TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 101.º volume \ 2018
366 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Ora, a conclusão de que as normas legais aqui em crise respeitam o subprincípio da adequação impõe- -se facilmente, tendo em conta que a efetivação da responsabilidade financeira contra quem autorizou os pagamentos indevidos assegura que o Estado fica indemne da lesão patrimonial sofrida em consequência dos mesmos. De facto, se o fim visado por aquelas normas é reintegrar a legalidade financeira que foi violada por quem autorizou a realização dos pagamentos indevidos, através da reconstituição do património do Estado in integro, não restam dúvidas de que a exigência de uma compensação monetária equivalente àqueles paga- mentos, ao próprio agente da ação, salvaguarda plenamente aquele fim. A solução normativa adotada pelos artigos 59.º, 60.º e 61.º da LOPTC deve, pois, ser tida como ade- quada à prossecução do fim público que a Constituição, em nome do interesse coletivo, atribuiu ao regime da responsabilidade financeira reintegratória dos agentes do Estado. 4. A medida legal em causa também tem, no entanto, de ser submetida ao controlo do subprincípio da necessidade, exigindo-se, na sua aplicação, o exame da disposição, pelo legislador, de outros meios menos restritivos para alcançar os mesmos fins. Por outras palavras, importa averiguar sobre a possibilidade de for- mulação de uma convicção clara da existência de medidas legais que, sendo adequadas à prossecução dos fins visados, são menos onerosas para o titular do direito fundamental sujeito a restrição. Ora, a norma que o acórdão recorrido extrai dos artigos 59.º, 60.º e 61.º da LOPTC não passa incólume pelo crivo da sua necessidade. De facto, não é evidente que para eliminar a lesão patrimonial sofrida pelo Estado com a autorização dos pagamentos indevidos seja necessário afetar exclusivamente a esfera patrimonial do responsável por aquela autorização. Desde logo, porque o Estado pode acionar os meios legais à sua disposição para exigir a reposição das quantias indevidamente pagas aos próprios beneficiários daquela autorização, nos termos regulados no Regime da Administração Financeira do Estado (RAFE), constante do Decreto-Lei n.º 155/92, de 28 de julho, tanto na redação então em vigor, dada pelo Decreto-Lei n.º 113/95, de 25 de maio, como na reda- ção atualmente em vigor, dada pelo Decreto-Lei n.º 85/2016, de 21 de dezembro. Se os ditos beneficiários têm a obrigação legal de repor as quantias indevidamente recebidas, porque há de ser possível exigir aquela reintegração, exclusivamente, apenas a quem apenas autorizou o seu pagamento, mas deles não beneficiou. Se, como resulta claro da lei, a responsabilidade reintegratória não se confunde com a sancionatória, visando única e exclusivamente eliminar a lesão patrimonial sofrida pelos pagamentos indevidos, sem cuidar de censurar o comportamento ilícito do agente, porque há de ser permitido ao Estado exigir exclusivamente essa reintegração de quem autorizou aqueles pagamentos sem exigir a restituição das quantias indevidamente pagas, como é seu dever, de quem deles beneficiou indevidamente. É, aliás, a própria LOPTC que, na alínea m) do n.º 1 do seu artigo 65.º, configura o não acionamento dos mecanismos legais relativos às restituições devidas ao erário público como uma infração financeira passí- vel de dar lugar à efetivação da responsabilidade sancionatória do gerente, dirigente ou membro dos órgãos de gestão administrativa do serviço ou entidade. Se aquelas quantias fossem restituídas por que as recebeu indevidamente, não haveria lesão ou dano patrimonial do Estado que justificasse a efetivação da responsabilidade financeira reintegratória contra quem autorizou o seu pagamento, sem contudo dele retirar qualquer benefício. Ou seja, não seria necessário rein- tegrar o erário público à custa do património de quem autorizou os pagamentos indevidos se os sujeitos que deles beneficiaram fossem previamente chamados a restituí-los, como é legalmente devido. 5. Dir-se-á, contudo, que a jurisdição do Tribunal de Contas está limitada à efetivação da responsabi- lidade financeira de todos quantos estão investidos no dever de cuidar dos dinheiros públicos, e que, nessa medida, as disposições da LOPTC cuja constitucionalidade vem questionada apenas podem atuar sobre os
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=