TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 101.º volume \ 2018
468 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL K. Como sabemos, da leitura do artigo 400.º, do CPP, em particular da al. e) , consta que não é recorrível o acórdão proferido, em recurso, pelas relações, que apliquem pena não privativa de liberdade ou pena de prisão não superior a 5 anos, o que, à primeira vista, se enquadraria nos presentes autos. L. Esta leitura simples do texto da lei, bem como dos contornos dos presentes autos, e caso se entendesse que o acórdão do TRL era irrecorrível – que não se entende –, estaríamos perante uma inconstitucionalidade gritante, desde logo, na natureza do sujeito processual arguido. M. Como sabemos a recorrente nos presentes autos é uma pessoa coletiva, uma sociedade comercial anónima, ou seja, insuscetível de ser condenada a pena de prisão, seja ela superior ou inferior a 5 anos. N. Caso se entendesse que a al. e) , do n.º 1, do artigo 400.º, do CPP, estava conforme a CRP, estaríamos a admi- tir que as pessoas coletivas nunca tinham direito de recorrer das decisões proferidas em recurso pelas relações para o STJ, fossem elas decisões surpresa, ou não, o que, não se aceita, é manifestamente inconstitucional, pois viola o princípio da defesa e do contraditório. O. Poderá argumentar-se que o duplo grau de jurisdição está acautelado, uma vez que a pessoa coletiva foi sujeita à decisão de 1.ª Instância, bem como à decisão da Relação o que, também numa análise apressada, poderia parecer correto, mas não o é! P. No caso da pessoa coletiva ser absolvida em 1.ª Instância, e condenada na Relação (como aconteceu nos pre- sentes autos), a mesma deixa de ver o duplo grau de jurisdição acautelado. Q. O Assistente teve possibilidade de ver apreciada a decisão de 1.ª Instância, recorrendo para o TRL, dando assim cumprimento cabal ao duplo grau de jurisdição, mas o mesmo não acontece, caso não se admita o recurso para o STJ – o que não se aceita –, com a recorrente. Qualquer decisão de não admissão do recurso para o STJ é inconstitucional. R. A al. e) , do n.º 1, do artigo 400.º, do CPP, quando interpretada no sentido de que uma pessoa coletiva, absol- vida em 1.ª Instância, e condenada em recurso, pelas relações, a uma pena não privativa de liberdade, não pode recorrer par o STJ, é inconstitucional, pois sabemos que a pessoa coletiva nunca pode ser sujeita a uma pena privativa de liberdade, o mesmo é dizer que a pessoa coletiva nunca tem direito a recorrer para o STJ, mesmo nos casos em que é confrontada com uma nova decisão, com uma decisão surpresa, para a qual não pode exercer o duplo grau de jurisdição. S. O que viola claramente os direitos constitucionalmente garantidos, em concreto o direito de serem conferidos aos arguidos os direitos de defesa (art. 32.º, n.º 1, da CRP), bem como do direito ao contraditório (artigo 32,º, n.º 5, da CRP), e direito a um processo equitativo (artigo 20.º da CRP). T. A declaração, constante das várias decisões, de que o recurso para o STJ não é admissível é inconstitucional, por violação do direito de defesa (artigo 32.º, n.º 1, da CRP), bem como do direito ao contraditório e ao processo equitativo (artigo 32.º, n.º 5, e artigo 20.º, ambos da CRP). U. A declaração de inconstitucionalidade da al. e) , do n.º 1, do artigo 400.º, do CPP, quando interpretada no sentido de que uma pessoa coletiva, absolvida em 1.ª Instância, e condenada em recurso, pelas relações, uma pena não privativa de liberdade, não pode recorrer para o STJ – pois sabemos que a pessoa coletiva nunca pode ser sujeita a uma pena privativa de liberdade, o mesmo é dizer que pessoa coletiva nunca tem direito a recorrer para o STJ, mesmo nos casos em que é confrontada com uma nova decisão, com uma decisão surpre- sa, para a qual não pode exercer o duplo grau de jurisdição –, terá como consequência admissão do recurso para o STJ, com a consequente apreciação por este Venerando Tribunal Superior do Acórdão condenatório proferido pelo TRL, dando cabal cumprimentos aos direitos constitucionalmente consagrados de defesa, contraditório e processo equitativo (artigos 20.º, 32.º, n. os 1 e 5, da CRP), da recorrente, assim como o cabal cumprimento do duplo grau de jurisdição.» 5. O Ministério Público contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso e formulando a seguinte conclusão:
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