TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 100.º volume \ 2017
624 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Este raciocínio assenta, porém, numa contradição: seria ilógico que o legislador delegasse no Governo a feitura de um regime procedimental especial, que permita realizar com rapidez e eficácia as intervenções do Programa Polis, e ao mesmo tempo admitisse a subsistência do procedimento expropriativo normal, cujas insuficiências pre- tende superar com a autorização legislativa. O que se lê na segunda parte da alínea f ) daquele artigo 2.º é a exempli- ficação de duas “regras especiais” que o Governo pode inserir no regime especial que a primeira parte da alínea lhe autoriza a criar: uma relativa à posse administrativa e outra à constituição da comissão arbitral. A autorização para regular estes atos procedimentais tem em vista, como se prescreve na parte final daquela alínea, «garantir o respeito pelo calendário previsto para as intervenções». O fator tempo é, assim, o elemento caracterizador da existência de um regime especial derrogatório do regime jurídico-regra. Como no procedimento expropriativo normal a posse administrativa só se transfere aquando da adjudicação da propriedade, por razões de tempo, autoriza-se o Governo a criar regras específicas que permitam antecipar e simplificar esse efeito. A circunstância da autorização legislativa se referir à posse administrativa de bens «cuja declaração de utilidade pública tenha caráter de urgência» não exclui o poder que na primeira parte da alínea se delega no Governo para atribuir o caráter urgente aos procedimentos expropriativos dos bens necessários à realização do Programa Polis. Antes pelo contrário, sendo a urgência um elemento constitutivo da utilidade pública expropriativa, como enfatiza aquela expressão, a mesma urgência tem que ser exigida aos procedimentos expropriativos. Com efeito, a atribuição do caráter urgente ao procedimento expropriativo pressupõe que o interesse público específico a prosseguir com o ato ablativo – a execução do Programa Polis – tenha que ser alcançado com urgência. É por motivo de urgência temporal que se autoriza o Governo a abandonar o procedimento normal e a substituí-lo por um procedimento especial que contemple regras sobre posse administrativa que sejam mais idóneas a obter aquela finalidade. A verdade é que, nesta parte, o Governo nem sequer exercitou o poder conferido pela lei de autorização legislativa, já que no artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 314/2000 remeteu regulação da posse administrativa para os «termos do Código das Expropriações». Não existe, portanto, qualquer desconformidade entre a norma do n.º 3 do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 314/2000 e o parâmetro definido na alínea f ) do artigo 2.º da Lei n.º 18/2000.» Também nos presentes autos os recorrentes formulam idêntica argumentação, pelo que a fundamenta- ção constante daquele Acórdão se afigura transponível para os presentes autos, sendo igualmente de concluir no sentido de não julgar organicamente inconstitucional a norma do n.º 3 do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 314/2000, de 2 de dezembro. C2) Questão identificada como questão C) relativa à inconstitucionalidade material do n.º 3 do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 314/2000, de 2 de dezembro, ao dispensar as sociedades gestoras das intervenções no âmbito do Programa Polis e as entidades que emitem as Declarações de Utilidade Pública, de fundamentar, caso a caso, o caráter urgente de cada Declaração de Utilidade Pública (DUP), apreciando, em concreto, a adequação, a neces- sidade e a proporcionalidade da expropriação 14. A questão de inconstitucionalidade em causa também foi já objeto de apreciação pelo Acórdão n.º 137/17, em autos idênticos aos presentes, no qual se considerou (cfr. II – Fundamentação, 7.): «7. Inconstitucionalidade material dos n. os 3 e 4 do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 314/2000, de 2 de dezembro. 7.1 Os recorrentes impugnam a constitucionalidade das normas extraídas dos n. os 3 e 4 do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 314/2000, quando interpretadas no sentido de “dispensarem as sociedades gestoras das interven- ções no âmbito do Programa Polis e as entidades que emitem as Declarações de Utilidade Pública, de fundamentar, caso a caso, o caráter urgente de cada Declaração de Utilidade Pública (DUP), apreciando, em concreto, a adequa- ção, a necessidade e a proporcionalidade da expropriação”. Alegam que a declaração de urgência tem que ser analisada e apreciada caso a caso, em função do momento e das circunstâncias da situação concreta, não podendo ser atribuída de forma abstrata, genérica e automática. A
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