TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 100.º volume \ 2017
626 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL simplificada de atuação. Por isso mesmo, a urgência surge como elemento determinante e constitutivo da utilidade pública prevista no n.º 1 do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 314/2000, justificando a adoção de um procedimento jurídico especial. Como referido, as especialidades procedimentais prendem-se não só com a simplificação prevista nos n. os 4 e 5 do artigo 6.º do citado Decreto-Lei como com a atribuição de posse administrativa às sociedades gestoras da execução dos projetos, enquanto entidades expropriantes, dos bens a expropriar (v. o respetivo artigo 7.º). Para a efetivação de tal posse, remeteu o legislador para os «termos do Código das Expropriações» (v. ibidem ). 7.4 No domínio das expropriações, a Constituição prescreve uma reserva de lei: a expropriação por utilidade pública «só pode ser efetuada com base na lei» (artigo 62.º, n.º 2). Significa isto que os aspetos essenciais da expro- priação devem ser regulados por lei e não por decisão livre da Administração. Constituindo o direito de proprie- dade privada um direito, liberdade e garantia de natureza análoga (Acórdãos n. os 421/09 e 187/01) e a expropriação um ato ablativo desse direito, a imposição constitucional daquela reserva «não é mais do que a aplicação geral de que as intervenções no âmbito de proteção dos direitos, liberdades e garantias só podem ser estabelecidas por lei (art. 18.º, n.º 2)» (Gomes Canotilho e Vital Moreira, ob. cit. , pág. 807). In casu os recorrentes alegam, designadamente, que a norma do artigo 6.º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 314/2000, ao estabelecer que as expropriações são urgentes, é inconstitucional por violação do princípio da proporcionalidade. Entendem que a ponderação genérica e abstrata do caráter urgente da expropriação não é o meio mais adequado, necessário e proporcional para avaliar a urgência, uma vez que o legislador não pode prever antecipadamente que a urgência ocorra em todos os casos, nem é possível atribuir caráter urgente à expropriação sem ponderar, caso a caso, os interesses em causa. Ora, o ato de privação da propriedade apenas pode ser praticado com base em lei que regule a respetiva emissão, designadamente o procedimento expropriativo, os órgãos competentes para exercer esse poder e os bens suscetíveis de expropriação. Embora jurídico-constitucionalmente vinculado pelos parâmetros da legalidade, da utilidade pública e da justa indemnização – n.º 2 do artigo 62.º – e pelos requisitos das leis restritivas – n.º.s 2 e 3 do artigo 18.º –, é reconhecido ao legislador um espaço relativamente amplo de liberdade na conformação da relação jurídica de expropriação. Dentro do quadro constitucional, o legislador pode ponderar, valorar e escolher livremente a regulação material e procedimental da expropriação. É nessa atividade de ponderação e valoração de bens que assume particular relevância o princípio da proporcionalidade consagrado no artigo 18.º. n.º 2. Exige-se que as medidas legislativas com base nas quais o direito de propriedade pode ser extinto por via de expropriação sejam adequadas, necessárias e proporcionais à prossecução da utilidade pública pretendia. É, pois, a esta luz que importa apreciar a legitimidade constitucional do regime expropriatório consagrado no Decreto-Lei n.º 314/2000. 7.5 Este diploma disciplina atuações administrativas no quadro de uma operação complexa de reordenamento urbano que o transcende e supera. A Resolução n.º 26/2000, de 15 de maio, aprovou o Programa Polis – Programa de Requalificação Urbana e Valorização Ambiental das Cidades – nos termos propostos no Relatório Anexo, e da qual faz parte integrante, onde se definem os objetivos específicos, os princípios orientadores, as principais com- ponentes, as linhas de intervenção, os projetos a financiar e o procedimento a seguir na execução do programa. A implementação desse programa está dependente da adoção de um conjunto de diplomas que consagrem os instrumentos de intervenção urbanística (plano estratégico, planos de urbanização, planos de pormenor), empre- sariais (constituição de sociedades anónimas de capitais exclusivamente públicos) e de protocolarização com os municípios. A Lei n.º 18/2000 e o Decreto-Lei n.º 314/2000 constituem os diplomas que aprovam o regime específico para a realização de operações integradas de requalificação urbana nas zonas legalmente delimitadas de intervenção daquele Programa. A qualificação da expropriação como urgente – artigo 6.º, n.º 3, do Decreto-Lei – encontra fundamento na natureza das intervenções previstas nesse Programa. Com efeito, no ponto 7.6 do Relatório Anexo à Resolução refere-se que as intervenções programadas «revestem um caráter inequivocamente urgente»; e que o período de execução das intervenções está condicionado à vigência do «Quadro Comunitário de Apoio 2000- 2006». Portanto, a criação e lançamento do Programa Polis visou tirar partido das disponibilidades financeiras do III Quadro Comunitário de Apoio (IIIQCA), que o financia em cerca de 58% (ponto 5. do Relatório Anexo). Foi
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