TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 100.º volume \ 2017
71 acórdão n.º 707/17 nova sociedade. Pelas mesmas razões, inexiste, neste âmbito, qualquer violação do princípio da autonomia do poder local. 24. É ainda impugnada a norma prevista no n.º 1 do artigo 18.º, segundo a qual, alegam os requeren- tes, «se integram unilateralmente e contra a vontade dos seus titulares na concessão todas as infraestruturas e outros bens dos municípios, de entidades de natureza intermunicipal e de quaisquer entidades gestoras dos respetivos sistemas municipais, que, não estando afetos aos sistemas agregados, se revelem necessários ou úteis para a nova concessão». «Neste último caso estamos perante uma verdadeira apropriação de bens que integram o domínio municipal, sem lei habilitante e, pior do que tudo, sem que esteja previsto o paga- mento de qualquer indemnização, em mais um ato de confisco que consideramos absolutamente inaceitável e inconstitucional por força da violação, designadamente, dos artigos 62.º, n.º 2, 83.º, e 235.º e seguintes, todos da Constituição» (cfr. os pontos 150 e 151 do pedido). A norma do artigo 18.º, n.º 1, tem a seguinte redação: «[s]ão afetos ao sistema as infraestruturas e outros bens e direitos dos municípios, de entidades de natureza intermunicipal e de quaisquer entidades gestoras dos respetivos sistemas municipais, que, não estando afetos aos sistemas agregados, se revelem necessários ou úteis ao bom funcionamento do sistema, passando a integrá-lo, mediante contrapartida, nos termos do contrato de concessão». Tal norma determina, assim, que, mediante contrapartida, quaisquer bens e direitos, não só dos municí- pios, como também de entidades intermunicipais ou até de entidades gestoras dos respetivos sistemas muni- cipais, sejam afetos ao sistema multimunicipal, se tal se revelar útil ou necessário para o bom funcionamento do sistema. Não estabelece, contudo, qual é o procedimento a seguir para que essa afetação se concretize. Seguramente, tal não sucederá por mero efeito da norma em questão, desde logo porque os bens e direitos abrangidos não são sequer identificados, sendo apenas objeto de uma referência muito vaga e que necessita de ser concretizada (isto ainda que se tenha em conta outras normas do mesmo preceito, como a que se contém no n.º 3, e as bases do contrato de concessão, aprovadas pelos Decretos-Leis n. os 319/94, de 24 de dezembro, e 162/96, de 4 de setembro, ambos alterados e republicados pelo Decreto-Lei n.º 195/2009, de 20 de agosto). Na verdade, o n.º 2 do mesmo artigo 18.º dispõe igualmente que determinados bens e direitos são afetos ao sistema. Tal afetação, porém, e como vimos já, é estabelecida através de contratos de cedência, ao abrigo do n.º 4. Do mesmo modo, a afetação a que o n.º 1 se refere necessita de ser concretizada, nos termos gerais, o que, em princípio, implicará a celebração de contratos de entrega ou de cedência dos bens e direitos em causa. Se, por hipótese, a sociedade concessionária optar, em alternativa, por, unilateralmente, se apropriar de bens e direitos ainda não afetos à concessão, tal medida, se admissível, deverá ser realizada ao abrigo das regras gerais sobre expropriação e figuras congéneres e não, em exclusivo, do n.º 1 do artigo 18.º do Decreto- -Lei n.º 92/2015. Por conseguinte, através da norma em apreciação não se procede a qualquer confisco nem se pode con- siderar violada a autonomia do poder local ou o direito de propriedade privada dos municípios, entidades intermunicipais ou entidades gestoras dos sistemas municipais (que, ao abrigo da Lei n.º 88-A/97, na reda- ção que lhe foi dada pela Lei n.º 35/2013, podem ser empresas privadas). 25. Quanto à invocação de que a ligação obrigatória ao sistema e a transmissão dos contratos celebrados entre os municípios e as sociedades concessionárias extintas constituiria uma violação do disposto no artigo 242.º da Constituição, é de salientar que as obrigações em causa constam de um diploma legislativo. Não se prevê, nas normas em apreciação, qualquer controlo, por parte do Estado, direta ou indiretamente, de mérito ou sequer de legalidade, sobre a atuação dos municípios. Por conseguinte, não se podem considerar violados os limites impostos pelo artigo 242.º à tutela administrativa sobre as autarquias locais.
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