TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 100.º volume \ 2017
577 acórdão n.º 828/17 O n.º 1 do artigo 9.º do Decreto-Lei n.º 19/2013 – «disposições finais e transitórias» – preceitua que «(c)om a entrada em vigor do presente decreto-lei, o ACT deixa de ser aplicável aos trabalhadores referidos no n.º 1 do artigo 2.º». Os trabalhadores a que o preceito se refere são os trabalhadores do IFAP, I.P. que foram abrangidos pelo Acordo Coletivo de Trabalho para o Setor Bancário (ACT), cujo texto foi publicado no Boletim do Trabalho e Emprego, n.º 31, 1.ª série, de 22 de agosto de 1990, com as alterações posteriores, designadamente as publi- cadas nos Boletins do Trabalho e Emprego, 1.ª série, n.º 4, de 29 de janeiro de 2005 e n.º 29, de 20 de maio de 2011, que contêm o texto consolidado. Esses trabalhadores estavam vinculados através de contratos individuais de trabalho regulados por nor- mas de direito laboral e não por normas de direito administrativo, em especial, pelo estatuto da função pública. O IFAP, I.P. é um instituto público integrado na administração indireta do Estado, dotado de auto- nomia administrativa e financeira e património próprio, que foi criado pelo Decreto-Lei n.º 87/2007, de 29 de março, com a extinção do Instituto de Financiamento e Apoio ao Desenvolvimento da Agricultura e Pescas (IFADAP) e do Instituto Nacional de Intervenção e Garantia Agrícola (INGA). Nos termos do artigo 10.º desse diploma, ao seu pessoal aplicava-se o regime do contrato individual de trabalho, com salvaguarda das situações já constituídas; e pelo artigo 11.º, o pessoal do quadro da função pública dos organismos extintos podia optar pelo regime de contrato individual de trabalho, o que implicava exoneração do lugar de origem e a cessação do vínculo à função pública. As situações jurídico-funcionais constituídas à data da entrada em vigor desse Decreto-Lei já eram, na sua generalidade, reguladas por uma disciplina jus-privatística. De facto, o pessoal ao serviço do IFADAP regia-se pelas normas aplicadas ao contrato individual do trabalho, inicialmente, por força do artigo 20.º do Decreto Regulamentar n.º 46/78, de 30 de novembro, e posteriormente, pelo estabelecido no artigo 23.º dos estatutos aprovados pelo Decreto-Lei n.º 414/93, de 23 de dezembro; e o pessoal do INGA estava sujeito ao mesmo regime, por imposição do artigo 29.º do Decreto-Lei n.º 78/98, de 27 de março. Na verdade, foi com a criação de institutos públicos, empresas públicas e entidades administrativas inde- pendentes, que se iniciou a utilização de instrumentos contratuais jurídico-privados nas relações de emprego com a Administração. Os “diplomas instituidores” desses organismos e entidades começaram a prever a possibilidade de celebração de contratos de trabalho por tempo indeterminado regidos pelo direito privado, até que os mesmos se afirmaram como o regime jurídico regra do pessoal das empresas públicas (artigo 16.º do Decreto-Lei n.º 558/99, de 17 de dezembro) e dos institutos públicos (artigo 34.º da Lei n.º 3/2004, de 15 de janeiro). A tendência para a privatização da relação de emprego público acabou por se estender também à admi- nistração direta, com a possibilidade que foi dada à Administração Pública de celebrar contratos regidos pelo Direito Privado. Primeiramente, com a Lei n.º 25/98, de 26 de maio, em relação ao recrutamento de trabalhadores para o exercício de atividades próprias do grupo de pessoal auxiliar; e posteriormente, com a Lei n.º 23/2004, de 22 de junho, que transformou o contrato individual de trabalho na forma normal de se constituir um vínculo de emprego, com exceção dos que exerciam funções de autoridade. O n.º 1.º do artigo 2.º desta última Lei dispunha que «aos contratos de trabalho celebrados por pessoas coletivas públicas é aplicável o regime do Código do Trabalho e respetiva legislação especial, com as especifi- cidades constantes da presente lei». Assim, a aplicação do Direito do Trabalho aos trabalhadores da Adminis- tração Pública definia a contratualização das relações de trabalho, seja dos respetivos vínculos jurídicos, seja do regime jurídico aplicável, tendo a legislação jus-administrativa, essencialmente habilitadora e imperativa, sido substituída por uma disciplina jus-laboralística de características diferentes. Ora, a contratualização da relação jurídica de emprego público sob o signo do direito privado projetou- -se também na regulação coletiva das relações de trabalho. O n.º 3 do artigo 1.º da Lei n.º 23/98, de 26 de maio – que estabeleceu o regime de negociação coletiva e de participação dos trabalhadores da Administração Pública em regime de direito público – preceituava que «(o)s direitos de negociação coletiva e de participação dos trabalhadores da Administração Pública, em regime de direito privado, regem-se pela legislação geral
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