TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 100.º volume \ 2017

66 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL preenchido e sendo respeitadas, além do mais, as competências municipais na matéria, os municípios devem ser ouvidos, é certo, antes de tomada de decisão, podendo influir desse modo no seu sentido, mas não de forma vinculativa.  19. O Decreto-Lei n.º 92/2015 procede, como vimos, à agregação de três sistemas multimunicipais preexistentes num novo, que cria. Não há nenhuma área geográfica coberta pelo novo sistema multimuni- cipal que não estivesse já abrangida por um dos três sistemas extintos. E, como se viu, estes sistemas eram já da titularidade do Estado, pelo que a reforma em causa não poderia afetar as competências municipais a este nível, respeitante aos sistemas municipais. Estes em nada são afetados pelos Decretos-Leis n. os 92/2013 e 92/2015.   Independentemente desta circunstância, como razão justificativa da agregação dos sistemas multi- municipais, é igualmente invocada a prossecução do interesse geral, agora por razões que transcendem a necessidade de investimento a efetuar pelo Estado – em consonância com o disposto no artigo 1.º, n.º 2, da Lei n.º 88-A/97, na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 35/2013. Com efeito, ao abrigo da nova redação deste preceito, a criação de sistemas multimunicipais passa a estar sujeita ao requisito da necessidade de uma «intervenção do Estado em função de razões de interesse nacional» e não, como na redação anterior, de «um investimento predominante a efetuar pelo Estado, em função de razões de interesse nacional» (cfr. igual- mente o artigo 1.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 92/2013). A reforma, segundo o preâmbulo do Decreto-Lei n.º 92/2015 (que invoca, de resto, o preâmbulo do Decreto-Lei n.º 92/2013), visa «promover a obtenção de economias de escala que garantam a sustentabi- lidade económica, social e ambiental dos serviços e preservando sempre a sua natureza pública». «De facto a situação atual, em que subsistem grandes assimetrias entre os sistemas do litoral e os sistemas do interior com impacto na acessibilidade destes serviços por parte de populações já de si oneradas pelos custos da inte- rioridade, não é sustentável nem permite assegurar a coesão territorial fundamental para a prossecução do interesse público na prestação destes serviços públicos essenciais». Visa-se, em suma, «a obtenção de sinergias, com reflexo positivo nas tarifas, bem como na sustentabilidade económica e financeira do conjunto dos sis- temas, sendo, assim, pautada por objetivos estratégicos e de interesse nacional». A invocada sustentabilidade económica e financeira dos sistemas multimunicipais, tomados no seu con- junto, é um objetivo passível de ser estabelecido pelo Governo, no âmbito das suas competências respeitantes às matérias em causa. Afinal, não há nenhuma razão, do ponto de vista do interesse geral, para que se tenha de perspetivar cada sistema multimunicipal de forma isolada. Pelo contrário, este interesse justifica que o Governo tenha uma visão sobre a globalidade dos sistemas de que é titular, na medida em que, com a agre- gação dos sistemas, é potenciada a criação de economias de escala, que contribuam para a maior eficiência dos sistemas no seu conjunto. O outro objetivo fixado para a reforma, e que consiste na eliminação de assimetrias entre os sistemas multimunicipais do interior e do litoral do país, é igualmente legítimo. Na verdade, de acordo com o dis- posto no artigo 9.º, alínea g) , da Constituição, é uma tarefa fundamental do Estado a promoção do desen- volvimento harmonioso de todo o território nacional. Trata-se, naturalmente, de um interesse nacional, que transcende o meramente local. Na sua prossecução, não pode o Governo afetar indevidamente as competên- cias dos municípios, mas pode organizar territorialmente de forma diferente os sistemas multimunicipais, de que, afinal, já é titular. Por conseguinte, não se afigura que a agregação de sistemas multimunicipais – e a inerente extinção dos sistemas multimunicipais integrados – estabelecida pelo Decreto-Lei n.º 92/2015, constitua uma violação da garantia da autonomia do poder local. 20. Ainda no plano da agregação dos sistemas multimunicipais a autonomia patrimonial do poder local, em virtude de lesão do direito de propriedade dos municípios. Neste sentido, alegam os requerentes que o Estado, «[a]o extinguir o sistema concessionado à sociedade Águas do Mondego, apropriou-se do seu

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