TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 100.º volume \ 2017

918 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Para que a intervenção do Tribunal se justifique, não basta, portanto, a mera violação de um preceito estatutário, mesmo que esse preceito se integre nas «regras essenciais relativas à competência ou ao funcionamento democrático do partido». A violação da regra em causa deve ser de tal ordem que comprometa o funcionamento democrático do partido e este juízo depende da ponderação sobre se os bens jurídicos tutelados pela Constituição neste caso – a transparência, a organização e a gestão democráticas e a participação de todos os seus membros – são colocados em risco ou violados. […] Mesmo que uma «regra essencial» do partido seja violada, tal não significa que exista uma «grave violação». A qualificação da gravidade da violação da regra exige uma análise autónoma e exigente. […]” (itálico acrescentado) Perante o exposto, a qualquer luz, ainda que se adotasse a interpretação que o ora requerente pretende fazer valer quanto ao artigo 79.º, n.º 3, dos Estatutos do Partido Socialista – designadamente, quanto ao seg- mento “no todo ou em parte”, referido às designações para os cargos políticos –, a sua (eventual) violação em virtude da avocação das designações por um órgão com poderes genéricos para o efeito, discutindo-se apenas se a designação poderia ser apenas dos candidatos que encabeçavam as listas (cfr. artigos 20.º e seguintes do requerimento inicial), não é suscetível de se enquadrar no conceito de «grave violação de regras essenciais relativas à competência ou ao funcionamento democrático do partido». Ademais, tratando-se de designações de natureza política adotadas por órgãos internos vocacionados para essa designação em posição hierárquica superior à dos (alegadamente) preteridos, o resultado hermenêutico que o ora requerente pretende ver afir- mado não só colocaria o Tribunal Constitucional numa (indesejável) posição de interferência com a decisão meramente política do partido, como tal resultado não se revela, face à norma em questão, de modo algum, tão claro e indiscutível (num plano de organização interna do partido) que a (invocada) violação da norma de competência se possa afirmar grave ou, sequer, relativa a regras essenciais relativas à competência ou ao funcionamento democrático do Partido Socialista. Tudo para concluir que a ação da qual o presente incidente depende também se afigura inviável num plano substancial, o que compromete a pretendida providência, dela dependente. 2.3. Às razões que antecedem – as quais conduzem à inviabilidade da pretensão deduzida – poder-se-ia, ainda, acrescentar que a deliberação em causa, traduzindo-se na «apresentação das listas do Partido Socialista no Tribunal Judicial de Matosinhos a juízo a 7 de agosto de 2017 e tornadas definitivas a 14 de agosto de 2017» (vide artigos 11.º e 14.º do requerimento inicial), já se encontra integralmente executada, no que aos efeitos que o requerente visava evitar diz respeito, já que as listas em causa foram apresentadas e validadas no âmbito do procedimento eleitoral respetivo. Ora, ainda que se adote a tese mais restrita quanto à inutilidade da providência de suspensão da deliberação – traduzida pela ideia segundo a qual «enquanto a deliberação não estiver completamente executada ou enquanto se protraírem no tempo os respetivos efeitos, diretos, laterais, secundários ou reflexos, suficientemente graves para serem causadores de dano apreciável, será viá- vel obter a suspensão da sua execução, através da específica providência criada pelo legislador» (Abrantes Geraldes, Temas da Reforma do Processo Civil , vol. IV, Coimbra: Almedina, 2001, p. 75) – inevitavelmente se concluirá pela integral produção dos efeitos para que tende a deliberação, não restando outros que possam ser objeto da suspensão. 2.4. Ainda que assim não fosse, sempre haveria que ponderar que, nos termos do artigo 381.º, n.º 2, do Novo CPC (aplicável ex vi artigo 103.º-E, n.º 2, da LTC, atenta a renumeração do anterior artigo 397.º do CPC, operada pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho), «ainda que a deliberação seja contrária à lei, aos estatutos ou ao contrato, o juiz pode deixar de suspendê-la, desde que o prejuízo resultante da suspensão seja superior ao que pode derivar da execução». Ora – se a deliberação em causa fosse suscetível de suspensão (o que, como vimos, não é o caso) –, estaria em causa a paralisação do ato eleitoral para os órgãos autárquicos do concelho de Matosinhos, o que, face ao (hipotético) interesse a acautelar (a designação dos candidatos por

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