TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 100.º volume \ 2017
915 acórdão n.º 573/17 Resta a hipótese residual do n.º 2 do artigo 103.º-D da LTC – grave violação de regras essenciais rela- tivas à competência ou ao funcionamento democrático do partido – relativamente à qual há que ponderar o âmbito da intervenção do Tribunal Constitucional. A este propósito, pode ler-se no Acórdão n.º 576/14 (reproduzindo uma linha argumentativa consolidada na jurisprudência do Tribunal), no qual estava em causa uma deliberação da Comissão Política Nacional do Partido Socialista que aprovou a convocação e rea- lização de eleições primárias abertas a militantes e simpatizantes daquele partido, tendo em vista a indicação do futuro candidato do Partido ao cargo de Primeiro-Ministro nas eleições legislativas subsequentes: “[…] 9. Conforme o Tribunal Constitucional vem repetindo, a admissão dos processos impugnatórios das eleições de titulares de órgãos de partidos políticos ou das deliberações dos órgãos partidários rege-se por um princípio de “intervenção mínima”. Como se referiu no Acórdão n.º 497/10: «Não obstante concorrerem para a organização e para a expressão da vontade popular (artigo 10.º, n.º 12 da CRP), e deterem por isso funções e competências relevantes no domínio da organização do poder polí- tico (artigos 114.º; 151.º, n.º 1; 180.º da CRP), os partidos políticos são, na sua raiz, expressão do exercício da liberdade de associação. Nesses termos, e conforme o reconhece a Constituição nos artigos 51.º e 46.º, gozam, na ordenação da sua vida interna, da autonomia própria que é conferida às associações. É certo que tal autonomia conhece sempre limites, impostos pela ordem constitucional no seu conjunto. Para além daqueles que valem, em geral, para todas as associações, são aplicáveis à ordenação da vida interna dos partidos, pelas funções políticas que constitucionalmente são conferidos a estes últimos, não apenas os limites decorrentes do necessário respeito pelos princípios da independência nacional, da unidade do Estado e da democracia política (n.º 2 do artigo 10.º), mas ainda os decorrentes dos princípios da transparência, da organização e da gestão democrática e da participação de todos os seus membros (n.º 5 do artigo 51.º). É em razão destes limites, que conformam, por força da Constituição, o ordenamento interno dos partidos, que se atribui ao Tribunal Consti- tucional competência para, nos termos da lei, julgar ações de impugnação de eleições e deliberações dos órgãos partidários [artigo 223.º, n.º 2, alínea h) da CRP]. Os termos em que são recorríveis tais eleições e deliberações são fixados pela LTC. E são-no de modo a que se obtenha a necessária concordância prática entre os dois princípios constitucionais atrás mencionados: por um lado, o princípio da autonomia na ordenação da vida interna de cada instituição partidária; por outro, o princípio da necessária submissão dessa organização interna aos limites que lhe são constitucionalmente impostos.» É, pois, neste quadro de «intervenção mínima», que a presente ação deverá ser julgada. 10. Da matriz de intervenção mínima resulta, desde logo, a exigência de o impugnante prover ao esgotamento de todos os meios internos de impugnação previstos nos estatutos partidários para apreciação da validade e regularidade do ato impugnado, conforme prescrito no n.º 3 do artigo 103.º-C da LTC (ex vi, n.º 3 do artigo 103.º-D do mesmo diploma). (…) […] De harmonia com o princípio de intervenção mínima, não caberá certamente ao Tribunal sindicar um ato com esta natureza. Se lhe não cabe, como já se sabe, sindicar atos políticos estaduais, que não são aliás impugnáveis perante a jurisdição constitucional, por maioria de razão – e pelas razões de princípio já expostas – lhe não caberá conhecer da validade de atos de direção política praticados, no ordenamento interno dos partidos, por órgãos partidários. O que se escreveu no Acórdão n.º 2/11 não deixa de ser, também para este caso, impressivo: «Como se observou no acórdão do Tribunal Constitucional n.º 85/04, o legislador constitucional, tal como o legislador ordinário, rodeou de especiais cautelas a intervenção jurisdicional destinada a garantir a
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