TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 100.º volume \ 2017
787 acórdão n.º 495/17 O falido readquiria a “administração e o poder de disposição dos seus bens” e deixava de estar “inibido para o exercício do comércio, para ocupar cargos de titular de órgão de sociedade comercial ou civil, associação ou funda- ção privada de atividade económica, empresa pública ou cooperativa”. No CIRE, é considerado em situação de insolvência o devedor «que se encontre impossibilitado de cumprir as suas obrigações vencidas» (artigo 3.º, n.º 1), tendo o processo de insolvência, como processo de execução univer- sal, a finalidade precípua de dar satisfação aos credores mediante, nomeadamente, a liquidação do património do devedor [artigo 1.º, n.º l. (…)] No tocante ao incidente de «qualificação da insolvência», diz-se no artigo 186.º do CIRE que: «A insolvência é culposa quando a situação tiver sido criada ou agravada em consequência da atuação, dolosa ou com culpa grave, do devedor, ou seus administradores, de direito ou de facto, nos três anos anteriores ao início do processo de insol- vência». E diz o artigo 189.º do CIRE que «1 – A sentença qualifica a insolvência como culposa ou como fortuita. 2 – Na sentença que qualifique a insolvência como culposa, o juiz deve: […] b) Decretar a inibição das pessoas afetadas para administrarem patrimónios de terceiros, por um período de 2 a 10 anos; c) Declarar essas pessoas inibidas para o exercício do comércio durante um período de 2 a 10 anos, bem como para a ocupação de qualquer cargo de titular de órgão de sociedade comercial ou civil, associação ou fundação privada de atividade económica, empresa pública ou cooperativa (…)” “De facto, a atual situação de «insolvência», CIRE, não tem a mesma carga negativa que detinha o pretérito regime da falência, sendo isto muito devido ao hodierno fenómeno social do sobreendividamento. Ninguém está livre, hoje em dia, de ser confrontado de modo imprevisto com a situação de inadimplemento. E esta «menor carga negativa» não poderá deixar de se refletir na aferição da necessidade e razoabilidade da solução jurídica interpretativa encontrada para a questão que nos ocupa. Olhando para o atual regime da insolvência, cremos que os pressupostos que anteriormente eram indispensá- veis ao decretamento da reabilitação do falido se podem encontrar tanto no domínio da insolvência culposa como no da fortuita. A «qualificação» da insolvência, que pode, obviamente, ter consequências penais (artigos 227.º a 229.º do CP, e artigo 185.º do CIRE), assume grande relevância para efeitos civis, pois que a qualificação de culposa implica sérias consequências, sobretudo para o insolvente, e que poderão consistir na inibição da administração de património de terceiros por período de 2 a 10 anos, à inibição temporária para o exercício do comércio, para a ocupação de cargos em sociedades comerciais ou civis (189.º do CIRE). Assim, sempre que estejamos perante uma insolvência culposa, terminado que esteja o período de “inibição” fixado pelo juiz na respetiva sentença, o cidadão em causa recupera a capacidade de «administrar património de terceiros». O que significa que, mostrando-se extintos quaisquer efeitos penais, ele se encontra numa situação equivalente à de reabilitado.” – Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, processo n.º 0963/14, datado de 27-11-2014, disponível em vww.dgi.pt : Nesta senda justifica o referido Acórdão: “Efetivamente, a inelegibilidade prevista no artigo 6.º, n.º 2 alínea a) , da LEOAL, não visa, e muito menos hoje em dia, censurar o insolvente em termos éticos, o que não é próprio do direito, ou sancioná-lo juridicamente, porque não deriva de qualquer ilícito. Visa, essencialmente, evitar a incon- gruência de poder ser eleito para administrar património público quem está incapacitado para administrar o seu próprio património e o de terceiros. Daí que, extintos quaisquer efeitos penais, a inelegibilidade termine sempre que termine esta última incapa- cidade.” Perfilhamos este mesmo entendimento. Contrariamente ao alegado, não se trata de recorrer à tese da equiparação (ou extensão) da formulação das alíneas b) e c) do n.º 2 do artigo 189.º do CIRE, com o desempenho de cargos públicos. A inibição de administrar o património de terceiros por um período entre 2 e 10 anos, nos termos do disposto na alínea b) do n.º 2 do artigo 189.º do CIRE, leva-nos a considerar inelegível o cidadão sobre o qual venha ser decretada esta inibição (e apenas durante o período da mesma), atenta a ratio da norma constante da Lei Eleitoral
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