acórdão n.º 174/18 11. A conclusão de que, em si mesma , a irrecorribilidade da decisão proferida pelo Presidente do Tribu- nal da Relação que, julgando improcedente o incidente de suspeição de juiz, condene o recusante em multa por litigância de má fé, não é incompatível com o direito de acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva , consagrado no consagrado no artigo 20.º da Constituição, não significa, contudo, que certas das dimensões em que tal direito se concretiza – em particular o princípio do processo equitativo, explicitado no respetivo n.º 4 –, não exerçam uma influência determinante na modelação do procedimento que conduz à aplicação de sanções processuais. Muito pelo contrário: no âmbito do regime da litigância de má fé, vem este Tribunal reiteradamente afirmando que, por força dos direitos de defesa e de contraditório contidos no direito a um processo equi- tativo consagrado no n.º 4 do artigo 20.º da Constituição, a decisão que aplica a multa processual prevista no n.º 1 do artigo 542.º do CPC pressupõe a prévia audição do interessado, ao qual deve ser reconhecida a faculdade de alegar o que tiver por conveniente quanto à condenação perspetivada nos autos (assim, cfr. Acórdãos n. os 440/94, 103/95, 357/98, 289/02 e, ainda que versando sobre a taxa sancionatória excecional, n.º 652/17), quanto mais não seja no âmbito da própria audiência de discussão e julgamento (cfr. Acórdão n.º 156/03). Tal possibilidade encontra-se hoje acautelada no n.º 3 do artigo 3.º do CPC, que consagra o princípio do contraditório, do qual decorre, entre outras exigências, a proibição de decisões-surpresa para as partes (neste sentido, cfr. José Lebre de Freitas/ João Redinha/ Rui Pinto, Código de Processo Civil Anotado , Vol. 1.º, 2.ª edição, Coimbra: Coimbra Editora, 2008, pp. 8 e 9; Carlos Lopes do Rego, Comentários ao Código de Pro- cesso Civil, Coimbra: Almedina, 1999, pp. 19 e seguintes). Da jurisprudência constitucional retira-se, assim, com segurança, não ser constitucionalmente aceitável, à luz do artigo 20.º da Constituição, que uma decisão prejudicial para a parte, que consista na aplicação de uma sanção em consequência de conduta processual censurável, possa ser proferida sem que antes tenha sido assegurada ao respetivo destinatário a possibilidade influenciar o sentido de tal decisão, deduzindo as suas razões de facto e de direito – o que é, evidentemente, tanto mais imperativo quanto menor for a possibilidade de impugnação da decisão de que se trate. Não é essa, contudo, a questão que integra o objeto do presente recurso. Com efeito, em passagem alguma do requerimento de interposição do recurso se imputa ao tribunal a quo qualquer interpretação do preceito constante do n.º 3 do artigo 123.º do CPC com o sentido de que a decisão do Presidente do Tribunal da Relação que, julgando improcedente o incidente de suspeição de juiz, condene o recusante em multa por litigância de má fé não tem de ser precedida da audição da parte interessada. Das peças processuais constantes dos presentes autos resulta, de resto, o contrário: tanto na reclamação que incidiu sobre o despacho proferido pelo Juiz Conselheiro Relator (ponto 50), como na alínea p) das conclusões que acompanharam as alegações produzidas no âmbito do presente recurso, a própria recorrente reconhece ter sido notificada, em momento prévio ao da sua condenação como litigante de má fé, para se pronunciar sobre tal eventualidade, incluindo sobre a sanção processual que houvesse de lhe ser fixada. Estando somente em causa a verificação da constitucionalidade da irrecorribilidade, em si mesma, da referida decisão, o recurso deverá ser julgado improcedente, tanto mais quanto certo é que, com exceção do artigo 32.º da Constituição – o qual, conforme se viu, não é aplicável às normas que regulam a condenação por litigância de má fé em processos de natureza civil –, os demais parâmetros convocados pela recorrente não têm uma incidência autónoma, antes pressupondo a conclusão, já afastada, de que a solução impugnada ofende algum dos direitos ou princípios consagrados no artigo 20.º da Lei Fundamental e/ou nos artigos 6.º e 13.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=