TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 101.º volume \ 2018
541 acórdão n.º 132/18 proibição do exercício da atividade industrial de bordados, como efeito necessário da condenação pelo descaminho de direitos nele previstos. Por sua vez, no Acórdão n.º 282/86 (publicado em ATC, vol. 8.º, pp. 207 e seguintes) o Tribunal declarou, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade das normas constantes dos artigos 160.º, § único, e 130.º, § único, do Código da Contribuição Industrial, que estabeleciam, como efeito automático da aplicação de certas sanções disciplinares, o cancelamento da inscrição dos técnicos de contas, o que os impedia de desenvolverem a sua atividade profissional, entendendo que previam a perda de um direito. O Acórdão n.º 255/87 (in ATC, vol. 9.º, pp. 805 e seguintes) veio julgar inconstitucional a norma do n.º 2 do artigo 37.º do Código de Justiça Militar, que estatuía que a condenação pelos crimes mencionados no n.º 1 do mesmo artigo acarretava a baixa de posto. E, muito recentemente, o Acórdão n.º 562/03 (acessível em www.tribunalconstitucional.pt ) , estando em causa uma norma do Estatuto dos Militares da Guarda Nacional Republicana que estabelece como condição especial de promoção ao posto de cabo, por diuturnidade, não ter o militar sido punido na Guarda com o somatório de penas superiores a vinte dias de detenção ou equivalente, acrescentou: ‘(...) onde esteja previsto um direito à promoção – progressão na carreira – ele se há de configurar como um direito profissional. Ora, no caso dos autos, estamos perante uma promoção, por diuturnidade, que, consistindo no acesso ao posto imediato, independentemente da existência de vaga e desde que satisfeitas as condições de promoção, não só se pode considerar estruturada como um direito (profissional), mas também, e sobretudo, que não pode configurar-se como um eventual prémio ou recompensa.’ […]”. É este o sentido em que deve ser lido o artigo 30.º, n.º 4, da CRP. Ou seja, e em síntese, ele “[…] não proíbe a consagração de penas que se traduzam na perda de direitos civis, mas sim que da simples condenação anterior o legislador retire automaticamente esse efeito, sem mediação do julgador” (Acórdão n.º 53/11; vide ainda o Acórdão n.º 239/08), “[…] com tal preceito constitucional pretendeu-se proibir que, em resultado de quaisquer condenações penais, se produzissem automaticamente, pura e simplesmente ope legis , efeitos que envolvessem a perda de direitos civis, profissionais e políticos e pretendeu-se que assim fosse porque, em qualquer caso, essa produção de efeitos, meramente mecanicista, não atenderia afinal aos princípios da culpa, da necessidade e da jurisdicionalidade, princípios esses de todo inafastáveis de uma Lei Fundamental como a Constituição da República Portuguesa que tem por referente imediato a dignidade da pessoa humana” (Acórdão n.º 284/89). 2.3. No caso dos autos, importa referir que está em causa a ablação de direitos que anteriormente exis- tiam na esfera jurídica do recorrido – que previamente lhe tinham sido adjudicados ou reconhecidos – e não apenas uma limitação do leque de direitos a que poderia aceder. Ora, com o preciso sentido em que foram aplicadas na decisão recorrida (que coincidiu com o sentido com que foram aplicadas na decisão administrativa impugnada – cfr. item 2.1., supra ), isto é, com o sentido de que a lei afasta qualquer tipo ponderação na decisão do IMT sobre a interdição da atividade de empresa exploradora de escola de condução e a revogação da licença de instrutor, quando nenhuma decisão inibitória foi tomada pelo tribunal da condenação penal, as normas em causa no presente recurso não se mostram conformes ao preceituado no artigo 30.º, n.º 4, da CRP, com o sentido já assinalado no item 2.2., supra . Na verdade, na referida interpretação, tratar-se-ia de um efeito de perda de direitos atinentes ao exercício da atividade profissional do ora recorrido que, não tendo sido contemplado no quadro das consequências penais, se revestiria de caráter automático perante a condenação pela prática de um crime, subtraído a qual- quer juízo tendente a compaginar o referido efeito com os princípios da culpa e da necessidade.
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