TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 101.º volume \ 2018

471 acórdão n.º 128/18 32.º da Constituição, a possibilidade de tal finalidade ser alcançada «à custa do sacrifício do conteúdo essen- cial das garantias de defesa do arguido», o que concluiu verificar-se na norma ali em apreciação. Com efeito, nos casos em que a uma absolvição da primeira instância sucede uma condenação na segunda instância em pena de prisão (ainda que inferior a cinco anos), só no julgamento do recurso são definidas as consequências jurídicas do crime. Apesar de o duplo grau de jurisdição facultar ao arguido a possibilidade de contra-alegar no âmbito do recurso interposto da sentença absolutória, não lhe assegura a possibilidade de sindicar o processo decisório subjacente à escolha e à determinação da medida concreta da pena de prisão aplicada e a consequente reapreciação dos respetivos fundamentos. Como se explicita no ponto 19 do Acórdão n.º 429/16: «Nos casos em que existe uma absolvição da primeira instância revogada por decisão condenatória em pena de prisão da segunda instância, não é assegurada no julgamento do recurso uma reapreciação das consequências jurídicas do crime. Trata-se, pelo contrário, de uma decisão inovadora com consequências fundamentais na posição jurídica do arguido, designadamente na sua liberdade, relativamente à qual é negado o acesso a uma reapreciação por um tribunal superior. Na verdade, uma situação em que a uma absolvição de primeira instância sucede a condenação em pena de prisão, no tribunal de recurso, implica necessariamente o surgimento de uma parte da decisão que se apresenta como integralmente nova: o processo decisório concernente à determinação da medida da pena a aplicar. A decisão que define a pena de prisão é proferida pelo Tribunal da Relação sem que anteriormente, designadamente em pri- meira instância, haja qualquer apreciação sobre a pena a impor ao arguido. O arguido vê-se confrontado com uma pena de privação de liberdade cujo fundamento e medida não tem oportunidade de questionar em sede alguma. Neste caso, os critérios judiciais de determinação, em concreto, da medida adequada da pena escapam a qualquer controlo. Existem, portanto, nesta situação, dimensões do juízo condenatório que não são objeto de reapreciação. Pelo menos quanto a estas matérias, existe uma apreciação pela primeira vez apenas na instância de recurso, sem que exista a previsão legal de um segundo grau de jurisdição. Neste contexto, aceitar a irrecorribilidade da decisão condenatória, em situações como a configurada pela norma em apreciação, seria admitir que o direito fundamental ao recurso, enquanto expressão das garantias de defesa do arguido, consagradas no artigo 32.º, n.º 1 da Constituição, não garante sequer a reapreciação por uma segunda instância da decisão que define a pena de prisão efetiva. Esta seria, assim, uma decisão do juiz que se apre- sentaria como livre de qualquer controlo. A ausência absoluta de controlo do processo decisório de escolha e determinação da medida da pena de prisão é, porém, inaceitável. É de há muito dado por adquirido na dogmática das consequências jurídicas do crime que a determinação judicial da pena concreta constitui “estruturalmente aplicação do direito”, deixando “por toda a parte de ser considerado como uma questão relevando exclusiva ou predominantemente da subjetividade do julgador, da sua arte de julgar” (cfr. Jorge de Figueiredo Dias, Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime, Aequitas – Editorial Notícias, 1993, pp. 40-41; no mesmo sentido, vide Anabela Miranda Rodrigues, A Determi- nação da Medida da Pena Privativa da Liberdade, Coimbra Editora, 1995, p. 13).» E, mais adiante (final do ponto 20, itálico aditado): «A norma objeto do presente processo, ao determinar a irrecorribilidade do acórdão da segunda instância que, em recurso de decisão absolutória, condena em pena de prisão efetiva, constante do artigo 400.º, n.º 1, alínea e) , do CPP, procede a uma restrição do direito do recurso do arguido que leva à sua total ablação, por não lhe permitir sindicar a condenação proferida na Relação, depois de lhe ser compreensivamente vedado, desde logo por falta de interesse ou legitimidade, recorrer da decisão de primeira instância. Ao resolver contra o arguido a situação de contradição entre a decisão de primeira e segunda instâncias, recu- sando-lhe a possibilidade de reação a uma condenação em pena de prisão efetiva, esta norma viola concretamente o

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