TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 101.º volume \ 2018
221 acórdão n.º 16/18 2. A lista definitiva de credores reconhecidos, apresentada pelo Senhor Administrador da Insolvência não foi notificada ao insolvente para que tivesse a possibilidade de impugnar os créditos aí reclamados, nos termos do artigo 130.º do CIRE. 3. A sentença que declarou a insolvência do ora recorrente foi proferida em 15 de outubro de 2013 e publicada em 28 de outubro desse mesmo ano. 4. Tal sentença fixou o prazo de 30 dias para a reclamação de créditos. 5. Diz o art. 129.º, n.º 1 do CIRE que nos 15 dias subsequentes ao termo desse prazo o administrador da insol- vência apresenta na secretaria uma lista de todos os credores por si reconhecidos e uma lista dos não reconhecidos. 6. Ou seja, o administrador da insolvência deveria ter apresentado na secretaria essas listas até ao dia 13 de dezembro de 2013. 7. Porém, só dois meses após esse prazo – 11 de fevereiro de 2014 – é que o administrador da insolvência apre- sentou essas listas na secretaria, sem que o insolvente alguma vez tivesse tido conhecimento dessas listas, fosse pelo Administrador da Insolvência, fosse pelo próprio Tribunal. 8. As discrepâncias entre esta lista apresentada pelo Senhor Administrador da Insolvência e a lista de credores, apresentada pelo insolvente aquando se apresentou à insolvência são por demais evidentes, donde se extrai à sacie- dade que a lista definitiva de credores inclui créditos a que o insolvente nunca deu causa. 9. A não notificação dessas listas – apresentadas muito para lá do prazo estabelecido pelo Tribunal – ao insol- vente enquanto principal interessado no reconhecimento de dívidas que, em bom rigor, nem sequer algumas delas foram por si contraídas, viola o princípio do contraditório previsto no artigo 3.º do CPC. 10. Assim como viola o art. 20.º da CRP, enquanto corolário não só desse princípio do contraditório, mas também do princípio da proibição da indefesa. 11. A não notificação dessas listas a esse insolvente também viola o art. 13.º da CRP que consagra o princípio da igualdade entre todos os cidadãos, mormente por haver credores que beneficiam do direito de serem notificados da lista definitiva de credores, enquanto esse mesmo direito é negado ao devedor, ainda que este seja o principal interessado no reconhecimento das suas dívidas, sobretudo quando essa lista apresenta uma quintuplicação das dívidas declaradas aquando da sua apresentação à insolvência. 12. O princípio da igualdade não proíbe que a lei estabeleça distinções. Proíbe, isso sim, o arbítrio; ou seja: proíbe as diferenciações de tratamento sem fundamento material bastante, que o mesmo é dizer sem qualquer jus- tificação razoável, segundo critérios de valor objetivo, constitucionalmente relevantes, como se pode ler no Acórdão deste Tribunal Constitucional de 27 de junho de 2006 no processo 171/06, da 2.ª Secção, em que foi relator o Colendo Juiz Conselheiro Benjamim Rodrigues. 13. A interpretação do art. 130.º, n.º 1 do CIRE, efetuada tanto pelo Tribunal da Relação de Lisboa como pelo Tribunal de 1.ª instância, segundo a qual o insolvente não deve ser notificado da lista definitiva de credores reco- nhecidos, quando essas listas foram apresentadas para lá do decurso do prazo fixado pelo Tribunal, viola o princípio do contraditório previsto no art. 3.º do CPC. 14. A interpretação do art. 130.º, n.º 1 do CIRE, efetuada tanto pelo Tribunal da Relação de Lisboa como pelo Tribunal de 1.ª instância, segundo a qual o insolvente não deve ser notificado da lista de credores reconhecidos, quando essas listas foram apresentadas para lá do decurso do prazo fixado pelo Tribunal, viola os art.s 20.º, 202.º e 205.º da CRP, por limitação do acesso ao direito e aos tribunais para a defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos do insolvente». Termos em que, se requer, seja declarada a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, do art. 130.º, n.º 1 do CIRE quando interpretado no sentido de o insolvente não dever ser notificado da lista definitiva de cre- dores reconhecidos quando essa lista tenha sido apresentada para além do decurso do prazo fixado na sentença que declarou a insolvência e tenha quintuplicado o valor das dívidas do insolvente, por: a) violação do princípio do contraditório previsto no art. 3.º do CPC; b) violação do princípio da proibição da indefesa consagrado no art. 20.º da CRP; c) violação do princípio da existência de um verdadeiro estado de direito democrático (art. 2.º da CRP) subordinado à Constituição (art. 3.º da CRP) fundado na legalidade democrática (art. 3.º da CRP) onde
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