TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 100.º volume \ 2017

87 acórdão n.º 707/17 municípios serão tratados da mesma forma. Dado que, na ótica do pedido, os municípios prejudicados são precisamente aqueles que, até ao final do período de convergência tarifária, pagarão menos, não é, obvia- mente, a esta diferenciação que os requerentes se referem quando invocam a violação do princípio da igual- dade. O que está em causa, na sua perspetiva, é o facto de essa uniformização tarifária consubstanciar um benefício de certos municípios em relação de outros. Esse benefício consistiria na circunstância de as tarifas não corresponderem aos custos dos serviços prestados, de abastecimento de água e de saneamento. Em alguns dos municípios em questão esse custo, devido também ao elevado investimento envolvido, é, em geral, superior do que nos municípios utilizadores do extinto sistema multimunicipal do Baixo Mondego-Bairrada, o que, até agora, levou a que, como vimos, o valor das tarifas cobradas a uns municípios fosse mais elevado do que o cobrado a outros. É também neste sentido que se compreende a alegação, pelos requerentes, de que há uma transferência de encargos de uns municípios para os outros. O aumento da tarifa em alguns municípios serve, efetivamente, para compensar o elevado custo do serviço noutros (há que salientar, porém, que o valor das tarifas cobradas aos municípios utilizadores do extinto sistema multimunicipal do Baixo Mondego-Bairrada nunca suplanta o que é cobrado aos restantes; seria significativamente diferente se o valor da tarifa passasse a ser superior). Ora, os sistemas multimunicipais são da titularidade do Estado. Através deles, prossegue-se, em pri- meira linha, o interesse nacional, procurando o Estado encontrar uma solução global para o serviço essencial do abastecimento de água e de saneamento, na parte em que essa tarefa não cabe aos municípios, no âmbito dos sistemas municipais. Os sistemas multimunicipais são, assim, perspetivados como um todo. Claro que existem muitas diferenças entre as diversas partes que compõem esse todo, mas essas diferenças existem também, no final de contas, entre os municípios que integram o mesmo sistema multimunicipal e, dentro de cada município, entre as diversas áreas geográficas que o compõem. Na verdade, o investimento necessá- rio, por exemplo, para a implementação das estruturas relativas ao abastecimento de água e ao saneamento pode, obviamente, diferir de zona para zona, dentro do mesmo município. Se fosse seguido o raciocínio dos requerentes até às últimas consequências, as tarifas teriam de diferir de município para município, conforme os custos que lhe estivessem associados, e, em última instância, de munícipe para munícipe, dado que alguns utilizadores finais habitam zonas do concelho onde o fornecimento do serviço é muito menos custoso para o Estado do que noutras. Na perspetiva do Estado, a agregação dos sistemas multimunicipais permitirá que as atividades em ques- tão sejam desenvolvidas de forma mais rentável e eficiente, não apenas do ponto de vista financeiro e econó- mico, mas também do ambiental (cfr. o preâmbulo do Decreto-Lei n.º 92/2015). Tais melhorias teriam de ser avaliadas, repete-se, em termos globais, não correspondendo necessariamente a uma maior eficiência de cada subparte do novo sistema multimunicipal. Tal objetivo constitui, desde logo, uma justificação legítima para a política em causa, que permitiria justificar o alegado tratamento desigual (ou, noutra perspetiva, o tratamento igual) dos municípios utilizadores. No entanto, o próprio objetivo de prossecução da igualdade entre as diferentes regiões do país é uma justificação legítima para a política em questão. Com efeito, ao abrigo do disposto no artigo 81.º, alínea d) , da Constituição, «[i]ncumbe prioritariamente ao Estado no âmbito económico e social» «[p]romover a coe- são económica e social de todo o território nacional, orientando o desenvolvimento no sentido de um cres- cimento equilibrado de todos os setores e regiões e eliminando progressivamente as diferenças económicas e sociais entre a cidade e o campo e entre o litoral e o interior». Deste modo, o benefício que da uniformização tarifária resulta para alguns municípios e que consubstanciaria um tratamento desigual sempre seria justi- ficado por uma finalidade que, no texto constitucional, é considerada prioritária. Não há, assim, qualquer arbitrariedade, não se podendo, em consequência, considerar violado o princípio da igualdade. Por último, e quanto à suposta inexistência de um princípio de solidariedade intermunicipal, a ver- dade é que o Estado, como vimos, tem legitimidade para prosseguir uma política nacional nos setores do abastecimento de água e do saneamento, ainda que com respeito pela autonomia municipal, que se con- cretiza na titularidade, por parte dos municípios, dos sistemas municipais. Ora, se assim é, ainda que os

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