TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 101.º volume \ 2018

526 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL III – Relativamente ao artigo 15.º, n.º 1, alínea a) , e n.º 2, do Regime Jurídico do Ensino da Condução (RJEC), a interpretação que lhe foi dada na decisão recorrida não encontra a mínima correspondência com a letra da lei; o preceito legal estabelece que se consideram inidóneas para o exercício da atividade de exploração de escolas de condução as pessoas que “estejam inabilitad[a]s, interdit[a]s ou suspens[a] s do exercício da atividade do ensino da condução […] por sentença condenatória transitada em jul- gado”, pelo que a simples interpretação literal do preceito remete-nos para uma decisão condenatória que – ela própria – determine a proibição ou suspensão do exercício daquela atividade; nenhum outro elemento de interpretação permite considerar o preceito de outro modo, designadamente abrangen- do uma sentença condenatória que não aplique a sanção acessória; a norma em causa diz respeito às consequências administrativas de ter sido proferida uma decisão condenatória penal que, para além de uma pena principal, também tenha aplicado uma pena acessória que suspenda ou proíba o exercício da atividade do ensino da condução. IV – Vista a norma com tal sentido, falha de sentido a censura à luz do disposto no artigo 30.º, n.º 4, da Constituição, já que, não estando em causa a admissibilidade da figura da pena acessória em geral, a ponderação relativa à sua necessidade e proporcionalidade foi já realizada na sentença penal, não implicando a atuação do IMT qualquer novo efeito, carecido de também nova e autónoma pondera- ção; é esta a única interpretação que se mostra conforme ao quadro constitucional, sendo certo que a iniciativa económica privada se exerce “nos quadros definidos pela Constituição e pela lei e tendo em conta o interesse geral”, o que, faz com que seja constitucionalmente legítimo fixar um requisito de idoneidade “[…] como pressuposto subjetivo do acesso a esta atividade económica”, apresentando- -se a condenação penal com sanção acessória de proibição ou suspensão do exercício da atividade (na qual já operaram juízos de necessidade, adequação e proporcionalidade em função da situação concreta) como um pressuposto adequado, em abstrato, a suportar o afastamento do requisito da idoneidade. V – O sentido do artigo 15.º do RJEC afirmado na decisão recorrida resulta “de uma interpretação que claramente a letra da lei não comporta”, o que permite ao Tribunal fixar uma (diferente) interpretação conforme à Constituição, ou seja, as normas contidas no artigo 15.º, n.º 1, alínea a) , e n.º 2, do RJEC devem ser interpretadas, no contexto aqui relevante, no sentido de a falta de idoneidade ali prevista como consequência de uma sentença condenatória penal se restringir aos casos em que essa sentença aplique uma pena acessória de inabilitação, interdição ou suspensão do exercício da atividade do ensi- no da condução. VI – Quanto ao artigo 50.º, n.º 1, alínea b) , e n.º 2, do RJEC, a letra do preceito parece abarcar unica- mente a interpretação afirmada na decisão recorrida – no sentido de uma projeção automática da condenação penal; a formulação imperativa (“revoga”), desacompanhada de qualquer outra menção ou critério de ponderação não consente que se extraia daquele preceito um sentido minimamente aberto à consideração, pelo IMT, dos elementos necessários à apreciação da afetação, pela decisão condenatória, da idoneidade do instrutor; ou seja, a interpretação do artigo 50.º do RJEC na deci- são recorrida, respeitou os cânones hermenêuticos, sendo aqui inviável a interpretação conforme à Constituição, restando, neste caso, concluir pela inconstitucionalidade da norma do artigo 50.º do RJEC.

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