TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 101.º volume \ 2018
135 acórdão n.º 225/18 estatuído no n.º 2 do artigo 8.º – e a atribuição de poderes administrativos formais àquele Conselho: a supervisão do conteúdo do contrato e a competência para autorizar previamente o mesmo. A definição de limites positivos e negativos da autonomia das partes, ou seja, a determinação normativa das condições indis- pensáveis à autorização prévia dos contratos de gestação de substituição – um requisito indispensável da sua validade – que os interessados pretendam celebrar resultará, assim, do exercício de tais poderes (ainda que em conjugação com a disciplina resultante da intervenção regulamentar do Governo a que se refere o artigo 3.º da Lei n.º 25/2016). 53. A gestação de substituição também releva dos direitos fundamentais dos interessados (cfr. supra o n.º 51). No caso da gestante, isso é manifesto, desde logo, no tocante ao modo como se concretiza todo o processo, uma vez que o mesmo só é possível a partir da disposição desta de querer que os beneficiários tenham um filho nascido do seu ventre. Mas a própria possibilidade de ser gestante no quadro legal pré- -definido também constitui um aspeto importante do seu direito ao desenvolvimento da personalidade, a dinamizar mediante o exercício da autonomia privada. E este último aspeto encontra-se igualmente presente do lado dos beneficiários. Assim, aspetos essenciais da delimitação positiva e negativa da autonomia privada dos interessados em matéria de gestação de substituição – o que deve ser estipulado e o que não pode ser estipulado no contrato que tem por objeto a mesma –, em especial na medida em que respeitem às condições indispensáveis à autorização prévia do correspondente contrato, devem obrigatoriamente constar de lei da Assembleia da República [cfr. o artigo 165.º, n.º 1, alínea b) , da Constituição]. Ora, como referido nos números anteriores, os n. os 4, 10 e 11 do artigo 8.º da LPMA, prevendo embora limites positivos e negativos à autonomia das partes no contrato de gestação de substituição, em vez de proce- derem à sua concretização, apenas os descrevem de forma muito geral e abstrata. Tal concretização, indispen- sável ao conhecimento e compreensão das condições em que a autorização prévia do CNPMA será dada, só ocorrerá em resultado do exercício de poderes atribuídos a esse mesmo Conselho, ainda que, eventualmente, conjugado com a disciplina regulamentar estabelecida pelo Governo ao abrigo do disposto no artigo 3.º da Lei n.º 25/2016. E a concretização de tais limites, uma vez que os mesmo se encontram funcionalizados às condições de autorização prévia do contrato, implica uma compressão daquela autonomia. No que se refere à gestante, os limites em causa tenderão a disciplinar o modo concreto como aquela pode exercer o seu direito ao desenvolvimento da personalidade no âmbito da gestação de substituição em que decidiu participar, com potencial para interferir no âmbito de proteção de outros direitos fundamentais. Em especial, e considerando a previsão do referido artigo 8.º, n.º 11, está em causa a fixação de limites às restrições admissíveis dos comportamentos da gestante – o que corresponde, claramente, a matéria de restri- ções de direitos fundamentais. A indicação, a título de exemplo, de algumas matérias – que obrigatoriamente devem ser objeto de cláusulas do contrato-tipo – elencadas nas alíneas do artigo 3.º, n.º 3, do Decreto Regu- lamentar n.º 6/2017 é elucidativa: – Escolha do obstetra que segue a gravidez, tipo de parto e local onde o mesmo terá lugar [alínea b) ]; – Cumprimento das orientações médicas do obstetra que segue a gravidez e realização de exames e atos terapêuticos, bem como a possibilidade de recusa de se submeter a certos exames de diagnós- tico [alíneas a) e d) ]; – A possibilidade de realizar viagens em determinados meios de transporte ou fora do país no terceiro trimestre de gestação [alínea d) ]; – Disposições a observar sobre intercorrências de saúde ocorridas na gestação, quer a nível fetal, quer a nível da gestante, e em caso de IVG [alíneas g) e h) ]; – Número de tentativas de gravidez [alínea i) ]; – Seguros de saúde associados ao objeto do contrato [alínea l) ]; – Forma de resolução de litígios [alínea m) ].
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