TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 100.º volume \ 2017
582 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 86.º da Lei n.º 12-A/2008, ao fazer prevalecer as suas normas sobre quaisquer leis especiais ou instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho que com ela sejam incompatíveis. Ora, o conteúdo da norma do n.º 1 do artigo 9.º do Decreto-Lei n.º 19/2013 tem um único alcance: afas- tar a aplicação ao pessoal nele referido (e, por conseguinte, ao IFAP, I.P.) dos instrumentos coletivos de trabalho em vigor para o setor bancário. Trata-se de uma disposição puramente declarativa, nada inovando, no rigor das coisas – pois que, ainda no silêncio do legislador, sempre haveria de se entender caducas as cláusulas do ACT por incompatibilidade com o regime instituído pela Lei n.º 12-A/2008. Com efeito, o IFAP, I.P. subscreveu o ACT para o setor bancário tendo em vista a regulamentação do conteúdo do contrato de trabalhadores em regime de direito privado. Só que, através do n.º 3 do artigo 88.º e das regras transitórias dos n. os 3 dos artigos 95.º a 100.º, 104.º e 112.º da Lei n.º 12-A/2008, que prevalecem sobre anteriores instrumentos de contratação coletiva, esses contratos converteram-se em contratos de trabalho em funções públicas regulados pelo direito público, e portanto, com subordinação a uma nova hierarquia de fontes laborais. Assim, a contratação coletiva na Administração Pública deixou de ter por objeto relações de trabalho sujeitas ao regime laboral privado e passou, essencialmente, a ter por objeto as matérias do “estatuto” dos trabalhadores da Administração Pública que a lei lhe permitir regulamentar. Os IRCT, convencionais da Administração Pública diferenciam-se das convenções coletivas aplicáveis às relações de trabalho sujeitas ao Código do Trabalho. As diferenças partem, antes de mais, do recorte de cada modalidade de ACT, e refletem- -se nas especificidades verificadas quanto aos sujeitos, ao âmbito de aplicação e ao conteúdo da contratação coletiva. Daí que, como já foi referido, o artigo 20.º da Lei n.º 59/2008, de 11 de setembro, que aprovou o RCTFP, tenha imposto a alteração das convenções coletivas existentes, sob pena de nulidade. 10. É evidente que a norma do n.º 1 do artigo 9.º do Decreto-Lei n.º 13/2013 não retira aos respetivos trabalhadores (ou às associações sindicais que venham a representá-los) o correspondente direito constitucio- nal à negociação coletiva da relação de emprego público, ou seja, o direito de virem a celebrar com a Admi- nistração Pública acordos coletivos de trabalho. A norma limita-se a declarar que o ACT do setor bancário, na parte que ainda vinculava o IFAP, I.P. deixou de se aplicável aos trabalhadores por ele abrangidos. Mas o facto de o preceito excluir a aplicação ao pessoal do IFAP, I.P. do acordo coletivo de trabalho para o setor bancário não afronta ou diminui o conteúdo do direito à contratação coletiva instituído pelo artigo 56.º, n.º 3, da Constituição. O objetivo subjacente ao n.º 1 do artigo 9.º é o de assegurar a efetividade das alterações legislativas que a Lei n.º 12-A/2008 impôs no regime de vínculos, de carreiras e remunerações dos trabalhadores da Administração Pública, impedindo a sobrevigência, ao lado do novo regime legal, de anteriores regimes coletivamente contratualizados. Ou seja, a cessação da eficácia do ACT, em relação aos trabalhadores que transitaram para o novo regime de vinculação e de carreiras, constitui uma mera concreti- zação das soluções normativas consagradas na Lei n.º 12-A/2008 e no RCTFP. Ora, tendo as normas destes diplomas caráter imperativo, ficou afastada a possibilidade de haver negociação coletiva sobre as matérias que elas enunciam. Nem se diga, porém, que a injuntividade dessas normas – que o legislador do Decreto-Lei n.º 19/2013 teve de respeitar – invadiu o âmbito de proteção do direito à contratação coletiva. 11. O artigo 56.º, n.º 3, da CRP atribui aos trabalhadores o direito à contratação coletiva, competindo às associações sindicais, e somente a elas, exercê-lo nos «termos da lei». O sentido dessa remissão é o de con- ferir «ao legislador uma margem de conformação não somente quanto à competência e ao modo de exercício desse direito, mas também quanto à sua própria configuração substantiva (por exemplo, definição das maté- rias elegíveis para serem objeto de contratação coletiva), desde que isso não implique uma injustificada ou desrazoável restrição do seu âmbito» (Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada …, vol. I, p. 746). Assim, a lei está habilitada a proceder à regulamentação do exercício desse direito e à definição do âmbito da contratação coletiva. Como se refere no Acórdão n.º 602/13, «afastando-se do entendimento
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