TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 101.º volume \ 2018
298 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL assumir, no domínio contraordenacional, outros contornos, assentes numa intenção última de garantia patri- monial ou civil do pagamento de uma sanção puramente financeira. Neste ponto, não pode deixar de atentar-se na letra da norma em análise, que revela o propósito aca- bado de expor, e nos termos da qual, o empreiteiro geral é tido como solidariamente responsável pelo paga- mento das coimas devidas pela prática de contraordenação de emprego cidadão estrangeiro não autorizado a exercer uma atividade profissional. No mesmo sentido, e apesar de a presente norma vigorar já antes da Diretiva 2009/52/CE, atenta a finalidade coincidente destes instrumentos, importa atender aos já referidos considerando 20 e artigo 8.º dessa Diretiva, que impõem aos Estados-Membros o dever de assegurar que o contratante principal – empreiteiro geral – e qualquer subcontratado intermédio sejam solidariamente res- ponsáveis com o empregador de nacionais de países terceiros em situação irregular sempre que estes sejam por ele subcontratados. Por sua vez, no que se refere à vantagem que através dela se obtém para efeitos da proteção dos bens jus- fundamentais atrás expostos, é admissível o entendimento segundo o qual o envolvimento, através da assun- ção coerciva da responsabilidade pelo pagamento da coima, do empreiteiro geral que, a final, irá beneficiar do trabalho ilegal, garante uma maior eficácia na cobrança efetiva da coima, e, através disso, indiretamente, uma mais elevada probabilidade de que a infração não chegará sequer a ser cometida, assim se protegendo melhor os referidos bens jusfundamentais. De facto, a referida norma visou constituir uma forma de dissua- são efetiva da procura de trabalhadores estrangeiros em situação ilegal, a qual se traduz, muitas vezes, em mão de obra mais “rentável” e mais vantajosa a vários níveis, do que a proporcionada por trabalhadores nacionais ou mesmo por trabalhadores estrangeiros com estatuto legal adequado. Assim, o legislador terá entendido que só com a previsão de sanções verdadeiramente dissuasoras para todos os intervenientes e beneficiários do trabalho, se poderia combater eficazmente o recurso ao trabalho de estrangeiros em situação irregular, assim afastando ou impedindo a legitimidade da alegação, por parte do empreiteiro geral, de que desconhecia o dever de observar os mecanismos legais por parte do empregador ou mesmo o recurso a subcontratação como forma de contornar a proibição legal. Assim, não é possível asseverar que o legislador ultrapassou a sua margem de conformação através da imposição de um sacrifício desnecessário, inútil ou manifestamente desproporcionado para efeitos da prote- ção dos bens jusfundamentais convocáveis. 12. Poderia questionar-se o facto de, contrariamente à jurisprudência atrás exposta, a presente norma proceder à responsabilização de quem não possui uma conexão suficientemente forte ou orgânica com o autor principal da infração. De facto, nos casos já anteriormente analisados pela jurisprudência do Tribunal Constitucional, pré-existia uma conexão objetivamente existente entre o sujeito passivo responsável pela contraordenação e os sujeitos responsáveis pelo pagamento da coima, sendo, os primeiros gerentes, admi- nistradores ou diretores da segunda. Admitindo-se uma garantia constitucional mínima de intransmissibili- dade da responsabilidade contraordenacional, a mesma proibiria a responsabilização na ausência de conexão mínima com o autor da infração ou com os factos. Ora, a conexão preexistente entre os responsáveis solidários da presente norma afigura-se suficiente para se poder concluir não violar os mínimos aceitáveis de responsabilização num Estado de direito. E assim é por- que, na dimensão normativa ora em análise, o empreiteiro geral é responsabilizado solidariamente por facto cometido por subcontratado para a execução de obra sua. Não se pode afirmar ser tal ligação meramente esporádica ou fortuita, pois também ela se encontra regida por deveres contratuais que pautam as relações entre os dois responsáveis. A isto acresce o facto de o empreiteiro geral se encontrar vinculado por um estatuto funcional do qual decorrerem os deveres mais relevantes referentes a todos os aspetos relacionados com a execução da obra. O Decreto-Lei n.º 12/2004, de 9 de janeiro, que estabelece o regime jurídico de ingresso e permanên- cia na atividade da construção, à data vigente, define, na alínea f ) do artigo 3.º, como empreiteiro geral «a empresa que, sendo detentora das subcategorias consideradas determinantes, demonstre capacidade de
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