TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 101.º volume \ 2018

604 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL desencadeia o adiamento da decisão quanto à revogação da suspensão ou declaração de extinção da pena de prisão, a norma do artigo 57.º, n.º 2, do Código Penal, nenhum efeito produz, designada- mente no plano da verificação da responsabilidade criminal do arguido e do tratamento que lhe é dispensado no processo; este segundo processo correrá os seus termos com total independência face àquele em que o agente já foi condenado, nele valendo todos os corolários do princípio da presunção de inocência. III – Não há, em nenhum dos processos, considerados per se , qualquer ablação ou compressão do princípio da presunção de inocência, situando-se a alegada ofensa a este princípio no plano interprocessual, no sentido em que a pendência do segundo processo produz reflexos negativos no primeiro processo, ao determinar o adiamento da declaração de extinção da pena; porém, o facto que desencadeia o adiamento da declaração de extinção da pena – a notícia de que está pendente outro procedimento criminal –, não implica de modo algum que o agente seja tratado como se fora culpado dos crimes que lhe são imputados nesse outro procedimento, pois a notícia da pendência do procedimento tem por único efeito jurídico o diferimento da eventual decisão de declarar extinta a pena. IV – Violação reflexa do princípio da presunção de inocência, na sua vertente de norma de tratamento, ocorreria, sim, na hipótese de a norma do n.º 2 do artigo 57.º não impor o sobrestamento da decisão de revogação até ocorrer o trânsito em julgado da decisão condenatória no segundo processo, mas, ao invés, autorizasse a revogação da suspensão da pena com fundamento na mera notícia da pendência, em qualquer fase anterior à condenação definitiva, de outro procedimento criminal contra o agente; não sendo essa a solução acolhida na lei, que não permite que se extraiam quaisquer consequências punitivas da mera pendência de outro procedimento criminal, não se consegue discernir aqui qual- quer ofensa a tal princípio. V – O diferimento da declaração de extinção da pena não implica a sobrevigência desta, na medida em que a norma do n.º 2 do artigo 57.º do Código Penal não autoriza a prorrogação do prazo de sus- pensão, de que resultaria o alargamento do lapso de tempo dentro do qual a prática de crimes poderá determinar a execução da pena de prisão inicialmente fixada; na verdade, nenhum crime cometido pelo agente após o termo do prazo de suspensão releva para efeitos de extinção da pena, mas apenas aquele que tenha sido cometido dentro desse prazo, e em relação ao qual o procedimento criminal ainda não findou. VI – Embora, numa compreensão amplíssima, o princípio da presunção de inocência seja atingido em toda e qualquer situação em que o arguido seja prejudicado até que se forme e consolide um juízo jurídico válido sobre a sua culpa, tal compreensão é insustentável, na medida em que, proscrevendo, por exem- plo, quaisquer medidas de investigação e cautelares baseadas em indícios de culpabilidade – medidas cuja execução representa geralmente um prejuízo para o arguido –, tornaria inviável o processo cri- minal como um todo, convertendo a presunção de inocência em inocência postulada e frustrando integralmente os objetivos legítimos da tutela penal. VII – A solução acolhida no n.º 2 do artigo 57.º do Código Penal, embora lese de modo significativo a segu- rança jurídica do visado, na medida em que gera uma situação de incerteza num domínio sensível da sua vida, é conatural ao instituto da suspensão da execução da pena: por um lado, a existência ou não de conduta criminal relevante durante o período de suspensão é facto determinante na revisão retros- petiva da prognose favorável subjacente à decisão inicial de não executar a pena de prisão; por outro

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