TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 101.º volume \ 2018
452 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL vários mecanismos regulatórios destinados a repor a confiança da comunidade na eficácia da regulação e na capacidade do regulador. De resto – como se afirmou no Acórdão n.º 376/16 –, trata-se de «uma solução inspirada no regime previsto no artigo 278.º do [Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia], para os recursos interpostos no [Tribunal de Justiça da União Europeia], incluindo os recursos para a impugnação das decisões sancionatórias da Comissão Europeia.» 16. Resta determinar se a medida consagrada nos n. os 4 e 5 do artigo 46.º do RSSE, viola o subprincípio da proporcionalidade, por implicar um meio cujo efeito lesivo não é justificado, tudo visto e ponderado, pelos fins a que se destina. A esta questão deve dar-se resposta negativa, também aqui em sentido divergente do decidido no Acór- dão n.º 675/16. Na verdade, o sacrifício da presunção de inocência neste regime tem um desvalor constitu- cional moderado ou ligeiro, por múltiplas razões cumulativas: (i) Como o Tribunal Constitucional tem afirmado reiteradamente (vide, entre muitos outros, os Acór- dãos n. os 158/92, 50/99, 33/02, 659/06, 99/09 e 135/09), as garantias de processo sancionatório – designadamente, o direito à presunção de inocência – não têm, no domínio contraordenacional, o mesmo peso axiológico que têm no âmbito criminal, em virtude do diferente alcance ablativo das sanções cominadas e da diferente ressonância social das infrações; (ii) Tal peso é ainda diminuído pelo facto de, nos casos a que respeita a dimensão normativa aqui em causa, os visados não serem pessoas singulares, mas sociedades comerciais, sancionadas por factos praticados no âmbito de uma atividade desenvolvida em mercados densamente regulados, em vir- tude da premência das necessidades que satisfazem, da relevância económica da atividade que neles se desenvolve e da importância estratégica, no contexto nacional e europeu, da política que lhes diz respeito; (iii) Embora as condenações e sanções sejam decididas por uma entidade administrativa, trata-se de uma entidade independente, tanto no plano orgânico (impossibilidade de destituição discricio- nária), como no plano funcional (subtração ao domínio da superintendência ou tutela), pelo que a probabilidade de que a justeza da sua decisão venha a ser secundada por um órgão jurisdicio- nal é, relativamente às situações abrangidas pelo Regime Geral das Contraordenações, elevada (sobre a singularidade institucional das entidades administrativas independentes, vide o Acórdão n.º 376/16); (iv) A restrição do direito à presunção de inocência é mitigada pela exceção prevista para os casos em que a execução da sanção cause prejuízo considerável ao visado – a «válvula de escape do sistema», na expressão plástica do Acórdão n.º 376/16 –, precisamente aqueles casos em que é mais significa- tiva a lesão à presunção de inocência associada à regra do efeito meramente devolutivo da impug- nação judicial; e (v) Nada no regime obsta, como se afirmou anteriormente, a que a prestação da caução seja feita no montante e pela forma que o Tribunal entender adequados, tomadas em devida consideração as particularidades do caso, as circunstâncias do impugnante e a função de garantia da caução. Ponderados os interesses públicos servidos pela medida e a compressão que implica do direito à presun- ção de inocência, não pode o Tribunal dar por demonstrada a violação do subprincípio da proporcionali- dade. Impõe-se, pelo contrário, reconhecer que a solução legal sob escrutínio corresponde a uma ponderação razoável dos interesses pertinentes, cuja legitimidade se reconduz ao princípio democrático em que assenta a autoridade constitucional do legislador. Conclui-se, pois, que o regime consagrado nos n. os 4 e 5 do artigo 46.º do RSSE, não ofende o princípio da proibição do excesso.
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