TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 101.º volume \ 2018
302 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL isso, alheia a responsabilidade que dele resulta, e que é, também, imputada ao empreiteiro por facto que lhe respeita, o juízo, a meu ver, seria necessariamente distinto do juízo a que cheguei em matéria de responsabi- lidade dos administradores e gerentes, razão que sempre me afastaria de chamar à fundamentação essa juris- prudência (havendo, nesse cenário, considerado que nunca está em causa o pagamento por responsabilidade própria da pessoa singular, administrador ou gerente, precisamente por aí se considerar estar em causa uma garantia de satisfação da sanção pecuniária devida por pessoa coletiva). É verdade que, na leitura que o tribunal a quo faz da norma em apreciação, se dispensa qualquer pon- deração da culpa (própria, como defendo) na determinação da concreta sanção aplicada à recorrida. Mas tal sucede: em matéria contraordenacional e não penal (o que afasta a culpa da censura ética do seu agente, antes constituindo imputação do ato à responsabilidade social do seu autor – como relembra o Acórdão n.º 344/07, do Tribunal Constitucional); quando estão em causa pessoas coletivas; e, sobretudo, num ambiente contra- tual que o legislador, na Lei n.º 23/2007, ponderou considerando as vantagens de promover a proteção de bens fundamentais conexos com a proibição da imigração ilegal e da exploração de trabalhadores ilegais, designadamente para defesa dos direitos previstos no artigo 59.º da Constituição, ao pretender obviar à uti- lização de mão de obra clandestina, por estar em causa o emprego de cidadão estrangeiro não autorizado a exercer uma atividade profissional. O sacrifício imposto, atendendo aos bens em causa, procurando a eficácia da dissuasão e a prevenção geral, mesmo desconsiderando limites próprios derivados da particular situação de quem vem a ser onerado com o cumprimento de sanção pecuniária, não apresenta intensidade que leve a que considere ultrapassado um justo equilíbrio (veja-se, a propósito do princípio da culpa, o ponto 13 do Acórdão n.º 201/14 do Tribunal Constitucional). – Catarina Sarmento e Castro. DECLARAÇÃO DE VOTO Acompanho a decisão e o essencial da sua fundamentação, considerando que neste caso se justifica uma apreciação diferente da que fiz em situações anteriores quanto à justa medida da compressão do princípio da não transmissão da responsabilidade contraordenacional (cfr., por exemplo, as declarações anexas aos Acórdãos n. os 395/14 e 691/16). Liminarmente, e desde logo, importa ter presente que no caso sub iudicio está em causa apenas a norma que determina a responsabilidade solidária do empreiteiro geral pelo pagamento de coimas aplicadas a um subempreiteiro que tenha empregado trabalhadores estrangeiros não autorizados a exercerem uma atividade profissional subordinada em Portugal; e não a responsabilidade solidária de quaisquer outros utilizadores (cfr. o artigo 198.º, n. os 2 e 4, da Lei n.º 23/2007, de 4 de julho, na redação originária, a que corresponde o artigo 198.º-A, n. os 1 e 5, do mesmo diploma, na redação dada pela Lei n.º 29/2012, de 9 de agosto). Em segundo lugar, este concreto juízo negativo de inconstitucionalidade não prejudica uma reaprecia- ção do direito infraconstitucional aplicável, considerando em especial a necessidade de uma articulação com o direito da União Europeia e as salvaguardas no mesmo estabelecidas, nomeadamente na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia e na Diretiva n.º 2009/52/CE. De todo o modo, a verdade é que esta Diretiva – cujo prazo de transposição terminou ainda antes do início de vigência da Lei n.º 29/2012 – limita- -se a estabelecer normas mínimas sobre sanções e medidas contra os empregadores de nacionais de países terceiros em situação irregular, acautelando igualmente um mínimo de responsabilização dos subcontratan- tes em certos sectores (cfr. os respetivos considerandos 4 e 20 e o artigo 8.º). Por isso, a mesma Diretiva não impede o estabelecimento de regimes mais severos, como é o caso daquele que a Lei n.º 23/2007 consagra. No que se refere diretamente à norma fiscalizada, verificam-se em meu entender quatro circunstâncias que justificam a aludida diferença de apreciação quanto à sua justa medida: i) A transmissão de responsabilidade pelo pagamento da coima (e, bem assim, da responsabilidade pelas demais despesas mencionadas no n.º 4 do artigo 198.º) opera apenas entre “mestres do mesmo
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