TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 101.º volume \ 2018
303 acórdão n.º 44/18 ofício” – as empresas de construção, tal como definidas no artigo 3.º, alínea b) , do Decreto-Lei n.º 12/2004, de 9 de janeiro; ii) A possibilidade e o ónus de o empreiteiro geral obter uma declaração de cumprimento das obriga- ções decorrentes da lei relativamente a estrangeiros (à semelhança do que se encontra previsto no artigo 198.º, n.º 5, da Lei n.º 23/2007, na sua redação originária, para o dono da obra – hoje, cfr. o artigo 198.º-A, n.º 7); iii) A possibilidade e o ónus de o empreiteiro geral prevenir e acautelar as consequências patrimoniais de um eventual incumprimento das sobreditas obrigações no ou nos contratos a celebrar com os subempreiteiros; iv) O dever de coordenação global relativamente a uma dada obra que recai sobre o respetivo emprei- teiro geral (dever esse que também legitima o afastamento das cautelas previstas no artigo 8.º, n.º 2, da Diretiva n.º 2009/52/CE em relação ao «contratante principal» que não tenha conhecimento de que o subcontratado empregador tenha empregado nacionais de países terceiros em situação irregular). – Pedro Machete. DECLARAÇÃO DE VOTO 1. Votei vencido por considerar que a norma sob escrutínio (n.º 4 do artigo 198.º da Lei n.º 23/2007, de 4 de julho) – que, de forma incondicional e sem quaisquer exceções, estabelece a responsabilização solidá- ria do empreiteiro geral pelas coimas aplicadas ao subempreiteiro – viola o disposto no n.º 3 do artigo 30.º da CRP. Não posso, por isso, acompanhar o entendimento sufragado pela maioria que fez vencimento no presente acórdão. Tenho, com efeito, como seguro que aquela norma viola o princípio jurídico-constitucio- nal da pessoalidade da responsabilidade (penal e) contraordenacional, uma das dimensões ou projeções do princípio da culpa. Que não permite que possa ser responsabilizado solidariamente por ilícito contraordena- cional de terceiro, alguém a quem não seja outrossim imputável um qualquer facto – por ação ou omissão. Exigindose para tanto que essa imputação tenha, ao menos como suporte, a violação de um dos múltiplos deveres de coordenação ou vigilância que a lei faz impender sobre o empreiteiro geral. Não pode, na verdade, sancionar-se aquele a quem, no mínimo, não possa imputar-se a violação de um dever objetivo de cuidado associado ao perigo proibido que se concretizou no ilícito imputado ao terceiro. Isto seja qual for a categoria ou o instituto a coberto do qual pretenda legitimar-se a responsabilidade subsidiária. Como Nuno Brandão, adverte, “tratar-se-á sempre de uma autêntica transmissão de responsabilidade contraordenacional operada por via legal” ( Crimes e Contraordenações. Da Cisão à Convergência Material , 2016, p. 918). Entendimento diferente não seria consentâneo com o sentido inerente ao direito sancionatório: uma resposta contrafáctica a um comportamento ilícito e culposo, preordenada à prevenção de novos e ulteriores ilícitos. Para além de pressuposto da censura da ilicitude e da culpa, o facto próprio é outrossim referente necessário da própria ideia de prevenção, tanto geral como especial. É assim à luz dos princípios normativos e doutrinais que, de forma mais desenvolvida, tive oportunidade de recordar na declaração de voto que apresentei face ao Acórdão n.º 691/16. Em termos cujo bem fundado e cuja pertinência no caso vertente se me afiguram – feitas as indispensáveis adaptações – irrecusáveis. 2. No que fica sumariamente exposto, são postas em relevo exigências constitucionais a que a norma em crise não assegura a indispensável satisfação. Como o próprio acórdão reconhece, “a mesma [norma] prevê de facto a transmissão para o empreiteiro geral da responsabilidade pelo pagamento de uma coima devida pela prática de facto praticado por empregador por ele subcontratado. Tal transferência é, também aqui, indepen- dente da verificação de pressupostos referentes à responsabilidade pessoal do empreiteiro geral no ilícito de emprego de trabalhadores estrangeiros em situação irregular”.
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