TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 101.º volume \ 2018
574 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 8 – A Lei de Autorização Legislativa n.º 100/2015, de 19 de agosto é bastante rigorosa e concreta nos seus limites, deixando claro que a autorização em causa é dada ao Governo única e exclusivamente para alterar o n.º 3 do Artigo 95.º do RJUE, não tendo havido uma autorização qualquer tipo de autorização genérica ou abstracta que permitisse ao Governo rever outro número do Artigo 95.º que não o n.º 3. Não podemos nem devemos, assim, fazer uma interpretação extensiva do mesmo preceito, sob pena de violar princípios constitucionais de um Estado de direito quando é explicitamente referido o número do artigo sobre o qual o Governo está autorizado a legislar/ alterar. 9 – Não podemos entender que uma autorização legislativa que concede ao Governo poder para alterar o n.º 3 do Artigo 95.º do RJUE também o autoriza a alterar o n.º 2 do mesmo artigo se não diz tão clara e expressamente para o outro preceito, inexistindo qualquer referência à regulação do direito á inviolabilidade do domicílio (n.º 1 do Artigo 34.º da CRP) e à admissibilidade da imposição de restrições ao seu exercício. 10 – Por outro lado, sendo os Direitos, Liberdades e Garantias uma das áreas que mais diretamente interfere com a vida do cidadão, não pode este esperar que a ação legislativa do Governo pode extravasar o limite da autori- zação que lhe é concedida, sob pena de violação das expectativas jurídicas. 11 – Ora, se a Assembleia da República quisesse ter dado ao Governo autorização para este legislar/alterar o n.º 2 do Artigo 95.º do RJUE, tê-lo-ia feito como fez para o n.º 3 do mesmo artigo. 12 – OTribunal Constitucional, na sua decisão sumária n.º 724/2016, concluiu da mesma forma, afirmando que “Mesmo que se considerasse ter existido uma sanação do vício de inconstitucionalidade orgânica do n.º 3 do artigo 95.º do RJUE, na redacção anterior à Lei n.º 100/2015, de 19 de agosto, não estaria implícita a sanação do vício de inconstitucionalidade orgânica do n.º 2 do artigo 95.º do RJUE, que apesar de ser uma norma conexa tem conteúdo distinto.” e que a Assembleia da República não emanou uma Lei de autorização do Governo no sentido de este esta- belecer, através de decreto-lei autorizado, a restrição ao direito, liberdade ou garantia – direito à inviolabilidade do domicílio –, com definição do seu objecto, o sentido, a extensão e a duração da autorização, designadamente quanto à forma e condições em que poderia ser requerida a emissão de mandado judicial (Cf. Artigo 165.º, n.º 2 da CRP). Nem emanou uma lei restritiva daquele direito fundamental. Acresce que a norma em causa, o art.º 95.º, n.º 2, do RJUE, acima transcrito, sempre padeceria de inconstitu- cionalidade por insuficiente concretização ou densificação das condições em que pode ser autorizada a entrada das pessoas no seu domicílio, cuja definição cabe ao legislador (cf. Art.º 34.º, n.º 2 da CRP). Designadamente em que casos é que se pode considerar em que não foi dado o consentimento, ou seja em que há recusa do cidadão e desta feita terá de ser obtido o mandado judicial.” 13 – Nesta mesma Decisão Sumária, por forma a sustentar opinião do aqui recorrente que as autorizações devem ser explícitas e concretas, é afirmado que “(…) não obstante o argumento lógico aduzido no sentido de que a autorização legislativa dirigida à revisão do n.º 3 do artigo 95.º do RJUE pressupõe a simultânea existência de uma permissão normativa de entrada de funcionários administrativos no domicílio de cidadãos, sem o seu consen- timento, nos termos do n.º 2 do mesmo preceito legal, dele não resulta de modo algum que a alínea b) do artigo 4.º da Lei n.º 100/2015, de 19 de agosto, possa aproveitar ao n.º 2 do artigo 95.º do RJUE. Apesar de existir uma conexão necessária entre um determinado regime material e o correspondente regime adjectivo, continuamos a estar perante realidades jurídicas autónomas, que reclamam do legislador valorações e decisões distintas e incon- fundíveis, o que impede que se possa deduzir o corpus de uma a partir da outra unicamente através do recurso a processos de inferência lógica. Em suma, as autorizações legislativas não podem ser inferidas – têm de ser explícitas e articuladas. Só assim se assegura a participação efectiva da Assembleia da República no processo legislativo sobre as matérias elencadas no artigo 165.º, n.º, da Constituição da República Portuguesa.” 14 – Já no Acórdão n.º 195/16, o Tribunal Constitucional entendeu que “Para que se conclua, porém, pela inconstitucionalidade orgânica, por falta de credencial parlamentar para a intervenção legislativa operada pela norma em apreciação, torna-se necessário averiguar se a mesma detém caráter inovatório. Relativamente a este aspecto, também se pronunciou o Acórdão n.º 145/09, referindo o seguinte: “Em princí- pio, porque é entendimento reiterado deste Tribunal que “para que se afirme a inconstitucionalidade orgânica não basta que nos deparemos com produção normativa não autorizada do Governo em determinado domínio onde
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