TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 101.º volume \ 2018

565 acórdão n.º 154/18 II – Fundamentação 7. Coloca-se, em primeiro lugar, a verificação dos pressupostos de que depende o conhecimento do recurso, atento o objeto material que lhe foi conferido pelo recorrente, seja no requerimento de interposição de recurso inicialmente apresentado, seja no requerimento aperfeiçoado, na sequência de despacho-convite que lhe foi dirigido pelo relator. Neste plano, cabe sublinhar que, no sistema jurídico-constitucional nacional, os recursos de fiscalização concreta da constitucionalidade, pese embora incidam sobre decisões dos tribunais, conformam-se como recursos normativos, ou seja, visam a apreciação da conformidade constitucional de normas ou interpreta- ções normativas, tomadas com o sentido que a decisão recorrida lhes tenha conferido, a partir de um preceito ou conjugação de preceitos. Significa isto que, por imperativo do artigo 280.º da Constituição, a pronún- cia do Tribunal Constitucional incide, não sobre preceitos (mormente preceitos legais), mas sobre normas. Daqui decorre a necessidade de distinguir entre preceito e norma, incumbindo a quem pede o juízo do Tri- bunal o ónus de formular – e relacionar – o pedido e a causa de pedir, ou seja, que identifique a norma cuja inconstitucionalidade é pedida, o preceito ou conjugação de preceitos onde se acolhe ou de que é extraída interpretativamente, bem como os fundamentos da sua eventual inconstitucionalidade (artigo 75.º-A, n. os 1 e 2, da LTC). Por outro lado, a norma sobre a qual incide o juízo de constitucionalidade é aquela que foi aplicada (ou desaplicada) pelo tribunal a quo, tomada com o sentido que este lhe deu. Sendo esse o sentido que recorta o objeto do processo, o Tribunal aceita como um dado a interpretação do direito ordinário sobre a qual incide a sua fiscalização, cuja bondade ou acerto não lhe cabe apreciar. Discutir os métodos de interpretação ajustados, determinar a melhor interpretação do direito ordinário, definir a correta conformação da lide ou apreciar os factos materiais da causa, são tudo vertentes decisórias situadas fora dos poderes cognitivos do Tribunal Constitucional. Porque assim é, estando em causa a norma tal como interpretada e aplicada no caso concreto – o único em que se projeta a eficácia da pronúncia sobre a questão jurídico-constitucional – é necessário assegurar que o sentido normativo posto a controlo corresponda fiel e inteiramente àquele que foi efetivamente acolhido e aplicado como ratio decidendi na decisão recorrida. Quando assim não aconteça, permanecendo incólume o critério normativo em que realmente assenta o julgado, estará o julgador habilitado a manter o decidido, retirando ao recurso a utilidade a que se encontra adstrito: obrigar à reforma da decisão (artigo 80.º, n.º 2, da LTC). Assim, de acordo com jurisprudência sedimentada, para a admissibilidade do recurso para o Tribu- nal Constitucional não basta que a parte tenha sido vencida; é indispensável que a eventual procedência do recurso seja útil, não podendo traduzir-se na resolução de simples questões académicas. 8. No recurso em apreço, o recorrente enunciou no requerimento inicial a pretensão de ver sindicada a conformidade constitucional de «normas», que referiu ao preceituado nos artigos 1.º, n.º 2, e 7.º, n. os 1 e 2, da Lei n.º 4/2008. Como notado no despacho de fls. 359, essa menção apenas encontra sentido quando tomada a redação original do diploma, uma vez que o n.º 2 do artigo 1.º foi revogado pelo artigo 1.º da Lei n.º 28/2011, de 16 de junho, que introduziu modificações significativas no regime dos contratos de trabalho dos profis- sionais de espetáculos, ainda que sem alterar a redação do artigo 7.º E, note-se, na peça de contra-alegações, indicada como sede da sustentação prévia da questão de inconstitucionalidade que se pretende ver apreciada, volta a encontrar-se referência ao n.º 2 do artigo 1.º e à Lei n.º 4/2008, sem menção de qualquer alteração. Contudo, na sequência do convite ao aperfeiçoamento, veio o recorrente dizer que a alusão à versão original ocorria «em vista do momento do início da relação laboral objeto dos autos» e não prejudicava as alterações subsequentes. E, no requerimento aperfeiçoado faz repetidamente menção tanto à conjugação dos artigos 1.º, n.º 2, e 7.º, n. os 1 e 2, da Lei n.º 4/2008, na sua versão original, como à conjugação dos artigos 1.º, 1.º-A, alíneas a) e d) , e 7.º, n.º 1, da Lei n.º 4/2008, na redação conferida pela Lei n.º 28/2011 (umas vezes pela ordem indicada, outra pela ordem inversa). O mesmo volta a ter lugar nas alegações apresentadas.

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