TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 100.º volume \ 2017

628 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL A decisão recorrida considerou que a solução legal constante do artigo 11.º, n.º 1 do CE (por lapso, refere o artigo 15.º) de dispensar o dever de efetuar a tentativa de aquisição por via do direito privado não fere as normas e princípios constitucionais mencionados pelos recorrentes, «pois a urgência justifica « ea ipsa » a supressão desse passo procedimental, aliás recuperável e factível em sede de expropriação amigável». A interpretação normativa a que vem reportada a inconstitucionalidade é obtida através da conjugação do n.º 4 do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 314/2000 com o artigo 11.º, n.º 1 do CE: o primeiro define as entidades compe- tentes para iniciar e decidir o processo expropriatório e os elementos que devem instruir esse processo; o segundo, na ressalva final, dispensa a tentativa de aquisição dos bens por via do direito privado. Ora, a norma que afasta diretamente a obrigatoriedade de aquisição por via do direito privado resulta da conju- gação do n.º 3 do artigo 6.º – que atribui caráter urgente à expropriação – com o n.º 1 do artigo 11.º do CE – que dispensa a tentativa de aquisição por via do direito privado nas expropriações urgentes – e não da conjugação do n.º 4 daquele artigo com este último preceito. Apesar disso, pode aceitar-se que a interpretação normativa ques- tionada também se extrai do n.º 4 do artigo 6.º, já que a tentativa prévia de aquisição por via do direito privado é um dos elementos de instrução do requerimento da declaração de utilidade pública que, fazendo parte do procedi- mento expropriativo normal [alínea b) , n.º 1 do artigo 12.º do CE], foi afastado por aquele preceito. De modo que a inexigibilidade desse elemento só encontra justificação na norma do n.º 1 do artigo 11.º, que dispensa a tentativa prévia de aquisição por via do direito privado nas expropriações urgentes. O princípio da proporcionalidade, na vertente de necessidade, aponta no sentido de que a expropriação só é possível como ultima ratio , devendo ser utilizada apenas quando não for possível atingir o mesmo resultado através de soluções menos gravosos para os proprietários. Gomes Canotilho e Vital Moreira referem a propósito que «o recurso à expropriação só deve ter lugar quando se gorar a aquisição por via negocial, que deve ser previamente explorada, salvo porventura em caso de urgência excecional» ( Ob. cit. pág. 807). De igual modo, reportando-se à expropriação acessória ao plano urbanístico, Alves Correia considera que a tentativa de obter por meios privados os bens necessários à realização do interesse pública é uma exigência do princípio da necessidade, na sua dimensão instrumental, o que «significa que a expropriação é encarada pelo nosso ordenamento jurídico com a ultima ratio ou, por outras palavras, a expropriação tem sempre um caráter subsidiário em relação aos instrumentos jurídico- -privados de aquisição de bens» ( O Plano Urbanístico e o Princípio da Igualdade , Almedina, pág. 487).  No procedimento expropriativo normal, a intervenção dos interessados ocorre em momento anterior à declara- ção de utilidade pública. A tentativa de aquisição por via do direito privado inicia-se com a notificação da resolução de requerer a declaração de utilidade pública, que deve ser acompanhada com a proposta de aquisição por via do direito privado (artigo 11.º, n.º 2 do CE); os interessados podem proceder à avaliação do imóvel através de um perito da sua escolha (artigo 11.º, n.º 5); a recusa ou falta de resposta no prazo fixado ou a falta de interesse na con- traproposta apresentada confere, de imediato, à entidade expropriante a faculdade de apresentar um requerimento para a declaração de utilidade pública (artigo 11.º, n.º 6); o requerimento de utilidade pública deve ser instruído com todos os elementos relativos à fase da tentativa de aquisição por via do direito privado (artigo 12.º, alínea b) do n.º 1). Independentemente do modo como se possa qualificar o procedimento de aquisição por via do direito privado – pré-procedimento expropriativo ou fase do procedimento expropriativo – ou da natureza da relação jurídica que o integra – privatística ou administrativa – esse procedimento integra um conjunto de atos e formalidades que dão corpo a uma dialética negocial que se pode prolongar por muito tempo. Com efeito, avaliação do perito do expropriante, a notificação aos interessados da resolução de expropriar e da proposta de aquisição, a avaliação do perito do expropriado, a contraproposta, a notificação da falta de interesse na contraproposta, etc. são atos e formalidades da fase negocial cuja morosidade pode comprometer a emissão, em tempo devido, da declaração de utilidade pública. Ora, a lei dispensa a realização dessa fase negocial quando o fim de utilidade pública tem natureza urgente: a entidade interessada na expropriação notifica a resolução de expropriar aos interessados e remete à entidade

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