TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 101.º volume \ 2018

280 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL (cfr. artigo 1.º, n.º 1, da Lei de Bases da Proteção Civil, aprovada pela Lei n.º 27/2006, de 3 de junho), ao afirmar que o tributo «apenas se aplicará, enquanto o Município de Setúbal não for ressarcido pela Adminis- tração Central dos custos incorridos pela existência de um Corpo de Bombeiros Sapadores». Sucede que, apesar de a Lei n.º 27/2006 cometer a atividade de proteção civil também às autarquias locais (cfr. artigo 1.º, n.º 1), daí obviamente se não segue que, por força dessa atribuição, os municípios passem a dispor da faculdade de prover ao financiamento dos recursos implicados na respetiva prossecução nos termos em que o Estado se encontra constitucionalmente autorizado a fazê-lo – isto é, mediante o lan- çamento, através de lei parlamentar, de tributos destinados a custear prestações genéricas e indivisíveis que tenham como beneficiária toda a respetiva coletividade. 9. O segundo aspeto – relacionado, de resto, com o anterior – prende-se com a circunstância de, ao contrário do que parece resultar da exposição que acompanhou a proposta do RMTPC, o facto tributário gerador da TMPC de Setúbal não ser o risco causado por certos imóveis, infraestruturas ou atividades, mas antes a respetiva titularidade ou prossecução. Conforme evidenciado pelos dados que integram a fundamentação económico-financeira da TMPC de Setúbal, constante do anexo I do RMTPC de Setúbal, o tributo encontra-se determinado objetivamente, sem a consideração relevante das prestações municipais alegadamente na sua base, a não ser na medida em que a determinação do respetivo valor foi precedida da agregação dos custos globais dos serviços a cujo financiamento se destina. Na prática, ao associar um risco de 10% aos prédios urbanos devolutos, de 65% aos prédios com ativi- dade industrial e de 25% aos prédios com atividades de comércio, indústria, bem como com infraestruturas (como redes de gás, eletricidade, telecomunicações ou de abastecimento), o município usou o risco como mero critério de repartição do valor dos custos globais dos serviços de proteção civil e bombeiros que pre- tendeu imputar, sem especificar quaisquer prestações concretas ou singularizáveis de que, em função desse risco, os sujeitos do tributo se pudessem dizer efetivos causadores ou beneficiários. O que se torna mais claro ainda se tivermos em conta que a fundamentação económico-financeira da TMPC de Setúbal, acima refe- rida, não contém sequer a especificação do valor dos custos a suportar com as atividades de proteção civil a prestar a cada uma das categorias dos respetivos sujeitos tributários, quedando-se, ao invés, pela indicação do «montante total da despesa associada à área dos Bombeiros e Proteção Civil» do município, seguida da imputação desse valor «ao universo de cada tipologia, com base» apenas «na percentagem do contributo de cada tipologia», previamente fixada nos termos mencionados já. Trata-se de indicações inequívocas de que, apesar da criação da TMPC de Setúbal ter sido justificada a partir da identificação de eventuais riscos acrescidos, estes não moldam a essência do tributo: servindo de pretexto para a tributação, os ditos riscos (que não são sequer especificados) e as prestações (concreta- mente desconhecidas) que os mesmos (putativamente) determinam estão ausentes do mecanismo jurídico da TMPC (neste sentido, a propósito da modalidade da TMPC prevista no n.º 2 do artigo 59.º do RGTPRML, vide Acórdão n.º 848/17). 10. O último aspeto a considerar diz diretamente respeito à particular categoria em que se inscreve o sujeito tributário, decorrendo do facto de o ato de liquidação impugnado no âmbito do processo-base ter tido por destinatária uma entidade exploradora de infraestruturas de abastecimento. Tal aspeto é insuscetível, porém, de justificar qualquer desvio ao juízo para que vem apontando.  Com efeito, uma vez que as atividades municipais em matéria de proteção civil, que justificariam a TMPC de Setúbal, não permitem estabelecer uma qualquer conexão com específicas pessoas ou grupo que delas sejam causadores ou beneficiários, encontra-se aprioristicamente excluída a possibilidade de sedear aquele tributo no âmbito de uma relação diferenciada com certa categoria de agentes, bem como a de nele reconhecer a vinculação a uma contraprestação municipal singularizável, designadamente em virtude de um eventual risco acrescido que àqueles agentes pudesse ser objetivamente associado.

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=