TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 101.º volume \ 2018
265 acórdão n.º 34/18 [por sua vez] a identificação de uma contraprestação traduzida na taxa assim cobrada à impugnante (neste sentido, cfr. Conceição Gamito e Teresa Teixeira Mota, «O Setor das Utilities e as Taxas de Proteção Civil, in Taxas e Con- tribuições sectoriais, Almedina, 2013, página 63). Para a impugnante, os serviços de proteção civil liquidados e cobrados, em setembro e outubro de 2012, não decorreram de utilidades novas e/ou em acréscimos de utilidades preexistentes, uma e outro, que lhe tenham sido proporcionadas pela atuação do Município de Setúbal. Pelo contrário, o que o elenco fechado do n.º 2 do artigo 2.º em particular e o articulado do Regulamento em questão, em geral, nos permite desvendar é – isso sim – a realização de prestações que constituem incumbência do Município (cfr., artigos 1.º, 2.º e, em particular, 35.º a 43.º da Lei de Bases da Proteção Civil, aprovada e publicada pela Lei n.º 27/2006, de 03.07), e do Estado (cfr., artigo 1.º e 31.º a 34.º da Lei de Bases da Proteção Civil), as quais aproveitam à generalidade da coletividade, sem ser possível individualizar a prestação concreta de um serviço público, conforme constitui imperativo legal plasmado no artigos 4.º, n.º 2, da LGT e no artigo 3.º do RGTAL (neste sentido, Suzana Tavares da Silva, in As Taxas e a Coerência do Sistema Tributário , CEJUR, Coimbra Editora, 2008, páginas 70 a 75). De facto, sem embargo de reciprocidade constituir coisa diversa de simultaneidade, nada impedindo na Cons- tituição como na Lei ordinária, que exista uma não coincidência temporal entre prestações – no caso, entre o pagamento da taxa e a efetivação da contrapartida específica correspondente –, as taxas devidas pela realização de prestações futuras não devem, todavia, ser confundidas com as taxas devidas peta realização de prestações mera- mente presumidas. Assim, se é verdade que a generalidade das taxas Locais assenta em prestações efetivas, casos há em que possuem estrutura mais complexa, assentando sobre factos a partir dos quais se presume a realização da prestação autárquica a cuja compensação as taxas Locais se dirigem. Atento o refendo circunstancialismo, e sob pena de se diluir por completo a fronteira entre taxas, contribui- ções e impostos (...) defraudando com isso a reserva de Lei parlamentar, só em termos muito limitados devemos aceitar que as taxas Locais assentem em prestações meramente presumidas (Sérgio Vasques in Regime das Taxas Locais – Introdução e Comentário, Cadernos IDEFF-FDL, n.º 8, Almedina, 2008, página 86). Pelo que, nas situa- ções identificáveis em que a presunção em que a taxa Local assenta se mostre de tal modo frágil – em que apenas se possa qualificar como possível o aproveitamento da prestação autárquica e já não como certo – o tributo em questão deve ser classificado como um imposto, estando sujeito ao principio da capacidade contributiva e à reserva de Lei parlamentar. Uma tal hipótese-tipo consiste, precisamente, aquela sobre a qual nos debruçamos presentemente. De molde a concretizar e densificar a presente asserção, chamemos à colação o pensamento de Sérgio Vasques in Regime das Taxas Locais – Introdução e Comentário, Cadernos IDEFF-FDL, n.º 8, Almedina, 2008, páginas 88 e 89, o qual, pela sua profundidade do tratamento desta matéria, perfilhamos in totum e ora transcrevemos: “A diferença subtil que há na força das presunções em que por vezes assentam os tributos Locais e a dife- rente quantificação a que ela conduz não deve nunca ser esquecida, (...) no seu controlo por parte dos tribunais, e ela é hoje tanto mais importante quanto é certo que o [RGTAL] em mais do que um ponto parece sugerir a criação de taxas sobre prestações difusas, cujo aproveitamento pelos contribuintes não se pode dar por seguro. É isso que sucede (...); no n.º 1 do artigo 6.º, quando se reconhece aos municípios o poder de Lançar taxas em contrapartida da prestação de «serviços no domínio da prevenção de riscos e da proteção civil» [alínea f ) ] (…). Uma vez que o [RGTAL] não pode, evidentemente, prevalecer sobre a Constituição da República (...) só haveremos de admitir que as autarquias lancem tributos em contrapartida destas «utilidades» (...) ou «servi- ços», quando neles se descubra uma prestação concreta de que os sujeitos passivos sejam efetivos causadores ou beneficiários.”
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