TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 101.º volume \ 2018
34 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL segurança dos fundamentos invocados no pedido que a ponderação a efetuar com recurso a este último prin- cípio deverá ocorrer ainda no âmbito de aplicação daquele primeiro, determinando que a respetiva violação ocorra a um duplo nível. No primeiro nível, o princípio da igualdade surge convocado como condição da possibilidade de esta- belecer a distinção introduzida pela norma questionada, decorrendo a sua violação da ausência de um «fun- damento racional» suficientemente justificativo da própria opção de diferenciar: dando lugar à existência de dois regimes distintos para os gestores das empresas públicas – o regime geral, aplicável a todos os administra- dores de entidades integradas no setor público empresarial, e um regime especial, aplicável apenas aos admi- nistradores de instituições de crédito públicas qualificadas como “entidades supervisionadas significativas” –, aquela opção revelar-se-á, em si mesma, contrária à proibição do arbítrio, por nada permitir considerar, nem o demonstrar o legislador, «que a ratio pública de transparência que determina as obrigações declarativas de administrador de outras entidades públicas ( maxime , as de natureza empresarial), [b]em como de todas as outras obrigações, não tenha igual pertinência quanto às funções de administrador de uma instituição pública de crédito, a ponto de justificar a pura e simples subtração destes ao regime do Estatuto do Gestor Público (que os primeiros, todavia, continuam obrigados a cumprir)». No segundo nível, resultante da integração na estrutura do princípio da igualdade de dimensões típicas do princípio da proibição do excesso, tem-se especialmente em vista o escrutínio da medida ou da extensão em que a diferenciação estatutária entre aquelas duas categorias de gestores públicos surge concretizada do n.º 2 do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 71/2007. Apelando a um controlo intensificado de conteúdo, o argumento invocado neste plano pelos requerentes pode sintetizar-se do seguinte modo: assumindo que a ratio do aditamento operado pelo artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 39/2016 é, conforme decorre do respetivo preâmbulo, a de tornar menos oneroso e mais competitivo o desempenho das funções de administração dos bancos públicos, não demonstra o legislador que a prossecução de tal desiderato tornasse necessário o afastamento integral do Estatuto do Gestor Público, em alternativa à dispensa do cumprimento por aquela categoria de gestores públicos de certas das obrigações e deveres funcionais nele compreendidos. Configu- rando-se, assim, na perspetiva seguida pelos requerentes, uma medida menos diferenciadora, propiciadora de um tratamento mais igualitário entre as duas categorias de gestores públicos sob comparação, e suscetível de alcançar o mesmo desiderato, a extensão em que a diferenciação surge concretizada no n.º 2 do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 71/2007 será, em vista dos próprios fins que lhe subjazem, desnecessária, tornando-se, nesta aceção, incompatível com o «princípio da proporcionalidade, enquanto decorrência do princípio do Estado de direito democrático (artigo 2.º da Constituição)». 10. Na base do n.º 1 do artigo 13.º da Constituição, e comum a todos os corolários, mais ou menos exigentes, que dele se podem retirar, encontra-se a ideia de igualdade enquanto proibição do arbítrio. Fornecendo o patamar mínimo do controlo jurisdicional proporcionado pelo princípio da igualdade e acentuando-lhe a função de limite externo da liberdade de conformação do legislador ordinário, a conceção da igualdade como proibição do arbítrio vem sendo desde há muito perfilhada na jurisprudência deste Tribunal. Em linha com o que fora afirmado já no Acórdão n.º 309/85, tal conceção foi sintetizada no Acórdão n.º 750/95 nos termos seguintes: «O princípio da igualdade reconduz-se (…) a uma proibição de arbítrio sendo inadmissíveis quer a diferencia- ção de tratamento sem qualquer justificação razoável, de acordo com critérios de valor objetivos, constitucional- mente relevantes, quer a identidade de tratamento para situações manifestamente desiguais. A proibição de arbítrio constitui um limite externo da liberdade de conformação ou de decisão dos poderes públicos, servindo o princípio da igualdade como princípio negativo de controle. Mas existe, sem dúvida, violação do princípio da igualdade enquanto proibição de arbítrio, quando os limites externos da discricionariedade legislativa são afrontados por ausência de adequado suporte material para a medida legislativa adotada».
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