TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 100.º volume \ 2017

788 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL traduzida na intenção do legislador em vedar o acesso aos órgãos das autarquias locais a cidadãos que se revelem incapazes de gerir o seu património pessoal. Portanto, terminado o período de inibição, o cidadão em causa recupera a capacidade de administrar e dispor dos seus bens e de gerir bens de terceiros, e readquire a sua capacidade eleitoral passiva. É certo que, por Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 173/09, publicado no DR n.º 85/2009, serie I de 2009-05-04, foi declarada, “com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade do artigo 189.º n.º 2, alínea b) do Código Insolvência e da Recuperação de Empresas, aprovado pelo DL n.º 53/2004, de 18 de março, na medida em que impõe que o juiz, na sentença que qualifique a insolvência como culposa, decrete a inabilitação do admi- nistrador da sociedade comercial declarada insolvente.” Sucede que, o referido Acórdão não tem aplicação nesta situação concreta. Primeiro porque a redação do artigo é atualmente outra, depois, não foi a sociedade que foi declarada insolvente, mas o próprio candidato. Importa concretizar que a redação da alínea b) do n.º 2 do art.º 189.º do CIRE, impunha a inabilitação como efeito necessário da situação de insolvência culposa, abrangendo toda e qualquer função que pudesse exercer. Tratava-se de uma total incapacidade de agir negocialmente, e daí ter um alcance punitivo, que colocava em causa a capacidade de exercício prevista no CC. Atualmente, a redação é distinta, sendo que, o termo inabilitação, foi substituído por inibição, inibição esta que foi concretizada, abrangendo uma situação muito específica, correspondente à administração de património de terceiros. Deixou por isso de colocar em causa capacidade civil da pessoa afetada, não sendo por isso uma medida inadequada e excessiva, e como tal violadora dos artigos 26.º, conjugado com o art.º 18.º da Constituição da Repú- blica Portuguesa. Simplificadamente, o raciocínio é o seguinte: se o insolvente administrou mal os seus próprios bens, ele não tem, por maioria de razão, condições para administrar os bens dos outros (existe um fundado receio de que ele estenda o comportamento revelado na administração de bens próprios a outras situações). Quanto à inconstitucionalidade invocada pelo candidato no seu requerimento a mesma carece de fundamento legal. Não se trata de subsumir factos a restrições quando o legislador as não previu. Trata-se de interpretar a ratio da norma constante na Lei Eleitoral e conjugá-la com o que atualmente se encontra previsto no CIRE. Se o can- didato não pode administrar o património de terceiros, não pode assumir um cargo, ou candidatar-se a um cargo, que o permita fazer. E não se diga, que como Presidente da Junta de Freguesia, não vai gerir o património da Fre- guesia. Esta gestão resulta expressamente do art.º 18.º da Lei n.º 15/2013, de 12 de setembro, sendo também certo que lhe podem ser delegadas algumas das competências conferidas à junta de Freguesia – cf. art.º 1 7 da mesma Lei. Diga-se ainda que, qualquer órgão autárquico tem esta função. Apreciando agora em concreto os factos: Tal como se fez constar do despacho proferido, e agora confessado, o candidato foi declarado insolvente por sentença de 05.11.2012, transitada em julgado em 27.11.2012, no âmbito do Processo n.º 538/12.7TBRMR que correu termos no já extinto 2.º Juízo do Tribunal Judicial de Rio Maior. Por sentença proferida no dia 08.11.2013 e transitada em julgado em 09.09.2014, após confirmação por Acór- dão da Relação de Lisboa datado de 10.04.2014, foi a insolvência de João Deus Dias Ferreira qualificada como culposa, determinando-se, na referida sentença, um período de quatro anos inibição para administrar património de terceiros, para o exercício do comércio, bem como para ocupação de qualquer cargo de titular de órgão de socie- dade comercial ou civil, associação ou fundação privada de atividade económica, empresa pública ou cooperativa. Apesar do encerramento do processo de insolvência, a insolvência foi declarada como culposa, sendo que a inibição foi decretada por 4 anos. Quanto ao início deste prazo, não concordamos também com o reclamante. Sendo a qualificação de insol- vência objeto de decisão autónoma, reconhecida perante determinados factos, e num apenso próprio, e a inibição decretada neste incidente, só pode produzir os respetivos efeitos, a partir da sentença que a qualificou, e não como alegado, com a sentença de declaração de insolvência. Aliás, a este propósito escreve Luís A. Carvalho Fernandes e João Labareda, in Código de Insolvência e da Recupe- ração de Empresas Anotado , Quid Juris, pág. 625: “A lei não estabelece o regime do prazo de duração da inabilitação, pelo que respeita ao seu terminus a quo. (…) Assim, o terminus a quo do prazo de duração da inabilitação deve ser

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