TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 101.º volume \ 2018

506 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL âmbito da sua organização … desempenham exatamente as mesmas funções do ponto de vista da qualidade e quanti- dade. ’ (itálico nosso). 12. Ainda o Ac. da Relação de Guimarães [Ac. da RG. De 16.04.15, in dgsi.pt (processo n.º 103/14.4TTVCT.G) e CJ, Ano XL, Tomo II, pág. 295], ‘se, numa mesma organização, dois trabalhadores desempenham tarefas qualitativa- mente coincidentes e em idêntica quantidade, deve ser-lhe, por força do princípio constitucional a trabalho igual, salário igual, idêntica remuneração’. (itálico nosso). 13. E ainda, o ac. do Tribunal da Relação de Lisboa, datado de 04-06-2014, disponível em www.dgsi.pt , que passamos a citar: ‘o princípio da equidade retributiva que se traduz na fórmula para trabalho igual, salário igual, assume posição normativa direta e efetiva no plano das relações de trabalho. Ele significa imediatamente, que não pode, por nenhuma das vias possíveis (contrato individual de trabalho, convenção coletiva, regulamentação administra- tiva, legislação ordinária) atingir-se o resultado de, numa concreta relação de trabalho, ser praticada retribuição desigual da que seja paga, no âmbito da mesma organização, como contrapartida de trabalho igual. Nessa perspetiva, a jurispru- dência tem declarado o princípio como vinculante das entidades públicas e dos particulares’ . (itálico nosso). 14. Retornando ao caso dos autos, e apreciando-o à luz destes ensinamentos, os aludidos princípios plasmados na Constituição da República Portuguesa e na legislação laboral ordinária impõem que a ré conceda igual trata- mento aos enfermeiros que a si estão ligados mediante contrato individual de trabalho, uma vez que não está em causa que o trabalho de uns e outros seja igual quanto à quantidade, natureza e qualidade e apenas é invocado como motivo justificativo da diferenciação a distinta natureza do vínculo e o objeto daquele diploma legal, que, obviamente, não teve em conta os casos em que, dentro da mesma organização, coexistam trabalhadores em ambas as situações. 15. Com efeito, a unificação das carreiras de enfermagem constituiu um propósito confesso do legislador: no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 247/2009, de 22 de setembro, refere-se que ‘o Governo pretende garantir que os enfermeiros das instituições de saúde no âmbito do SNS possam dispor de um percurso comum de progressão profissional e de diferenciação técnico-científica, o que possibilita também a mobilidade interinstitucional, com harmonização de direitos e deveres, sem subverter a autonomia de gestão do setor empresarial do Estado.’ 16. Aliás, a Assembleia da República, mediante a resolução da Assembleia da República n.º 85/2016, ponto 10 – Todos os profissionais de saúde que desempenham funções permanentes nos hospitais do SNS sejam integra- dos em carreiras com vínculo à Administração Pública, através de contratos de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado – reconhece a necessidade de por fim à discriminação existente dos enfermeiros a laborar no SNS em regime CIT. 17. Ora, mais não é uma assunção da inconstitucionalidade da situação em vigor. 18. As referidas inconstitucionalidades foram arguidas nas alegações de recurso interposto pelos Autores/recor- ridas da Douta Sentença proferida em 1.ª instância. 19. De frisar que a interpretação levada a cabo pelo Tribunal da Relação do Porto, no sentido de que os regimes apesar de harmonizados permitem discriminação a nível salarial não é mais que dizer que, o regime legal adotado nas E.P.E. permite discriminar livremente os trabalhadores, ainda que trabalhem igual, quer em quantidade, quer em quantidade. 20. Aliás, os recorrentes (autores) trabalham mais que os demais funcionários da ré, pois trabalham mais 5 horas semanais, isto é, mais 40 horas mensais. 21. Assim, não se consegue percecionar como se pode entender que dois trabalhadores iguais em formação e em trabalho, adstritos ao serviço nacional de saúde (doravante SNS), a laborar numa instituição pública, possam ser discriminados, trabalhando mais e recebendo mesmo. 22. Tal discriminação não é diferente, nem menos gravosa, do que uma discriminação em favor do sexo, raça, preferência sexual ou credo. 23. Pois, ficou demonstrado, conforme frisou o Meritíssimo Juiz da primeira instância que, os enfermeiros em regime de funções públicas e os enfermeiros em contrato individual de trabalho laboram com a mesma qualidade. 24. Inclusive ficou provado que na sua maioria os enfermeiros em regime de contrato individual de trabalho possuem melhores e mais qualificações académicas e especialização.

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=