TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 101.º volume \ 2018

563 acórdão n.º 154/18 D) No Acórdão recorrido, o Supremo Tribunal de Justiça concluiu no mesmo sentido, id est , que os artigos 1.º, 1.º A e artigo 7.º da Lei n.º 4/2008 vieram estabelecer um regime especial adaptado às especificidades da atividade de apresentação de espetáculos, que passa assim a constituir uma causa objetiva e logo, legitimadora do recurso à contratação a termo e que, como tal, dispensa a indicação dos factos concretos que motivam a contratação, apesar de exigir a indicação obrigatória de que se destina à contratação de um trabalhador das artes do espetáculo, tal como definido naquela Lei. E) Com efeito, é a especificidade da atividade, “estruturalmente transitória” nas palavras do Acórdão recorri- do, que legitima a previsão de uma causa objetiva de recurso à contratação a termo, no artigo 7.º/1 da Lei n.º 4/2008, que não só não viola o disposto no artigo 53.º da Constituição, como concretiza os deveres do Estado de promoção de políticas de pleno emprego, previstos no artigo 58.º da Constituição. F) Questão diversa é se a interpretação perfilhada no Acórdão recorrido, relativa à desnecessidade de justificação do termo por recurso a factos concretos, viola o disposto nos artigos 13.º, 53.º e 58.º da Constituição e a resposta deverá ser negativa. G) Em primeiro lugar, importa recordar que a exigência de menção dos factos concretizadores do termo não tem raízes na Lei Fundamental, ou sequer, na Diretiva 1999/70/CE do Conselho de 28.06.1999, respeitante ao acordo-quadro entre CES, UNICE e CEEP relativo a contratos a termo, pelo que a interpretação do Tribunal recorrido não poderia violar o disposto no artigo 53.º da Constituição. H) Em segundo lugar, importa ainda sublinhar que da dispensa de menção desses factos não resulta a impossi- bilidade de aferição sobre se a contratação se destina à satisfação de uma necessidade temporária, desde logo porque será sempre possível analisar se (i) o trabalhador contratado é ou não um trabalhador das artes do espetáculo e do audiovisual, como definido nos termos da Lei n.º 4/2008, (ii) se a atividade contratada é uma atividade artística, técnico-artística ou de mediação, (iii) se a prestação de trabalho se destina a espetáculos ou eventos públicos e (iv) in limine , se o termo excede ou não a duração máxima permitida de 6 anos. I) Ou seja, depois de fazer refletir na Lei n.º 4/2008 que a atividade artística é, por natureza, transitória, o legislador não prescindiu de elementos aferidores da caracterização do contrato e consequentemente, de indicadores de que a contratação se destina à satisfação de necessidades temporárias. J) A interpretação perfilhada pelo Acórdão recorrido também não origina uma disparidade injustificada na contratação dos trabalhadores de espetáculos ou no acesso à estabilidade no emprego, quando comparada com as condições dos demais trabalhadores, desde logo porque quer a forma de prestação de trabalho dos trabalhadores de espetáculos (horários à tabela, trabalho nos dias de descanso complementar e obrigatório dos demais trabalhadores), quer a necessidade de contratação destes trabalhadores para cada um dos espetáculos, justificam as diferenças observadas entre o regime especial, aprovado pela Lei n.º 4/2008 e o Código do Tra- balho. K) O regime especial aprovado pela lei n.º 4/2008, tal como entendido pelo Tribunal recorrido, encontra-se justificado pela especificidade da atividade artística, que exige profissionais com capacidades físicas e/ou artís- ticas distintas, um número muito variável de elementos, de espetáculo para espetáculo, distinto do que é exigido aos demais trabalhadores. L) Por último, nem as normas dos artigos 1.º, 1.º-A, 7.º e 10.º da Lei n.º 4/2008, nem a interpretação que o Tribunal recorrido fez das mesmas viola o disposto no artigo 58.º da CRP, pois o dever de promoção das polí- ticas de pleno emprego, previsto naquelas normas, não impõe que o Estado promova políticas criadoras de postos de trabalho por tempo indeterminado, mas antes que adote políticas que mantenham o mais alto nível de emprego possível, fomentando a empregabilidade, o que pode suceder através da promoção de políticas de contratação a termo (vide regimes excecionais fixados nas leis n. os 3/2012, de 10.01 e 76/2013, de 7.11), nomeadamente, com a flexibilização do regime legal dos contratos a termo na área artística. M) A flexibilização da contratação a termo permite a celebração de contratos com um maior número de profissio- nais, os quais não seriam contratados de outra forma, para fazer face às necessidades das entidades promotoras

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