TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 100.º volume \ 2017

93 acórdão n.º 707/17 necessários ou úteis ao bom funcionamento do sistema, passando a integrá-lo, mediante contrapartida, nos termos do contrato de concessão». Esta norma confere ao Estado administrador – na qualidade de concedente – o poder de integrar no sistema bens municipais (infraestruturas, e outros direitos e bens) que «não estavam afetos os sistemas agre- gados», escolhendo para o efeito aqueles que «se revelem necessários ou úteis ao bom funcionamento do sistema». De modo que o legislador confere à Administração central um pode discricionário para identificar em concreto bens municipais que segundo o seu critério são convenientes ao interesse público, ficando os mesmos vinculados ao sistema e por esse efeito incluídos no contrato de concessão. A «afetação» ao sistema de bens que fazem parte do património dos municípios não é gratuita, já que deve ter em consideração «os critérios de fixação de contrapartidas estabelecidos no contrato de concessão» (n.º 5 do artigo 18.º). Ora, no regime instituído pelos decretos-leis que criam os vários sistemas intermunicipais de abasteci- mento de água e de saneamento, o contrato de concessão é efetuado entre o Estado, representado pelos mem- bros do governo responsáveis pelas áreas das finanças e do ambiente, e as sociedades anónimas constituídas por esses diplomas. Essas sociedades são empresas públicas constituídas sob a forma de sociedade nas quais o Estado – através da Águas de Portugal, SGPS, S. A. – exerce uma influência dominante. Os municípios podem ou não ser acionistas das novas empresas, já que no âmbito do processo de agregação de sistemas multimunicipais podem alienar às novas sociedades a totalidade das participações sociais detidas nas conces- sionárias dos sistemas extintos. Verifica-se assim que a norma impugnada – n.º 1 do artigo 18.º – atribui poderes ao concedente – Estado – para dispor do património dos municípios, sem que eles tenham intervenção, quer na escolha dos bens a integrar no sistema, quer na determinação do valor das contrapartidas devidas pela afetação. Não se pode dizer que a norma se limita a estabelecer um “programa” para negociação de futuro contrato de cedências de infraestruturas, porque o sentido literal do texto não deixa dúvidas quanto à intenção de atribuir poderes à Administração para decidir unilateralmente quais os bens municipais que se revelam úteis e necessários ao bom funcionamento do sistema e também para decidir qual o preço a pagar aos municípios pela afetação, dada a posição dominante que detém nas concessionárias. A referência constitucional operada pelo n.º 1 do artigo 284.º da CRP ao «património próprio» das autarquias envolve e pressupõe não só a existência de bens de domínio privado e público, neste caso em consonância com o n.º 2 do artigo 84.º da CRP, mas também o poder de dispor deles, destinando-os ao aproveitamento ou utilização em função de critérios de méritos e oportunidade. Ou seja, por pertencerem ao seu património, compete aos municípios decidir acerca do melhor destino dos bens para a prossecução do interesse público. Ora, o poder de utilizar, fruir e administrar esses bens pode ser afetado pela intervenção do Estado consentida na norma do n.º 1 do artigo 18.º Na medida em que o exercício dos poderes sobre os bens a afetar ao sistema pode ficar excessivamente limitado pela ação do concedente, do meu ponto de vista, há violação do princípio da autonomia constitucional dos municípios consagrado nos artigos 235.º, 237.º, 238.º, 239.º 241.º e 242.º da Constituição. – Lino Rodrigues Ribeiro. Anotação: 1 – Acórdão publicado no Diário da República , II Série, de 27 de dezembro de 2017. 2 – Os Acórdãos n. os 404/87, 452/95 e 194/99 e stão publicados em Acórdãos, 10.º, 31.º e 43.º Vols., respetivamente. 3 – Os Acórdãos n. os 631/99, 205/00 e 243/01 e stão publicados em Acórdãos, 45.º, 47.º e 50.º Vols., respetivamente. 4 – Os Acórdãos n. os 391/02 e 491/02 e stão publicados em Acórdãos, 54.º Vol.. 5 – Os Acórdãos n. os 157/03, 493/09 e 398/13 e stão publicados em Acórdãos, 55.º, 76.º e 87.º Vols., respetivamente. 6 – Os Acórdãos n. os 494/15 e 599/15 e stão publicados em Acórdãos, 94.º Vol..

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