TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 101.º volume \ 2018
45 acórdão n.º 157/18 Tendo em conta o modo como os requerentes perspetivam e caracterizam o vício resultante da con- tradição que entendem verificar-se entre a norma impugnada e o disposto no artigo 21.º do Decreto-Lei n.º 133/2013, há uma clarificação a que importa proceder desde já. De acordo com o entendimento desde há muito acolhido na jurisprudência constitucional, nos casos em que a Constituição prescreve a subordinação de um determinado ato a uma norma infraconstitucional, a contradição que entre eles possa verificar-se gera somente um problema de ilegalidade, ainda que a infração daquela norma interposta venha a redundar numa violação da Constituição, por ofensa aos preceitos que prescrevem o valor reforçado da norma infraconstitucional paramétrica – no caso, o artigo 112.º, n.º 3 – e/ ou estabelecem a competência para a sua emanação – no caso, o artigo 165.º, n.º 1, alínea u) . A tal propósito, escreveu-se no Acórdão n.º 34/00 o seguinte: «Assim, Jorge Miranda ( Manual ... , tomo V, citado, p. 351) afirma: “Na medida em que a força específica da lei decorre de normas constitucionais, a infração de lei de valor refor- çado envolve inconstitucionalidade. Mas trata-se de inconstitucionalidade indireta (...). Quer dizer: a lei contrária a lei de valor reforçado vem a ser inconstitucional, não porque ofenda uma norma constitucional de fundo, mas porque agride uma norma interposta constitucionalmente garantida. E, precisamente, o critério para se reconhecer se uma lei é reforçada ou não está em saber se se verifica ou não tal ocorrência; está em saber se a inconstituciona- lidade surge imediatamente ou se é consequência da ilegalidade.”». 23. Nos termos do n.º 3 do artigo 112.º da Constituição, têm valor reforçado as leis orgânicas, as leis que carecem de aprovação por maioria de dois terços, bem como aquelas que, por força da Constituição, sejam pressuposto normativo necessário de outras leis ou que por outras devam ser respeitadas. A Constituição define implicitamente a lei de bases como um ato legislativo que é pressuposto de outro ato legislativo – o decreto-lei de desenvolvimento –, o qual se lhe subordina (artigo 112.º, n.º 2). Por ser pressuposto normativo necessário de outro ato legislativo, a lei de bases tem valor reforçado de acordo com o critério da parametricidade específica, um dos acolhidos no n.º 3 do artigo 112.º (cfr. J. J. Gomes Canotilho, ob. cit. , p. 782). Aprovado no uso da autorização legislativa concedida pela Lei n.º 18/2013, de 18 de fevereiro, o Decreto-Lei n.º 133/2013 (diploma alterado, por último, pela Lei n.º 42/2016, de 28 de dezembro) estabe- lece, de acordo com o n.º 1 do seu artigo 1.º, «os princípios e regras aplicáveis ao setor público empresarial, incluindo as bases gerais do estatuto das empresas públicas». O artigo 21.º do referido Decreto-Lei tem, por sua vez, a seguinte redação: «Artigo 21.º Gestor Público Só podem ser admitidos a prestar funções como titulares de órgãos de administração de empresas públicas pessoas singulares com comprovada idoneidade, mérito profissional, competência e experiência, bem como sentido de interesse público, sendo-lhes aplicável o disposto no Estatuto do Gestor Público, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 71/2007, de 27 de março». Sendo incontestável que a matéria das bases gerais do estatuto das empresas públicas integra a reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República [cfr. artigo 165.º, n.º 1, alínea u) , da Consti- tuição], a questão a que importa responder aqui é a de saber se a norma constante do artigo 21.º do Decreto- -Lei n.º 133/2013 contém uma base geral subsumível àquela reserva, devendo ser, por essa razão, respeitada pela demais legislação ordinária – incluindo, obviamente, por aquela que a desenvolva. A norma convocada como parâmetro do juízo de ilegalidade – o artigo 21.º do Decreto-Lei n.º 133/2013 – apresenta a especificidade de integrar, não uma Lei da Assembleia da República, mas sim um Decreto- -Lei autorizado por esta. Uma vez que os decretos-leis aprovados ao abrigo dos artigos 165.º, n.º 1, e 198.º,
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