TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 101.º volume \ 2018

516 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL a) os autores auferiam certa remuneração, ao abrigo do respetivo contrato individual de trabalho; b) a partir de janeiro de 2013, os (outros) enfermeiros do SNS com vínculo emergente de um con- trato de trabalho em funções públicas passaram a auferir uma remuneração superior à dos autores, por força das normas (que, como vimos, se aplicam aos casos de contrato de trabalho em funções públicas) do Decreto-Lei n.º 122/2010, de 11 de novembro; c) a remuneração dos autores por valores menores do que a remuneração dos (outros) enfermeiros com contrato de trabalho em funções públicas manteve-se até outubro de 2015, altura em que, na sequên- cia da celebração de contrato coletivo de trabalho, os autores viram aumentada a retribuição; d) Foi esta conjuntura (a que ocorreu entre janeiro de 2013 e outubro de 2015) que determinou que os autores peticionassem, na ação, a condenação da ré no pagamento da diferença entre a remuneração efetivamente auferida e a remuneração prevista no Decreto-Lei n.º 122/2010, de 11 de novembro, entre janeiro de 2013 e setembro de 2015, invocando o princípio da igualdade relativamente aos enfermeiros do SNS com vínculo emergente de um contrato de trabalho em funções públicas; e) o tribunal de primeira instância acolheu essa pretensão, com base no princípio da igualdade; mas f ) o Tribunal da Relação do Porto, na decisão ora recorrida, entendeu que o referido princípio não suportava a pretensão dos autores, revogando a sentença da primeira instância e julgando a ação improcedente. Neste momento, há que vincar um aspeto da decisão recorrida que é essencial para compreender os termos do problema – e do sentido em que foram aplicadas as normas do Decreto-Lei n.º 122/2010, de 11 de novembro, excluindo os autores do respetivo regime remuneratório: é que, na apreciação do Tribunal da Relação do Porto (à qual não pode o Tribunal Constitucional substituir-se), “[…] não é, efetivamente, possível, com os dados de facto disponíveis, estabelecer o indispensável confronto entre a situação objetiva dos autores e dos demais trabalhadores da ré, quer com contratos de trabalho em funções públicas, quer com contratos de trabalho submetidos ao regime privado, em ordem a apurar se o comportamento da ré se reveste, ou não, de algum arbítrio e concluir que há enfermeiros que prestam serviço de natureza, qualidade e quantidade idêntica à dos recorrentes e que são remunerados de modo mais favorável”. Ou seja, não se estabeleceu no processo, por falta de elementos de facto bastantes, uma comparação entre os autores e outros concretos enfermeiros. Resulta dos autos que a ré emprega enfermeiros em regime de contrato de trabalho em funções públicas, mas não se estes prestam trabalho com a mesma natureza, qualidade e quantidade do que o trabalho dos autores. A questão colocou-se, pois – e colocou-se apenas – no plano, tendencialmente abstrato, de apurar se a cir- cunstância de existir um regime remuneratório para enfermeiros com vínculo emergente de um contrato de tra- balho em funções públicas mais favorável do que o regime decorrente dos contratos celebrados com os autores, durante certo período, obrigava ou não a ré a remunerar os autores nos termos do primeiro ao longo desse período. É com esse preciso sentido – o único que relevou para a decisão recorrida – que a questão de inconsti- tucionalidade normativa deve ser apreciada. 2.4. O artigo 59.º, n.º 1, alínea a) , da CRP prevê que “[t]odos os trabalhadores, sem distinção de idade, sexo, raça, cidadania, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, têm direito […] à retribuição do trabalho, segundo a quantidade, natureza e qualidade, observando-se o princípio de que para trabalho igual salário igual, de forma a garantir uma existência condigna”. É vasta a jurisprudência do Tribunal sobre o princípio da igualdade da remuneração laboral. Para o que ora releva, deve notar-se que o denominado princípio para trabalho igual, salário igual “[…] apenas censura a diferenciação retributiva sem fundamento material razoável, que não se confina, neste domínio, à diferente quantidade, natureza e qualidade do trabalho” (Acórdão n.º 339/17) – “[…] o que, pois, se proíbe são as dis- criminações, as distinções sem fundamento material, designadamente porque assentes em meras categorias

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