TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 101.º volume \ 2018

436 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL lado, o recurso a medidas de garantia patrimonial do cumprimento da sanção, pese embora apta a prosseguir as finalidades cautelares ou de garantia da não suspensão da execução da sanção, não per- mite decerto alcançar, pelo menos com a eficácia pretendida pelo legislador, o objetivo fundamental de dissuadir o recurso aos tribunais com intuito dilatório, pelo que é impossível concluir que a regra do efeito meramente devolutivo é inexigível. XII – É de recusar a ideia, desenvolvida nos Acórdãos n. os 674/16 e 675/16, de que é dispensável às finali- dades da medida a imposição da prestação de caução substitutiva como condição necessária da sus- pensão da execução da sanção, pois nem a caução tem de revestir a forma de depósito em dinheiro da quantia que o visado foi condenado a pagar a título de coima – pelo que, nesse aspeto, nada há, no entendimento deste Tribunal, de «automático» na solução legal –, nem a substituição da imposição de prestação efetiva de coima por um regime «casuístico» permite alcançar o principal desiderato da medida, que é a regulação sistémica dos incentivos de agentes económicos que operam em mercados cujo bom funcionamento é do mais intenso interesse público, não apenas no âmbito nacional, mas no da União Europeia; de onde decorre que também os pressupostos, sem dúvida exigentes, da sus- pensão da execução da decisão sancionatória, não se podem considerar, em termos gerais, inexigíveis ou desnecessários; traduzem, sim, a relevância atribuída pelo legislador ao regime-regra do efeito meramente devolutivo como um entre vários mecanismos regulatórios destinados a repor a confiança da comunidade na eficácia da regulação e na capacidade do regulador. XIII – Também em sentido divergente do decidido no Acórdão n.º 675/16, deve dar-se resposta negativa à questão de saber se a medida consagrada nos n. os 4 e 5 do artigo 46.º do RSSE, viola o subprincípio da proporcionalidade; na verdade, o sacrifício da presunção de inocência, operado pela medida, tem um desvalor constitucional moderado ou ligeiro, por múltiplas razões cumulativas: as garantias de processo sancionatório – designadamente, o direito à presunção de inocência – não têm, no domínio contraor- denacional, peso axiológico idêntico ao que têm no âmbito criminal, em virtude do diferente alcance ablativo das sanções cominadas e da diferente ressonância social das condenações proferidas; tal peso é menor ainda quando os visados não são pessoas singulares, mas sociedades comerciais, geralmente (e é a medida em geral que aqui está em causa) com grandes volumes de negócios e capacidade financeira, sancionadas com coimas que refletem a sua situação económica, por factos praticados no âmbito de uma atividade desenvolvida em mercados densamente regulados; embora as condenações e sanções sejam decididas por uma entidade administrativa, trata-se de uma entidade independente, pelo que a probabi- lidade de que a justeza da sua decisão venha a ser secundada por um órgão jurisdicional é relativamente elevada; a restrição do direito à presunção de inocência é mitigada pela exceção prevista para os casos em que a execução da sanção cause prejuízo considerável ao visado, precisamente aqueles casos em que é mais significativa a lesão à presunção de inocência associada à regra do efeito meramente devolutivo da impugnação judicial; e nada no regime obsta, em princípio, a que a prestação da caução seja feita no montante e pela forma que o tribunal entender adequados, tomadas em devida consideração as particu- laridades do caso, as circunstâncias do impugnante e a função de garantia da caução. XIV– Ponderados os interesses públicos servidos pela medida e a compressão que implica do direito à pre- sunção de inocência, não pode o Tribunal dar por demonstrada a violação do subprincípio da pro- porcionalidade; pelo contrário, impõe-se reconhecer que a solução legal sob escrutínio corresponde a uma ponderação razoável dos interesses pertinentes, cuja legitimidade se reconduz ao princípio democrático em que assenta a autoridade constitucional do legislador, não ofendendo o princípio da proibição do excesso.

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=