TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 101.º volume \ 2018

629 acórdão n.º 174/18 CPC_ como foi o caso da Decisão do Senhor Presidente do TRL, de 22.04.2016_ é necessariamente passível de recurso, em um grau, por consistir na aplicação de uma sanção processual, como consequência da apli- cação das regras previstas no art. 542.º do CPC (com que, aliás, o Senhor Presidente da Relação de Lisboa fundamentou tal decisão). lxxxiii. Como é bom de ver, não se pode aplicar o regime da litigância de má a la carte, respigando apenas desse regime algumas partes e obliterando as demais, dado tratar-se de um todo jurídico indissociável. lxxxiv. Tem-se presente que no recurso para o Tribunal Constitucional não se pode, nem é isso que se pretende, sindicar a legalidade das decisões das instâncias, posto que esse Tribunal não é “mais uma” instância nem são admitidos os ditos “recursos de amparo”. lxxxv. As referências, inevitáveis, ao teor das decisões das “instâncias”_ no caso, Presidente do TRL; Conselheiro- -Relator no STJ; Conferência no STJ)_ servem apenas como esteio e ilustração de qual a interpretação do sentido normativo que se reputa inconstitucional. lxxxvi. Posto isto, é materialmente inconstitucional qualquer sentido normativo que se atribua à norma do art. 123.º, n.º 3, do CPC, que exclua a possibilidade de recorrer, em um grau, da decisão do Presidente de Tri- bunal da Relação que, julgando improcedente o incidente de suspeição de juiz, condene o recusante como litigante de má fé em sanção processual, em especial com fundamento no regime da litigância de má fé. lxxxvii. Tal inconstitucionalidade resulta da violação dos princípios do Estado de direito democrático, da proporcio- nalidade na restrição de direitos, liberdades e garantias, do acesso à Justiça e ao Direito, da tutela jurisdicional efetiva, do duplo grau de jurisdição em matéria sancionatória, vertidos, designadamente, nos arts. 2.º, 18.º, 20.º, 32.º ( mutatis mutandis , por consagrar princípios basilares a todo o direito sancionatório e não apenas ao processo criminal), da Constituição da República Portuguesa. lxxxviii. Tal sentido normativo restritivo implica, igualmente, a violação da Convenção Europeia dos Direitos do Homem quando, nos seus artigos 6.º e 13.º consagram, respetivamente, o direito a um processo equitativo e o direito a um recurso efetivo, lxxxix. Direitos esses que, por força do disposto nos arts. 8.º e 16.º da Constituição da República, prevalecem sobre a legislação ordinária, integrando o acervo dos direitos fundamentais. xc. Desta feita, violando-se os arts. 6.º e 13.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, está-se do mesmo passo a violar os arts. 8.º, n.º 2, e 16.º da CRP, pelo que se verifica uma inconstitucionalidade indireta. xci. Ou, então, na medida em que a as convenções internacionais têm valor reforçado relativamente aos atos legislativos, ocorrerá ilegalidade por violação de lei de valor superior. xcii. Nessa medida, quer por uma razão quer pela outra, a norma do art. 123.º, n.º 3, do CPC, deve ser desaplicada com o sentido ora impetrado, e, concomitantemente, xciii. Não pode deixar de se concluir pela recorribilidade da decisão do Senhor Presidente da Relação de Lisboa que condenou a Recusante como litigante de má fé, e ainda no pagamento de multa no valor de 15 UC’s. xciv. Que, repita-se, além de ilegal é injusta e, dir-se-á mesmo, imoral, pois, afinal, o que está em causa nos autos, em termos substanciais, é essencialmente uma questão que se prende com a intervenção da Senhora Desem- bargadora … nos recursos em que seja parte a recorrente. xcv. Veja-se, a propósito, o denominado COMPROMISSO ÉTICO DOS JUÍZES PORTUGUESES, composto por um conjunto de Princípios para a qualidade e responsabilidade, aprovado pela Associação Sindical dos Juízes Portugueses em 31.10.2008 e acolhido pelo oitavo congresso dos Juízes Portugueses, em 22.011.1988, a saber: a) Imparcialidade: A imparcialidade é o atributo fundamental dos juízes e da função judicial, que visa garan- tir o direito de todos os cidadãos ao julgamento justo e equitativo. b) Integridade: A integridade profissional, social e pessoal dos Juízes é garantia de decisões justas e imparciais e da confiança pública na qualidade do sistema de justiça. c) Humanismo: O exercício judicial, ao atribuir ao juiz um papel criador na interpretação e aplicação da lei, vincula-o aos valores da justiça e aos princípios humanistas da dignidade da pessoa humana e da igual- dade.

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=