TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 100.º volume \ 2017

856 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL dos respetivos cargos». Este preceito, introduzido no texto constitucional em 1989, consagra dois valores que justificam a restrição do direito de sufrágio passivo: a liberdade de escolha dos eleitores e a isenção e indepen- dência do exercício dos cargos. Como se afirmou, em termos genéricos, no Acórdão n.º 532/89: «Como direito fundamental que é, a própria Constituição – n.º 2 do artigo 18.º – adverte só poder a lei restringi-lo nos casos nela expressamente previstos, “devendo as restrições limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos”.   (…) O próprio texto constitucional consagra, de resto, o critério dos limites admissíveis: no n.º 3 do artigo 50.º afirma-se claramente que, no acesso aos cargos eletivos, a lei só pode estabelecer as inelegibilidades necessárias para garantir a liberdade de escolha dos eleitores – acautelando-se, desse modo, os riscos inerentes à captação da bene- volência destes – e a isenção e independência do exercício dos respetivos cargos, sancionando-se, assim, com dig- nidade constitucional, a densificação do princípio da vinculação do legislador aos direitos fundamentais mediante a imposição de outros valores que, passando pela necessidade de afirmar o princípio da legalidade, conformam o poder político, no caso o poder local» (no mesmo sentido, ver, entre outros, os Acórdãos n. os  25/92, 382/01, 515/01, 448/05, 443/09, 462/09, 480/13 e 550/13).» A questão que se coloca é a de saber se a inelegibilidade estabelecida no artigo 6.º, n.º 2, alínea b) , da LEOAL, se ancora em valores suficientemente robustos para justificarem a restrição de um direito que é fundamental por razões simultaneamente subjetivas – a oportunidade dos cidadãos para participarem no governo da sua comunidade – e objetivas – a necessidade indispensável de candidatos eleitorais para ocupa- rem cargos eletivos. Tais valores são, a título principal, os do n.º 3 do artigo 50.º, mas sem exclusão de outros que relevem do princípio da unidade da Constituição. Ora, tal questão redunda em determinar quais as rationes , ou quais os teloi, da inelegibilidade dos insolventes para órgãos autárquicos, e em aferir se as mesmas têm respaldo constitucional. O já citado Acórdão n.º 553/13 discorreu sobre essa matéria nos seguintes termos: «13.3 Na apreciação que cabe agora ao Tribunal Constitucional deve ter-se presente o fundamento para a pre- visão, pelo legislador, da inelegibilidade dos insolventes no artigo 6.º, n.º 2, alínea a) da LEOAL. A restrição à capacidade eleitoral passiva aí determinada pode ser (hipoteticamente) orientada por um juízo de culpa, mais próprio de um regime sancionatório, que, neste caso, estaria afastado em face da qualificação da insolvência como fortuita e, sobretudo, pela estrita aferição das condições objetivas do comportamento do devedor que baseiam a própria decisão inicial de admissão liminar do pedido de exoneração prévia do passivo restante. Neste pressuposto, a «reabilitação» do insolvente ocorreria pela conjugação daquelas decisões judiciais, operando com a decisão de encerramento do processo de insolvência nos termos do artigo 230.º, n.º 1, alínea e) , do CIRE. Contudo, não se afigura ser essa a  ratio  da inelegibilidade em causa. Aliás, a questão da culpa não tem sido determinante na ponderação já feita pelo Tribunal Constitucional na ligação entre as inelegibilidades estabeleci- das pela LEOAL e o regime de perda de mandato dos cidadãos eleitos em face da ocorrência de uma situação de inelegibilidade posterior à data da eleição, como resulta da seguinte passagem do Acórdão n.º 382/01 (disponível em  http://www.tribunalconstitucional.pt ): «A inelegibilidade como fundamento da perda de mandato de quem exerce funções de membro de órgão autárquico justifica-se pela necessidade de garantir a isenção e a independência no exercício do cargo autár- quico. Pretende-se assegurar que quem foi eleito membro de órgão autárquico garanta no exercício do cargo essas isenção e independência., competindo ao legislador ordinário criar, por um lado, condições para que os cargos autárquicos sejam exercidos com isenção e independência e, por outro, condições para que os titulares dos cargos autárquicos se apresentem aos olhos dos cidadãos como pessoas acima de qualquer suspeita.

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