TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 101.º volume \ 2018
22 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL generalidade e abstração autênticas consubstanciam garantias relativas de igualdade e de ponderação de critérios que inevitavelmente se não preenchem no caso. Tal deve ter por consequência a sujeição a um grau apertado de escrutínio judicial quanto ao cumprimento dos princípios da igualdade e da proporcionalidade. Com efeito, perante uma lei individual e concreta (ou inautenticamente geral e abstrata), estes mesmos princípios devem ser configurados como normas de controlo judicial do legislador em todo o seu alcance prescritivo. 8. Abstraindo, para já, destas considerações afigura-se aos Requerentes padecer a mesma de inconstituciona- lidade orgânica e ilegalidade material, por violação direta do disposto no artigo 21.º da Lei que aprova as bases gerais do estatuto das empresas públicas (Decreto-Lei n.º 133/2013, de 3 de outubro, relativo ao regime jurídico do setor público empresarial) e indiretamente dos artigos 112.º, n.º 3 e 165.º, n.º 1, alínea u) da Constituição da República Portuguesa. Além disso, sem conceder, entendem ainda os Requerentes que a norma sub judicio é materialmente inconsti- tucional, maxime por violação dos princípios da igualdade e da proporcionalidade, na vertente da necessidade, a configurar in casu como plenas normas de controlo judicial do legislador, conforme sustentado supra. Vejamos. 9. Em primeiro lugar, a norma em apreço expressamente atenta contra o disposto no artigo 21.º do Decreto- -Lei n.º 133/2013, visto que, ao decidir não aplicar o Estatuto do Gestor Público e dos seus concomitantes deveres legais aos titulares designados para órgão de administração de uma empresa pública, contraria frontalmente o pre- ceito decorrente do citado artigo 21.º, o qual manda aplicar expressamente aos titulares de órgãos de administração de empresas públicas o Estatuto do Gestor Público, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 71/2007. 10. Dificilmente o legislador, ao dispor sobre as bases do estatuto das empresas públicas, poderia ser mais claro: “Artigo 21.º/ Gestor Público Só podem ser admitidos a prestar funções como titulares de órgãos de administração de empresas públicas pessoas singulares com comprovada idoneidade, mérito profissional, competência e experiência, bem como sentido de interesse público, sendo-lhes aplicável o disposto no Estatuto do Gestor Público aprovado pelo Decreto- -Lei n.º 71/2007, de 27 de março”. (itálico nosso). Em matéria de empresas públicas, portanto, está muito claramente estabelecido nas bases do seu regime jurí- dico que os titulares dos seus órgãos de administração estão sujeitos ao Estatuto do Gestor Público. 11. Note-se que não é tão só a condição de gestor público, decorrente do facto de serem titulares de órgãos de administração de empresas públicas, o comando legislativo determina mesmo a aplicação do Estatuto do Gestor Público. Não de qualquer um, mas de o aprovado pelo Decreto-Lei n.º 71/2007. Ora, seria um verdadeiro absurdo jurídico se esse comando expresso pudesse ser derrogado pelo próprio diploma para o qual remete. 12. É jurisprudência assente do Tribunal Constitucional o juízo de ilegalidade de norma por violação de lei com valor reforçado. (Acórdão n.º 134/10 do TC: “A lei posterior que singularmente se afaste do regime estabelecido pela lei de valor reforçado não o derroga, infringe o nela estabelecido.”) Com efeito, a colisão normativa não poderia aqui ser mais explícita e suportada pelo elemento literal das duas normas em presença. A remissão objetiva decorrente do artigo 21.º do Decreto-Lei n.º 133/2013 para a aplicação do Estatuto do Gestor Público constitui, efetivamente, uma decisão que o legislador assumiu em sede de bases gerais, enquanto Direito Aplicável (título da Secção II do Capítulo l em que esta norma está inserida) às empresas públicas, no
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=