TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 101.º volume \ 2018

26 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL públicas), e, por outro lado, por regimes específicos de âmbito nacional e europeu, aplicáveis às instituições de crédito (com particular relevo para as “entidades supervisionadas significativas”), que sobrecarregava, sem razoabi- lidade nem utilidade efetiva, aqueles titulares, seja em relação aos gestores públicos, seja quando comparados com os membros dos conselhos de administração das demais instituições de crédito. § 13. Esse tratamento diferenciado do estatuto dos titulares de instituições de crédito de natureza pública nem sequer é inovadora na ordem jurídica portuguesa, sendo que o n.º 6 do artigo 14.º do Decreto-Lei n.º 133/2013 (curiosamente, aprovado por alguns dos requerentes, quando exerceram funções governativas), previa e prevê que “[O] disposto no presente decreto-lei não prejudica a aplicabilidade, às empresas públicas que tenham natureza de instituições de crédito, sociedades financeiras ou empresas de investimento, das disposições especialmente aplicá- veis a esse tipo de entidades, as quais prevalecem em caso de conflito”. § 14. Conforme decorre da jurisprudência constante do Tribunal Constitucional (para uma síntese, ver o Acór- dão n.º 232/03) e dos ensinamentos unânimes da ciência jurídico-constitucional, o princípio da igualdade não se basta com uma mera aceção formal do mesmo, antes exigindo que situações diferenciadas não sejam tratadas de modo idêntico. § 15. Como é por demais evidente, as especificidades do setor financeiro, num ambiente profundamente con- correncial e transnacionalizado, implicam que os titulares dos órgãos de administração das instituições de crédito que sejam qualificadas como “entidades supervisionadas significativas” se encontrem num plano fáctico distinto dos demais gestores públicos. § 16. Pelo que, atenta a livre margem de decisão de que goza o Governo, enquanto órgão que exerce a função legislativa, cabe-lhe a ele discernir se o interesse público justifica ou não o reconhecimento de situações diferen- ciadas que justifiquem um tratamento também ele diferenciado, conforme resulta da jurisprudência constante do Tribunal Constitucional, que tem entendido não lhe caber substituir-se a tais juízos políticos (assim, a mero título de exemplo, ver o Acórdão n.º 396/11). C) Improcedência da alegada violação do princípio da proporcionalidade § 17. A arguição de inconstitucionalidade, por alegada violação do princípio da proporcionalidade, não só é improcedente, como a respetiva alegação se afigura incompreensível e infundada. Isto porque os requerentes con- fundem a operação de aferição da “necessidade” da medida, enquanto vertente do princípio da proporcionalidade, com aquilo que se limita a traduzir a sua discordância face à decisão legislativa concretamente adotada – que optou por proceder a uma exclusão em bloco do regime previsto no Estatuto do Gestor Público, ao invés de uma outra solução mais minimalista, que identificasse especificamente que normas concretas deveriam ser afastadas. § 18. Acontece que, conforme resulta de abundante jurisprudência constitucional, não cabe a este Tribunal, nem tão pouco teria o Tribunal Constitucional possibilidade de indagar acerca das várias alternativas político- -legislativas que se encontravam ao dispor do legislador, pois só a este cabe definir em que medida é que o interesse público justifica cada concreta opção política. § 19. O único limite dessa livre margem de decisão legislativa resultaria, evidentemente, de uma proibição de arbítrio ou de excesso, que resulta do próprio princípio do Estado de Direito (cfr. artigo 2.º da Constituição) e que, por sua vez, se expressa no princípio da proporcionalidade. Sucede, porém, que face a essa reconhecida liberdade de conformação legislativa – essencial ao respeito pelo princípio da separação de poderes –, tais juízos intersetam, invariavelmente, as legítimas escolhas políticas do legislador, pelo que, como tem reiteradamente afirmado o Tribu- nal Constitucional, devem conter-se a casos em que a violação desses princípios constitucionais se afigura evidente e manifesta. § 20. Tendo em conta que a desaplicação do referido Estatuto não onera a esfera jurídica dos potenciais titula- res daquelas instituições de crédito – antes a ampliando, sendo-lhes favorável –, não pode sequer invocar-se que a opção político-legislativa configure uma restrição desproporcionada de direitos subjetivos. § 21. Tão pouco a Constituição impõe um estatuto unitário para os gestores públicos, gozando o legislador de liberdade para criar, em razão da natureza do setor envolvido, especialidades estatutárias, sem que seja forçado

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