TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 101.º volume \ 2018

229 acórdão n.º 16/18 Medeiros, in Jorge Miranda/ Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada, Tomo I, Coimbra: Coimbra Editora, 2010, p. 442). Uma vez que, por força dos princípios do contraditório e da igualdade de armas, o legislador se encontra vinculado a modelar cada processo em que se dirima um conflito em termos de ambos os litigantes poderem dispor, em condições de tendencial paridade, da faculdade de exercer uma influência efetiva no modo de conformação da lide, percebe-se que o domínio da fixação do regime das citações e das notificações surja, justamente, como um daqueles em que a liberdade de conformação que em princípio lhe assiste se encontra particularmente condicionada. Condicionada no sentido em que, apesar de a Constituição não impor a adoção de um qualquer específico formalismo para a comunicação dos atos processuais, daqueles princí- pios decorre que o formalismo escolhido, qualquer que seja, deverá «facultar às partes o conhecimento da existência ou do estado do processo, colocando-as em condições de exercitarem o seu direito de defesa, face às pretensões da contraparte, ou de exercerem os demais direitos de intervenção processual» (cfr. Lopes do Rego, “Os princípios constitucionais da proibição da indefesa, da proporcionalidade dos ónus e cominações e o regime da citação em processo civil”, in Estudos em Homenagem ao Conselheiro José Manuel Cardoso da Costa, Coimbra Editora, 2004, p. 837). 9. Conforme visto já, a norma impugnada integra o regime processual a que se encontra sujeita a fase de verificação e graduação de créditos no âmbito do processo de insolvência, dela resultando que, também no caso de a lista dos créditos reconhecidos ser entregue pelo administrador da insolvência depois de esgotado o prazo legal fixado para esse efeito, o insolvente, ao contrário do que sucede com os credores cujos créditos não hajam obtido reconhecimento ou que tenham sido reconhecidos em termos diversos dos reclamados, não carece de ser notificado dessa entrega. Trata-se, portanto, de uma hipótese que supõe a confrontação com os princípios do contraditório e da igualdade de armas, não da suficiência do mecanismo escolhido pelo legislador para levar ao conhecimento de certo interveniente processual – no caso, o insolvente – a prática de determinado ato – a apresentação da lista dos créditos reconhecidos pelo administrador da insolvência –, mas da ausência pura e simples de qual- quer forma de transmissão. De acordo ainda com a solução impugnada, o ato cuja notificação é dispensada, apesar de extemporaneamente praticado, é, no entanto, aquele que desencadeia o início do prazo de 10 dias de que, na qualidade de interessado, o insolvente dispõe para exercer no processo a faculdade de impugnação dos créditos reconhecidos pelo administrador da insolvência, invocando a indevida inclusão de todos ou de certos deles e/ou a incorreção do respetivo montante ou da qualificação que hajam obtido. Ora, toda a fase de verificação e graduação de créditos é informada – convêm recordá-lo uma vez mais – pela regra segundo a qual o prazo para a prática do ato que se segue é desencadeado a partir do mero esgo- tamento do prazo que a lei fixa para a prática do ato imediatamente anterior. Nos casos em que a lista dos créditos reconhecidos é entregue pelo administrador da insolvência depois de esgotado o prazo que a lei para o efeito lhe fixa, tal regra – cujo objetivo é o de tornar o procedimento mais célere e expedito – deixa de poder funcionar: nesta hipótese, vimo-lo também, o termo inicial do prazo de que dispõe o interveniente seguinte na cadeia torna-se independente do termo final do prazo previsto para a prática do ato da responsabilidade do interveniente imediatamente anterior, passando a coincidir com o momento em que este último ato é efetivamente praticado, qualquer que seja o momento em que o tenha sido, por referência àquele em que o deveria ser. Em hipóteses como esta, a notificação da lista entregue pelo administrador da insolvência surge como a única forma de, através do processo, assegurar o conhecimento pelo insolvente do dies a quo do prazo para impugnação dos créditos reconhecidos, colocando-o em condições de exercer o seu direito de defesa face às pretensões dos credores reclamantes que considere não deverem proceder. Se tal notificação for dis- pensada, o insolvente apenas conseguirá inteirar-se do termo inicial do prazo de 10 dias de que dispõe para contestar os créditos pelos quais entenda não dever responder, pelo menos em momento compatível com

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