TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 101.º volume \ 2018

136 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL A verdade é que a LPMA é silente sobre os mencionados limites ou sobre matérias como as indica- das, que revestem uma indiscutível importância para os interesses fundamentais em causa. Devido à sua indeterminação, aquela Lei não oferece uma medida jurídica apta a estabelecer regras de conduta para os beneficiários e para a gestante de substituição ou a fixar orientações com densidade suficiente para balizar a definição pelo CNPMA dos critérios de autorização prévia do contrato a celebrar entre os primeiros e a segunda. Tal indeterminação, além de tornar imprevisíveis, à luz da lei, os critérios que este órgão deve fixar, também não permite um controlo jurisdicional da sua legalidade adequado à importância da matéria em causa. Tratando-se de disciplina de sentido restritivo quanto ao exercício de direitos, liberdades e garantias, tanto por parte da gestante, como dos beneficiários – e, por conseguinte, matéria de reserva de lei parla- mentar ex vi artigos 18.º, n.º 2, e 165.º, n.º 1, alínea b) , da Constituição –, aquela indeterminação não é compatível com a exigência de precisão ou determinabilidade das leis, decorrente do princípio do Estado de direito democrático, consagrado no artigo 2.º da Constituição. Valem aqui as considerações feitas no Acór- dão n.º 285/92, reiteradas em jurisprudência posterior: «[A] questão da relevância do princípio da precisão ou determinabilidade das leis anda associada de perto à do princípio da reserva de lei e reconduz-se a saber se, num dado caso, o âmbito de previsão normativa da lei preenche ou não requisitos tidos por indispensáveis para se poder afirmar que o seu conteúdo não consente a atribuição à Administração, enquanto executora da lei, de uma esfera de decisão onde se compreendem elementos essenciais da própria previsão legal, o que, a verificar-se, subverteria a ordem de repartição de competências entre o legislador e o aplicador da lei. […] Reconhece-se, sem dificuldade, que o princípio da determinabilidade ou precisão das leis não constitui um parâmetro constitucional a se , isto é, desligado da natureza das matérias em causa ou da conjugação com outros princípios constitucionais que relevem para o caso. Se é, pois, verdade que inexiste no nosso ordenamento consti- tucional uma proibição geral de emissão de leis que contenham conceitos indeterminados, não é menos verdade que há domínios onde a Constituição impõe expressamente que as leis não podem ser indeterminadas, como é o caso das exigências de tipicidade em matéria penal constantes do artigo 29.º, n.º 1, da Constituição, e em matéria fiscal (cfr. artigo 106.º da Constituição) ou ainda enquanto afloramento do princípio da legalidade ( nulla poena sine lege ) ou da tipicidade dos impostos ( null taxation without law ). Ora, atento o especial regime a que se encontram sujeitas as restrições aos direitos, liberdades e garantias, constante do artigo 18.º da Constituição, em especial do seu n.º 3, e em articulação com o princípio da segurança jurídica inerente a um Estado de direito democrático (artigo 2.º da Constituição), forçoso se torna reconhecer que, em função de um critério ou princípio de proporcionalidade a que deverão estar obrigadas as aludidas restrições, uma vez que está em causa a garantia constante do artigo 53.º da Constituição, o grau de exigência de determina- bilidade e precisão da lei há de ser tal que garanta aos destinatários da normação um conhecimento preciso, exato e atempado dos critérios legais que a Administração há de usar, diminuindo desta forma os riscos excessivos que, para esses destinatários, resultariam de uma normação indeterminada quanto aos próprios pressupostos de atuação da Administração; e que forneça à Administração regras de conduta dotadas de critérios que, sem jugularem a sua liberdade de escolha, salvaguardem o «núcleo essencial» da garantia dos direitos e interesses dos particulares constitucionalmente protegidos em sede de definição do âmbito de previsão normativa do preceito ( Tatbestand ); e finalmente que permitam aos tribunais um controlo objetivo efetivo da adequação das concretas atuações da Administração face ao conteúdo da norma legal que esteve na sua base e origem.» Ou seja, conforme sintetizado no Acórdão n.º 474/13: «Incumbe ao Estado inscrever na lei critérios claros, precisos e seguros de decisão, em termos de conferir à atuação da Administração espaço concretizado de vinculação – e não de volição primária – através da identificação

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