TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 100.º volume \ 2017
629 acórdão n.º 841/17 competente o requerimento de utilidade pública (artigos 11.º, n.º 1 e 12.º, n.º 1 do CE). O que justifica a supres- são dessa fase preliminar só pode ser a necessidade de satisfazer com rapidez o fim de utilidade pública declarado. Por razões de tempo, a lei prescinde da fase da tentativa de aquisição pelo direito privado, ganhando-se em tempo o que se perde em forma. Como dizem Feitas do Amaral e Maria Glória Garcia, cria-se «uma normatividade especial relativamente à normatividade geral, uma normatividade marcada pela simplificação de procedimentos ou pela preterição de regras gerais ( Ob. cit. pág. 490). A preterição da tentativa prévia de aquisição por via do direito privado nas expropriações urgentes não con- traria o princípio da proporcionalidade, na vertente de necessidade. Se a existência dessa fase assenta na dimensão instrumental do princípio da necessidade (ou da indispensabilidade), que só consente a expropriação após esgotada a possibilidade de aquisição por via do direito privado, a justificação para a sua preterição também se encontra no princípio da proporcionalidade, mas agora na sua dimensão temporal. Como refere Alves Correia «(É) indispensá- vel que o interesse público reclame a expropriação no momento concreto em que é emanado o ato de declaração de utilidade pública» ( ob. cit. pág. 489). Se esse momento reclama urgência na satisfação da utilidade pública expro- priativa, torna-se indispensável utilizar um procedimento simplificado (urgente) que permita realizar rapidamente aquela finalidade. Ora, não parece evidente que a preterição da tentativa prévia de aquisição por via do direito pri- vado não seja uma medida indispensável à realização urgente da expropriação. Para desformalizar o procedimento por motivos de urgência não é manifestamente desadequado ou desnecessário prescindir da fase preliminar cuja duração pode pôr em causa a satisfação imediata utilidade pública expropriativa. As garantias materiais e procedimentais dos expropriados não são excessivamente afetadas com a preterição da fase inicial de negociação através de meios contratuais jus-privatísticos. Estando verificados os pressupostos da utilidade pública expropriativa, muitas vezes expressos em planos de ordenamento do território, a liberdade que aquela fase proporciona aos interessados já está muito condicionada pela ameaça do exercício do poder expropria- tório. Como refere José Vieira Fonseca, «(A) autonomia da vontade dos expropriados na pretensão de um valor de mercado indemnizatório é aqui reduzida a limites mínimos» (“Principais Linhas Inovadoras do Código das Expropriações de 1999”, in, Revista Jurídica do Urbanismo e do Ambiente , n. os 11/12, pág. 136). Por outro lado, após a declaração de utilidade pública, existe uma fase de expropriação amigável (artigos 33.º a 37.º do CE) que proporciona algum grau de autonomia às partes na obtenção do acordo indemnizatório, não obstante as exigências jus-administrativas que a envolvem. Havendo necessidade, por razões de urgência temporal, de simplificar o procedimento expropriativo, o legis- lador optou por sacrificar a fase negocial preliminar, sem inviabilizar ulterior negociação da indemnização. É uma opção defensável, entre outras possíveis, que não contraria o princípio da proporcionalidade sob a forma de neces- sidade temporal, o parâmetro com que devem ser confrontadas e controladas as medidas de urgência. No caso, a urgência expropriativa tem uma carga valorativa superior ao interesse dos potenciais expropriados em negociarem a justa indemnização em fase anterior à declaração de utilidade pública, pois a negociação pode ainda ocorrer na fase de expropriação amigável. De modo que a norma extraída do n.º 4 do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 314/2000, de 2 de dezembro, em conjugação com o n.º 1 do artigo 11.º do Código de Expropriações, interpretada no sentido de ser dispensada tentativa de aquisição do bem expropriado por via do direito privado, não enferma da inconstitucionalidade que os recorrentes lhe apontam.» Dada a similitude das questões colocadas e das razões jurídico-constitucionais apreciadas no Acór- dão citado, pode a fundamentação constante daquele Acórdão ser aplicada à questão colocada no presente recurso, sendo igualmente de concluir no sentido de não julgar materialmente inconstitucional a norma extraída do n.º 4 do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 314/2000, de 2 de dezembro, em conjugação com o n.º 1 do artigo 11.º do Código das Expropriações, interpretada no sentido de ser dispensada tentativa de aquisição do bem expropriado por via do direito privado.
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