TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 100.º volume \ 2017

699 acórdão n.º 851/17 A formulação deste preceito constitucional permite não apenas considerá-lo como a «expressão con- densada» de todas as garantias de defesa, concretizadas nos números subsequentes deste artigo 32.º, como também uma fonte autónoma de garantias de defesa, assumindo-se assim como norma-garantia de aplicação devida. Este direito à defesa em sentido amplo – que não se reduz nem se esgota no «direito ao recurso» – mostra-se, em grande parte, inspirado pelo direito a um processo equitativo, este consagrado no artigo 20.º (n.º 4) da Constituição. Nesta linha, pronunciam-se Germano Marques dos Santos/Henrique Salinas (in Jorge Miranda/Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada, Tomo I, 2.ª edição, Wolters Kluwer, Coimbra Editora, 2005, anotação ao artigo 32.º, p. 710): «O preceito deve ser interpretado à luz do denominado processo equitativo, na designação da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos ou do due process of law , na fórmula da jurisprudência norte-americana, envolvendo como aspectos fundamentais a consideração do arguido, como sujeito processual a quem devem ser assegurados todas as possibilidades de contrariar a acusação, a independência e imparcialidade do juiz ou tribunal e a lealdade do procedimento. Os direitos a uma ampla e efectiva defesa não respeitam apenas à decisão final, mas a todas as que impliquem restrições de direitos ou possam condicionar a solução definitiva do caso». Deste modo, e na esteira da jurisprudência constitucional já produzida, pode dizer-se que da Consti- tuição portuguesa decorre um processo penal legislativamente orientado pelas referências de um due process of law, processo esse que não deve incluir normas ou procedimentos aplicativos das mesmas que impliquem um encurtamento inadmissível das possibilidades de defesa do arguido. Neste quadro, invoca o ora recorrente ter sido colocado numa posição de indefesa, perante a ocorrên- cia de um erro – já na instância de recurso – relativamente ao qual não lhe foi possível antecipar-se nem defender-se. 17. Ora, assiste-lhe razão. Na matéria sensível dos autos, em que se define a dosimetria penal na qual se condena o arguido numa pena única de prisão efetiva, a errada consideração da data da prática dos factos para o efeito do engloba- mento da respetiva pena no cúmulo jurídico assume uma importância decisiva para o arguido alvo da conde- nação em causa. Sublinhe-se que o erro em causa é reportado a um elemento fáctico objetivo, devidamente atestado em documento com força probatória plena (o certificado de registo criminal), o qual constitui um elemento vinculado da decisão em face do regime legal de determinação da medida da pena para crimes em concurso (artigos 77.º e 78.º do Código Penal). Com efeito, a ocorrência do erro quanto à data da prática do ilícito penal em concurso apenas releva na decisão judicial proferida pelo Tribunal de recurso, quando, por sua iniciativa, procurou colmatar assinaladas deficiências da decisão de 1.ª instância (outras que não a da data da prática dos factos), não sendo aquela específica data motivo de impugnação da decisão de 1.ª instância ou constituído o objeto do recurso em apreciação. Verificado e assumido o erro no incidente de retificação a tanto dirigido, retirou o STJ, no acórdão de 14 de abril de 2016, da interpretação do artigo 380.º, n.º 1, alínea b) , do Código de Processo Penal o entendi- mento de apenas cumprir a retificação da data indevidamente considerada, passando a constar a data certa do acórdão de 17 de março de 2016, então reclamado, mas sem que daí pudesse decorrer a correção da decisão de exclusão da pena respetiva do cúmulo jurídico efetuado, por se tratar de erro de direito cuja eliminação implicava uma modificação essencial do decidido. Não dispondo o ora recorrente de outros meios para a reapreciação da decisão de cúmulo tomada em última instância – que o STJ reconhece baseada num lapso –, aquele entendimento dos limites dos poderes

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