TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 101.º volume \ 2018

549 acórdão n.º 133/18 risco da sua produção, ser punida como contraordenação ambiental muito grave, atento o elevadíssimo montante mínimo da coima aplicável em caso de negligência – i. e. € 38 500, na versão da Lei n.º 50/2006, de 29 de agosto, à data vigente, e € 24 000 na versão actualmente vigente. E é precisamente por isso que a recorrente suscita a inconstitucionalidade da norma, art.º 81.º/3/a do Dec.Lei n.º 226-A/2007, de 31 de maio, que qualifica a utilização de recursos hídricos sem prévio licenciamento, tout court, como contraordenação ambiental muito grave.» 4. Proferido despacho ordenando a notificação para alegações, a recorrente concluiu da seguinte forma. «1.ª) A recorrente é titular da licença de utilização privativa de terrenos do domínio público marítimo relativa ao apoio de praia completo com equipamento associado (estabelecimento de restauração e bebidas), consistindo a infração na colocação de um estrado de madeira amovível com 50 m2 e na colocação de mesas, cadeiras e chapéus de sol numa área de 70 m2, ambas fora da área licenciada para o efeito. 2.ª) Foi precisamente no âmbito da sua actividade privada empresarial de exploração do seu apoio de praia com equipamento associado e da respectiva concessão balnear, ambas utilizações do domínio público hídrico tituladas de acordo com a legislação aplicável, que a recorrente, por negligência, utilizou duas áreas, uma com 50 m2 e outra com 70 m2, fora da área objecto da licença de que é titular. 3.ª) E com fundamento na circunstância dessas áreas não estarem compreendidas no respectivo título de utili- zação dos recursos hídricos ( in casu terrenos dominiais) a recorrente foi condenada, por falta de título de utilização dos recursos hídricos, pela prática negligente de uma contra-ordenação ambiental muito grave prevista no citado art.º 81.º/3/a do Dec.Lei n.º 226-A/2007, de 31 de maio (punível com a coima mínima de € 38 500 nos termos do art.º 22.º/4/b da Lei n.º 50/2006, na versão introduzida pela Lei n.º 89/2009, de 31 de agosto) na coima, especialmente atenuada, de € 25 000. 4.ª) De acordo com o art.º 204.º da CRP “Nos feitos submetidos a julgamento não podem os tribunais aplicar normas que infrinjam o disposto na Constituição ou os princípios nela consagrados”. 5.ª) No caso vertente estão em colisão o direito ao ambiente (cfr. art.º 66.º/1 da CRP) versus o direito de ini- ciativa privada (cfr. art.º 61.º/1 da CRP). 6.ª) O núcleo essencial do direito ao ambiente é a garantia de um ambiente de vida humano sadio e ecologica- mente equilibrado, não sendo afectado pela mera utilização não titulada de recursos hídricos, incluindo terrenos, sem criação de riscos potenciais ou produção efectiva de quaisquer danos ambientais. 7.ª) Enquanto que o conteúdo essencial do direito de iniciativa privada previsto no art.º 61.º/1 da CRP é atingido de forma desproporcionada quando a lei prevê no art.º 81.º/3/a do Dec.Lei n.º 226-A/2007, de 31 de maio, que a mera utilização não titulada de recursos hídricos, incluindo terrenos, independentemente de quaisquer danos ambientais, constitui contraordenação ambiental muito grave, cuja coima, em caso de negligência, é no montante mínimo de € 38 500, na versão da Lei n.º 50/2006, de 29 de agosto, à data vigente, e de € 24 000 na versão actualmente vigente.  8.ª) Isto sendo certo que, no caso vertente, a utilização não titulada de terrenos do domínio público hídrico não criou riscos potenciais nem causou quaisquer danos ambientais.  9.ª) E, por isso, a aplicação à recorrente de uma coima, ainda que especialmente atenuada, de € 25 000 é manifestamente desproporcional tendo em conta que o valor que o legislador quis proteger ao instituir a obriga- ção de que todo o utilizador de recursos hídricos esteja titulado, autorizado e licenciado nessa utilização, não foi minimamente afectado, dada a ausência de quaisquer riscos potenciais ou de produção de quaisquer danos no ambiente. 10.ª) A norma ínsita no art.º 81.º/3/a do Dec.Lei n.º 226-A/2007, de 31 de maio, segundo a interpretação normativa que lhe foi conferida pelo tribunal de 1.ª instância e sufragada pelo recorrido acórdão da Relação de Évora, ou seja, que a mera utilização não titulada de recursos hídricos, incluindo terrenos, independentemente de quaisquer riscos potenciais ou da produção de efectivos danos ambientais, constitui contraordenação ambiental

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