TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 101.º volume \ 2018
228 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL a regra do desencadeamento automático do prazo seguinte a partir do esgotamento do prazo imediatamente anterior deixa de poder funcionar; neste caso, o prazo para a impugnação da lista dos créditos reconhecidos só poderá iniciar-se com a prática do ato correspondente ao da sua efetiva apresentação na secretaria judicial e a possibilidade de o insolvente determinar, a partir da mera notificação da sentença que declara a insolvência, o termo inicial do prazo de que dispõe para exercer a faculdade prevista no n.º 1 do artigo 130.º do CIRE é, obviamente, eliminada. Por isso, se a dispensa de notificação das listas dos créditos reconhecidos e não reconhecidos se man- tiver nas situações em que o administrador da insolvência incumpre o prazo fixado no artigo 129.º, n.º 1, do CIRE, será somente através da diária deslocação à secretaria judicial, onde aquelas listas são entregues, que, ao contrário do que se prevê para o conjunto de credores a que alude o artigo 132.º, n.º 2, o insolvente poderá tomar conhecimento, em momento compatível com o seu aproveitamento integral, do dies a quo do prazo para impugnação dessas listas, faculdade que lhe é conferida pelo artigo 130.º, n.º 1, do referido diploma legal. Saber se tal ónus, a que a norma impugnada dá origem, é compatível, desde logo, com o direito de acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva, consagrados no artigo 20.º da Constituição, é a questão a que se procurará responder nos pontos seguintes. 8. Enquanto garantia da possibilidade de realização dos demais direitos fundamentais, o direito de acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva concretiza um dos elementos essenciais do princípio do Estado de direito democrático (artigo 2.º da Constituição), sendo essa a principal razão por que surge consagrado no artigo 20.º da Constituição em termos tão compreensivos quanto particularizados. Assim, para além de assegurar a todos o direito de ação propriamente dito – isto é, a faculdade de sub- meter determinada pretensão ao conhecimento de um órgão jurisdicional para defesa de um direito ou de um interesse legalmente protegido (n.º 1) –, a garantia da via judiciária ínsita no artigo 20.º inclui outras dimensões, igualmente indispensáveis à concretização de uma tutela jurisdicional efetiva, com especial des- taque, no que aqui especialmente releva, para o chamado princípio do processo equitativo, explicitado no respetivo n.º 4 após a revisão de 1997. Dela resulta que o processo, uma vez iniciado, deverá desenvolver-se em termos funcionalmente orien- tados para o asseguramento de uma tutela jurisdicional efetiva a ambas as partes intervenientes no litígio, proporcionando-lhes meios eficientes de salvaguarda das suas posições e colocando-as, também desse ponto de vista, numa situação de paridade na dialética que protagonizam na defesa dos respetivos interesses (cfr. Acórdão n.º 632/99). Assim compreendido, o princípio do processo equitativo, apesar de não excluir a liberdade de confor- mação do legislador na concreta modelação dos diversos regimes adjetivos que integram o ordenamento infraconstitucional, vincula a estruturação de cada procedimento à observância de um conjunto de regras e princípios, em especial do princípio do contraditório e do princípio da igualdade de armas. O princípio do contraditório – do qual decorre, em primeira linha, a chamada regra da proibição da indefesa – postula que a ambas as partes seja assegurada possibilidade de participar no desenrolar do processo e de influir na dirimição do litígio, em termos de cada uma delas «poder deduzir as suas razões (de facto e de direito), oferecer as suas provas, controlar as provas do adversário e discretear sobre o valor e o resultado de umas e outras» (cfr. Acórdão n.º 444/91, em Diário da República, II Série, de 2 de abril de 1992, p. 3137). Já o princípio de igualdade de armas exprime uma ideia de paridade ou de equilíbrio entre as partes quanto aos meios processuais mobilizáveis para a defesa das respetivas posições, exigindo que a ambas sejam concedidas «“idênticas possibilidades de obter a justiça que lhes é devida”» (cfr. Acórdão n.º 223/95). Por isso, apesar de não implicar uma identidade formal absoluta de meios, o princípio da igualdade processual reclama que cada uma das partes em litígio «possa expor as suas razões perante o tribunal em condições que a não desfavoreçam em confronto com a parte contrária» (cfr. Acórdão n.º 223/95 e, no mesmo sentido, Rui
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