TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 101.º volume \ 2018

606 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL «A Digna Procuradora da República vem – a fls. que antecedem – exarar promoção, no sentido de que os autos aguardem por 3 meses porquanto, tendo embora sobrevindo o termo do prazo da pena de 5 anos de prisão sus- pensa na sua execução em que o arguido A. foi condenado no âmbito dos mesmos, das informações nele recolhidas, se mostra pendente um processo contra o mesmo, em fase de inquérito. Invoca para o efeito, o preceituado pelo n.º 2 do art.º 57.º do Código Penal. Vejamos. Regendo o artigo em causa para a extinção da pena de prisão suspensa na sua execução, estatui o seu n.º 2 (no que aos autos interessa): Se, findo o período de suspensão, se encontrar pendente processo por crime que possa determinar a sua revogação(...) a pena só é declarada extinta quando o processo (...)findarem e não houver lugar à revogação ou à prorrogação do período da suspensão. Em sede de garantias do processo penal, determina a Constituição da República Portuguesa, no n.º 2 do seu art.º 32.º: “Todo o arguido se presume ¡nocente até ao trânsito em julgado da sentença de condenação(...). Trata-se, pois, da consagração do princípio da presunção da inocência, como princípio fundamental do Estado de direito, na esteira do que é previsto no art.º 9.º da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, no artigo 11.º, n.º 1, da Declaração Universal dos Direitos Humanos e no artigo 6.º, n.º 2, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem. Na determinação da sua concretização conceptual e suas decorrências, Gomes Canotilho e Vital Moreira (Constituição da República Portuguesa Anotada, vol. I, Coimbra, 2007, p. 518) apontam as seguintes: (a) proibição de inversão do ónus da prova em detrimento do arguido; (b) preferência pela sentença de absolvição contra o arquivamento do processo; (c) exclusão da fixação da culpa nos despachos de arquivamento; (d) não incidência de custas sobre o arguido não condenado; (e) proibição da antecipação de verdadeiras penas a título de medidas cautelares; (f ) proibição de efeitos automáticos da instauração do procedimento criminal; (g) natureza excecional e de última instância das medidas de coação, sobretudo as limitativas ou proibitivas da liberdade; (h) princípio in dubio pro reo , implicando a absolvição em caso de dúvida do julgador sobre a culpabilidade do acusado. Revertendo as considerações acabadas de referir para o caso dos autos, temos: Que o art.º57.º/2 do C.P. viola, em meu modesto entendimento, o princípio da presunção da inocência, ao impossibilitar a extinção da pena de prisão suspensa na sua execução quando, apesar de alcançado o seu termo final, e inexistindo incumprimento de quaisquer deveres (é o caso, nos autos), penda contra o arguido, um processo pela alegada prática de um comportamento que poderá (ou não) ter relevância penal. Ou seja; Ao condicionar o legislador a extinção de uma pena de prisão suspensa na sua execução, que tem todas as condições para se considerar cumprida, à notícia e processamento da alegada prática de um crime, está a violar o referido princípio constitucional, na decorrência mencionada pelos Ilustres autores citados, qual seja, a da proibi- ção de efeitos automáticos, emergentes da instauração do procedimento criminal. Isto, por um lado. Por outro, ao permitir que a extinção de uma determinada pena (no caso, a prisão suspensa na sua execução), seja condicionada ao desfecho de outro processo criminal pendente (sendo que o desfecho juridicamente relevante, é o do trânsito em julgado da sentença absolutória ou condenatória, já que é esta que – nos termos do art.º 57.º/2 do CPP – finda o processo), que o arguido não controla e cujo termo não é temporalmente previsível, viola a paz

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