TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 101.º volume \ 2018

222 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL a todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos (art. 20.ª da CRP) incumbindo aos tribunais enquanto órgãos de soberania, administrar a jus- tiça em nome do povo (art. 202 da CRP) os quais não podem aplicar normas que infrinjam o disposto na Constituição ou nos princípios nela consignados (art. 204.º da CRP). E, ainda, d) seja declarada a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, do art. 130.º, n.º 1 do CIRE quando interpretado no sentido de o insolvente não dever ser notificado da lista definitiva de credores reconhecidos quando essa lista tenha sido apresentada para além do decurso do prazo fixado na sentença que declarou a insolvência e tenha quintuplicado o valor das dívidas do insolvente, por tratar de forma desigual o insolvente em relação a outros credores, sem qualquer justificação razoável e/ou segundo critérios de valor objetivo, constitucionalmente relevantes, por violação do princípio da igualdade consagrado no art. 13.º da CRP». 4. Dos recorridos, apenas contra-alegou o Ministério Público, em representação da Fazenda Pública, tendo concluído nos termos seguintes: «1. Pretende, o recorrente A., ver apreciada a questão da: “(…) inconstitucionalidade do art. 130.º, n.º 1 do CIRE quando interpretado no sentido de o insolvente não dever ser notificado da lista de credores reconhecidos quando essa lista tenha sido apresentada para além do decurso do prazo fixado na sentença que declarou a insol- vência, por violação do art. 3.º do CPC e dos art. 20.º, 202.º e 205.º da CRP”. 2. Este recurso foi interposto pelo insolvente “(…) nos termos do art. 280.º, n.º 1, b) da Constituição da Repú- blica Portuguesa (CRP); do art. 70.º, n.º 1, b) e n.º 2; art. 72.º, n.º 1, alínea b) , art. 75.º, n.º 1 e 75.º-A, todos estes da Lei Orgânica sobre a Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, aprovada pela Lei n.º 28/82 de 15 de novembro e posteriores alterações (…)”. 3. Segundo o recorrente, a suscitação da inconstitucionalidade da norma legal identificada ocorreu “no recurso de apelação da sentença proferida pelo Tribunal de primeira instância”. 4. No que concerne à argumentação expendida pelo recorrente, em defesa da sua tese, começamos por afastar da nossa ponderação alguns dos enfoques por ele operados e desconsiderámos os parâmetros constitucionais ínsitos nos artigos 3.º, 202.º e 204.º, da Constituição da República Portuguesa, que se nos afiguram marginais a um iter suscetível de conduzir à boa decisão da causa. 5. Já no que concerne à invocação da violação do princípio da igualdade, analisámo-lo no contexto da conside- ração da conjugação entre este princípio e os princípios do direito de acesso ao direito e do direito a um processo equitativo, nomeadamente na sua dimensão de princípio da igualdade de armas. 6. Com efeito, no caso vertente, afigura-se-nos, tendo presente a formulação da interpretação normativa impugnada pelo recorrente, que a ocorrência da ofensa constitucional incide sobre o princípio do direito a um processo equitativo tout court e, bem assim, sobre a sua refração no princípio da igualdade de armas. 7. Esta inferência resulta – nelas incidindo o guia da abordagem que preconizamos – das aplicações, como a ocorrida nos autos, do disposto no n.º 1, do artigo 130.º, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 53/2004, de 18 de março, aos casos em que o Administrador de Insolvência não apresente as listas definitivas de todos os credores por si reconhecidos e de todos os não reconhecidos, no prazo que – da conjugação do decidido na sentença que declarou a insolvência com o disposto no n.º 1, do artigo 129.º, do CIRE – lhe tenha sido fixado. 8. A interpretação normativa do disposto no n.º 1, do artigo 130.º, do Código da Insolvência e da Recupe- ração de Empresas, conducente ao entendimento de que o insolvente não deve ser notificado da apresentação extemporânea, por parte do Administrador da Insolvência, da lista definitiva dos credores por si reconhecidos, independentemente do lapso de tempo decorrido entre o momento em que o ato deveria ser praticado e a data da sua prática efetiva, introduz, no que ao ónus impugnativo do insolvente concerne, um elemento de incerteza e de indeterminação, constitucionalmente inadmissível.

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