TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 101.º volume \ 2018
451 acórdão n.º 123/18 pretendida pelo legislador, o objetivo fundamental de dissuadir o recurso aos tribunais com intuito dilatório. Nestes termos, é impossível concluir que a regra do efeito meramente devolutivo é inexigível. Também parece ser de recusar a ideia, desenvolvida nos Acórdãos n. os 674/16 e 675/16, de que é dis- pensável às finalidades da medida a imposição da prestação de caução substitutiva como condição necessária da suspensão da execução da sanção. «[U]ma tal automaticidade – escreveu-se nesses arestos – não consente a devida ponderação circunstanciada do caso, designadamente para efeitos de avaliação da exigibilidade da prestação de uma caução de montante igual ao da coima para prevenção de eventuais perigos que se imponha acautelar e que podem encontrar mecanismo alternativo nas medidas provisórias.» Ora, nem a caução, como se referiu anteriormente, tem de revestir a forma de depósito em dinheiro da quantia que o visado foi condenado a pagar a título de coima – pelo que, nesse aspeto, nada há, no enten- dimento deste Tribunal, de «automático» na solução legal –, nem a substituição da imposição de prestação efetiva de coima por um regime «casuístico» permite alcançar o principal desiderato da medida, que é a regu- lação sistémica dos incentivos de agentes económicos que operam em mercados cujo bom funcionamento é do mais intenso interesse público, não apenas no âmbito nacional, mas no da União Europeia. A este último propósito, refira-se o primeiro considerando da Diretiva 2009/72/CE, do Parlamento Europeu e do Conse- lho, de 13 de julho de 2009, que estabelece regras comuns para o mercado interno da eletricidade: «(…) [O] mercado interno da eletricidade, que tem sido progressivamente realizado na Comunidade desde 1999, visa proporcionar uma possibilidade real de escolha a todos os consumidores da União Europeia, sejam eles cidadãos ou empresas, criar novas oportunidades de negócio e intensificar o comércio transfronteiriço, de modo a assegurar ganhos de eficiência, preços competitivos e padrões de serviço mais elevados e a contribuir para a segu- rança do fornecimento e a sustentabilidade (…).» O mesmo desiderato é afirmado, de modo substancialmente mais desenvolvido, na Comunicação da Comissão ao Conselho Europeu e ao Parlamento Europeu, de 10 de janeiro de 2007, intitulada «Uma polí- tica da Energia para a Europa», onde se lê o seguinte: «(…) [A] União Europeia (UE) tem de enfrentar grandes desafios no domínio da energia, tanto em termos de sustentabilidade e de emissões de gases com efeito de estufa, como de segurança do abastecimento e da dependên- cia das importações, ou ainda de competitividade e da realização efetiva do mercado interno da energia. A definição de uma política europeia da energia impõe-se como a resposta mais eficaz a estes desafios, denominadores comuns ao conjunto dos Estados-Membros. (…) A conceção de um mercado interno da energia, a nível comunitário, pre- tende proporcionar aos consumidores uma escolha real, a preços equitativos e concorrenciais. No entanto, tal como sublinhado na comunicação sobre as perspetivas do mercado interno da energia e no inquérito sobre a situação da concorrência nos setores do gás e da eletricidade, a persistência de vários obstáculos impede a economia e os con- sumidores europeus de beneficiarem plenamente das vantagens da abertura dos mercados do gás e da eletricidade. Por conseguinte, é fundamental assegurar um verdadeiro mercado interno da energia.» Sobra a construção de um mercado integrado e interconectado de energia, observa-se que tal mercado «depende principalmente das trocas transfronteiriças de energia. Ora, estas trocas revelam-se por vezes complicadas devido à disparidade das normas técnicas nacionais e de uma conceção não uniforme das redes. Por conseguinte, é necessário estabelecer uma regu- lamentação eficaz a nível comunitário. Tratar-se-á, nomeadamente, de harmonizar os poderes e a independência dos reguladores da energia, de reforçar a sua cooperação, de os obrigar a ter em conta o objetivo comunitário da realização do mercado interno da energia e de definir, a nível comunitário, os aspetos regulamentares e técnicos, assim como as normas de segurança comuns, necessárias às trocas transfronteiriças (…).» De tudo isto decorre que também os pressupostos, sem dúvida exigentes, da suspensão da execução da decisão sancionatória, não se podem considerar, em termos gerais, inexigíveis ou desnecessários; traduzem, sim, a relevância atribuída pelo legislador ao regime-regra do efeito meramente devolutivo como um entre
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