TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 101.º volume \ 2018

459 acórdão n.º 123/18 de recurso, praticamente esvaziando de sentido a questão de constitucionalidade que lhe era colocada e que constituiu o pressuposto da decisão proferida no Acórdão n.º 675/16. Subsiste, ainda assim, a questão da proporcionalidade da solução legal no segmento em que não permite ao juiz a opção pela atribuição do efeito suspensivo com a dispensa de prestação de qualquer caução – questão que o acórdão ignorou. Seja como for, em coerência com o entendimento afirmado no acórdão, uma vez que o juízo de não inconstitucionalidade proferido se fundou numa determinada interpretação da norma, e que só através dela se mostra possível salvaguardar a sua conformidade constitucional, o Tribunal deveria ter recorrido ao dis- posto no artigo 80.º, n.º 3, da LTC, levando à decisão a referida interpretação. Não o fazendo, o Tribunal confunde a função do juiz constitucional com a do juiz comum, manipulando o sentido interpretativo da norma que lhe cabia julgar, sem, contudo, levar ao dispositivo esse condicionamento de salvaguarda da sua conformidade constitucional. Desta forma, não resolve definitivamente o problema de constitucionalidade suscitado no tribunal a quo e não cumpre a sua função de juiz constitucional. 7. O acórdão socorre-se, igualmente, do Direito da UE para demonstrar que os pressupostos da sus- pensão da execução da decisão sancionatória, «não se podem considerar, em termos gerais, inexigíveis ou desnecessários» (ponto 15). Em nenhum momento do Acórdão n.º 675/16 (ou do Acórdão n.º 674/16, para cuja fundamentação remete) se afirmou que o eram. No entanto, num juízo de ponderação proporcional devem ser sopesados, face à restrição imposta ao direito fundamental de acesso à via judicial, – algo que o acórdão não faz. O Acórdão também parece recorrer ao Direito da UE para referir, citando o Acórdão n.º 376/16, que esta seria «uma solução inspirada no regime previsto no artigo 278.º do [Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia], para os recursos interpostos no [Tribunal de Justiça da União Europeia], incluindo os recursos para a impugnação das decisões sancionatórias da Comissão Europeia» (ponto 15). No entanto, bastava atender ao ponto 25 do Acórdão n.º 674/16, relativa a uma interpretação nor- mativa equivalente à agora em apreciação, para infirmar tal conclusão, pois aí se refere que «Neste ponto particular a solução normativa adotada (…) afasta-se mesmo do próprio regime em que se inspirou. As decisões da Comissão em que tenha sido fixada uma coima ou uma sanção pecuniária compulsória neste âmbito podem ser impugnadas junto do Tribunal de Justiça da UE (TJUE), que conhece destes recursos com plena jurisdição (artigo 31.º do Regulamento (CE) n.º 1/2003, do Conselho, de 16 de dezembro de 2002, relativo à execução das regras de concorrência previstas no Tratado). No contexto deste processo, apesar de o recurso das decisões da Comissão, incluídas as de aplicação de coimas, se caracterizar pela ausência do efeito suspensivo, o TJUE pode, contudo, atribuí-lo, “se considerar que as circunstâncias o exigem”, nos termos do artigo 278.º do Tratado sobre o Funcionamento da UE e dos artigos 160.º e seguintes do Regulamento de processo do Tribunal de Justiça e 156.º e seguintes do Regulamento de processo do Tribunal Geral. No âmbito, o contencioso da União Europeia contempla a possibilidade de suspensão da eficácia da decisão de aplicação de coima “ser sujeita à constituição, pelo requerente, de uma caução cujo montante e modalidades são fixados tendo em conta as circunstâncias” (cfr. artigos 162.º, n.º 2, do Regulamento de Processo do Tri- bunal de Justiça e 158.º, n.º 2, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral). Permite-se, assim, a dispensa de prestação de caução nos casos de a parte se encontrar economicamente impossibilitada de a prestar.» Como também refere Rui Guerra da Fonseca, «no âmbito do Direito da União Europeia, qualquer ato de uma instituição comunitária, quando impugnado, ‘pode ser suspenso pelos tribunais mas apenas na base de uma apreciação casuística, com fundamento na iminência de um prejuízo grave e irreparável e no fumus boni iuris’, ou, por outras palavras, na ‘aparência de seriedade da causa de pedir no processo principal’» (in “A suspensão de eficácia de atos administrativos no projeto de revisão do Código de Processo nos Tribunais Administrativos”, in E-Pública , vol. 1, n.º 2, junho 2014, disponível em www.e-publica.pt ) . Curiosamente, é precisamente em nome do interesse público da União Europeia que o presente acórdão do Tribunal Consti- tucional afasta a possibilidade de substituição da prestação efetiva da coima por um regime “casuístico”. Con- tudo, ao contrário do que parece transparecer do acórdão, a solução normativa sindicada não é o resultado

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